Fim de linha para investigação de Nisman sobre Cristina Kirchner

O terceiro e último arquivamento da investigação do procurador argentino encontrado morto em Janeiro não dá espaço para mais recursos. Mas a sociedade continua dividida.

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O Governo de Cristina Kirchner não escondeu os ataques pessoais a Nisman ao longo dos processos em tribunal Alejandro Pagni/AFP

Alberto Nisman foi encontrado morto em circunstâncias suspeitas em Janeiro, um dia antes de apresentar no Parlamento as conclusões da sua investigação sobre a acção do executivo de Kirchner na perseguição dos culpados do ataque de 94. As autoridades argentinas ainda não apresentaram as conclusões para a morte do procurador, mas uma investigação forense contratada pela família de Nisman assegura que este foi assassinado. Inicialmente, a versão que corria no Governo e nas autoridades argentinas era a de que o procurador se teria suicidado.

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Alberto Nisman foi encontrado morto em circunstâncias suspeitas em Janeiro, um dia antes de apresentar no Parlamento as conclusões da sua investigação sobre a acção do executivo de Kirchner na perseguição dos culpados do ataque de 94. As autoridades argentinas ainda não apresentaram as conclusões para a morte do procurador, mas uma investigação forense contratada pela família de Nisman assegura que este foi assassinado. Inicialmente, a versão que corria no Governo e nas autoridades argentinas era a de que o procurador se teria suicidado.

A tese de Nisman diz que existem indícios de que Cristina Kirchner e o seu ministro dos Negócios Estrangeiros, Héctor Timerman, encurtaram a investigação ao bombardeamento de um centro judaico de Buenos Aires, de maneira a absolver os responsáveis iranianos a troco de acordos petrolíferos que beneficiariam a Argentina. O ataque, dizia Nisman, foi levado a cabo pelos xiitas do Hezbollah e fora financiado e apoiado por Teerão. Acusações negadas pelo Irão.

Javier De Luca, o procurador encarregado do recurso sobre a investigação de Nisman, decidiu arquivá-lo “em tempo recorde”, como escreve o diário argentino Clarín. Esta é a terceira vez que a Justiça argentina arquiva a investigação de Nisman e tratava-se da última possibilidade de recurso para os apoiantes da tese de Nisman. Antes da decisão da Câmara Federal desta segunda-feira, a investigação passara antes pelas mãos do tribunal de primeira instância e pelo tribunal de recursos.

As investigações ao bombardeamento não produziram nenhuma detenção até ao momento. Mas há suspeitos: um grupo de iranianos, alegadamente ligados ao Hezbollah. São estes os responsáveis que, de acordo com as investigações de Nisman, o Governo tentaria encobrir.

A defesa do executivo de Kirchner passar por reafirmar as tentativas de exigir que os suspeitos sejam transportados para a Argentina para serem julgados. O Governo argentino tentou um acordo com o Irão que permitiria que isso acontecesse, mas o Tribunal Constitucional chumbou-o.

Divisões argentinas
O caso Nisman divide a opinião pública na Argentina, onde uma importante parte da população acredita que o Governo está envolvido na morte do procurador. O facto de o juiz Javier de Luca ter arquivado o recurso é, por isso, uma vitória clara para o Governo de Kirchner. Mas não uma vitória absoluta.

Os sucessivos arquivamentos da investigação de Nisman – e este último aconteceu rapidamente – contribuíram para acentuar a convicção de que o sistema judicial argentino está sob influência da esfera política. Javier de Luca, o juiz que arquivou o último recurso de Nisman, faz parte de um grupo – “agrupación Justicia Legítima” – associado ao Governo de Kirchner.

E o próprio executivo não escondeu a sua mão ao longo das avaliações judiciais. Mesmo depois da morte do procurador argentino, o Governo de Kirchner lançou uma campanha de ataques pessoais a Alberto Nisman. Na semana passada, o executivo acusou Nisman de se ter apropriado de parte do salário de um especialista em informática que trabalhou consigo na investigação sobre o atentado de 94 e, antes, já o havia acusado de desviar fundos para financiar férias e festas.

A própria Cristina Kirchner afirmou na segunda-feira que Nisman prometera à comunidade judaica a ajuda de Paul Singer – “o rei abutre”, nas palavras de Kirchner –, um dos principais elementos dos fundos de investimento com quem a Argentina tem batalhado nos tribunais sobre o perdão de dívida ao país.