Porto ganha hoje um novo largo na estação de São Bento

Antigo parque de estacionamento, entre a ala norte da estação e a rua da Madeira está transformado numa praça, aberta ao lazer e à criatividade.

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Era isto o que prometia o Locomotiva, programa de intervenção cultural/comunitária dinamizado, com a Refer e outros parceiros, pela empresa municipal Porto Lazer: fazer dos armazéns devolutos do corpo Norte da estação de São Bento, e do parque contínuo, uma “porta festiva” para o Porto, uma nova centralidade, que atraísse gente para esta parte algo esquecida da cidade, apesar de tão perto – escassos metros as separam –  dos Aliados, da renovada Rua das Flores e da Ribeira.

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Era isto o que prometia o Locomotiva, programa de intervenção cultural/comunitária dinamizado, com a Refer e outros parceiros, pela empresa municipal Porto Lazer: fazer dos armazéns devolutos do corpo Norte da estação de São Bento, e do parque contínuo, uma “porta festiva” para o Porto, uma nova centralidade, que atraísse gente para esta parte algo esquecida da cidade, apesar de tão perto – escassos metros as separam –  dos Aliados, da renovada Rua das Flores e da Ribeira.

À margem de tudo isto, lá em cima, na rampa ingreme a que chamam rua da Madeira, Miguel Guimarães inaugurou há dias um serviço de riquexó de luxo, o Riquetó Tours. Ele puxa pelos turistas cidade abaixo, tal como o Largo da Estação que, por baixo, este sábado se inaugura, pretende puxar por esta parte da cidade. Em frente à sua garagem, profusamente decorada com lustres vintage, uma estrutura de andaimes, rede de galinheiro e 2260 latas de tinta vazias, cria uma escada, acesso alternativo entre a rua por onde passam turistas, e o não-lugar por onde até agora ninguém passava.

No projecto Vira-lata do colectivo Morada Vaga, as latas, naquele metal conhecido como folha de flandres, capaz de reagir à luz do sol, reflectindo-a, estão parcialmente pintadas de amarelo. Permitindo, em cada patamar da escadaria, escrever palavras. “Temos muita lata”, lia-se, ao longe, esta sexta-feira de manhã, enquanto operários e artistas tentavam, apressados, terminar os respectivos trabalhos a tempo da inauguração marcada para as 15h de sábado. Na praça, estava quase pronto o jardim vertical imaginado pela empresa quadrado branco, e a dupla Carlos e Jacinta Costa punha no lugar as suas Desconversadeiras, peças de mobiliário-artístico-urbano, que servem para ver, para sentar ou tocar.

A arte está por todo o lado. Na rua – onde ainda trabalhavam Chiara Sumzogni e Irena Ublër – a partir da convocatória Espigar – e dentro de um dos armazéns da Refer, um espaço de 400 metros quadrados onde Jesse James, co-criador do festival de arte pública Walk & Talk, em São Miguel, faz a curadoria de uma exposição de quatro artistas: Horácio Frutuoso, João Bento, Nuno Pimenta e Tamara Djurovic (aka Hyuro).

Esta última – desenho – e João Bento – arquivo sonoro – foram atrás das pessoas da envolvente, ele para lhes fixar a voz, os ruídos dos espaços onde trabalham e a relação de tudo isto com a estação. Horácio Frutuoso fez uma reflexão sobre o tempo , ou a falta dele, e a relação disto com a ideia de viagem, de pendularidade entre os lugares do quotidiano. Já Nuno Pimenta, explica Jesse James, inspirou-se no túnel de São Bento, espécie de vórtice que nos puxa, do Porto, para outro lugar, periférico.

Foi isto que o açoriano procurou na exposição “Prenúncio”: Um arquivo colectivo sobre esta relação entre o que é central e periférico, o que é local e forasteiro, num lugar, uma estação, que é um lugar de espera por qualquer coisa – um destino para onde se segue, ou alguém que há-de chegar. Ele, forasteiro, bateu, a pé, toda a envolvente. E percebeu que, depois dos processos de despovoamento e de exclusão a que as ruas em volta, morro acima, foram sujeitas, quem lá ficou encontra-se, neste momento, à espera que algo aconteça.

Talvez o que as pessoas da Rua da Madeira ou da Rua do Loureiro esperam não seja esta Locomotiva. Mas ela está ali, para durar não até Junho, como chegou a estar previsto, mas até Setembro, para aproveitar todo o Verão. Ao lado do espaço expositivo, outro armazém vai servir para oficinas de vários projectos e há ainda espaço para um bar, onde o atelier Rodrigo Patrício arquitectos instalou, no tecto, cinco luminárias antigas, de forte efeito cénico, resgatadas de um monte de entulho ali guardado.

Rodrigo Patrício e a sua equipa – Magda Seifert, Sandra Brito, Miki Itabashi – foram os responsáveis pelo layout dos espaços interiores – e do exterior, a tal praça entre o muro da Rua da Madeira e este corpo da estação. Ali, fazendo uso de aglomerado de madeira, andaimes e vigas de ferro, à vista, o atelier criou uma obra que mais parece – porque é isso que pretende parecer e, simbolicamente, ser – um estaleiro de algo em construção, inacabado. Algo que, explicou Patrício ao PÚBLICO, respeita os muros que o delimitam, que assuma o caracter transitório que tem, pois, terminado o Locomotiva, caberá à Refer decidir o que fazer com os armazéns e a envolvente.

 Até lá, o projecto da Porto Lazer puxará por isto. Cláudia Melo, responsável pela programação, recorda que esta vai ser contínua, passando pelos workshops, as exposições de artes plásticas, o teatro, a música. A Locomotiva, co-financiada ainda pelos fundos regionais do ON.2 tentará alargar a sua força criativa a ruas da envolvente, como o Largo de São Domingos (onde nascerá uma instalação dos Like Architects), como já aconteceu numa casa velha no topo da Rua da Madeira, ou na ruína a sul da estação, onde o atelier de arquitectura Fahr 021.3 fez uma intervenção, com recurso a uma estrutura de ferro verde, que chama a atenção para outro naco de cidade que a cidade esqueceu.

Festa começa este sábado às 15

Apesar do ar inacabado da véspera, o largo da estação terá de estar pronto para ser inaugurado este sábado à tarde, pelas 15h, com uma performance do Ballet Teatro, no palco exterior. O presidente da Câmara, Rui Moreira, há de passar por ali uma hora depois, e até às 22h, o espaço, que dispõe de um bar interior, num armazém, e outro na praça, será animado por vários Dj. Às dez da noite é inaugurada a exposição Prenúncio, de Horácio Frutuoso, João Bento, Nuno Pimenta e Tamara Djurovic (aka Hyuro), com curadoria de Jesse James. O programa inclui ainda um concerto, marcado para as 23h, de JP Simões. De madrugada, até às 2h, o palco volta a ser dos DJ.