Nos Grammys de Sam Smith, Beck foi o vencedor surpresa

O cantor britânico venceu em quatro categorias e Beck foi surpreendido quando Prince anunciou o seu Morning Phase como Álbum do Ano.

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Beyoncé, distinguida com três Grammys e protagonista dos momentos mais celebrados da noite, foi a estrela esperada de uma cerimónia que a imprensa americana classificou como pouco memorável. A surpresa da noite foi para um veterano, Beck, que viu o seu Morning Phase ganhar o estatuto de Álbum de Ano quando todos esperavam que o prémio fosse para o disco homónimo de Beyoncé – e repetiu a dose ao vencer também na categoria Melhor Álbum Rock, ultrapassando Songs of Innocence, dos U2, ou Turn Blue, dos Black Keys.

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Beyoncé, distinguida com três Grammys e protagonista dos momentos mais celebrados da noite, foi a estrela esperada de uma cerimónia que a imprensa americana classificou como pouco memorável. A surpresa da noite foi para um veterano, Beck, que viu o seu Morning Phase ganhar o estatuto de Álbum de Ano quando todos esperavam que o prémio fosse para o disco homónimo de Beyoncé – e repetiu a dose ao vencer também na categoria Melhor Álbum Rock, ultrapassando Songs of Innocence, dos U2, ou Turn Blue, dos Black Keys.

Depois de Prince anunciar Morning Phase como vencedor, e quando um surpreendido Beck se preparava para discursar, Kanye West saltou do seu lugar e irrompeu pelo palco. Por segundos, todos pensaram que West iria fazer o mesmo que nos MTV Video Music Awards de 2009, quando interrompeu Taylor Swift para informar o mundo de que preferia que o prémio de melhor vídeo tivesse sido atribuído a Beyoncé. Desta vez, porém, Kanye estava apenas a auto parodiar-se – e esperou pelo final da cerimónia para declarar que Beck devia "respeitar a arte e entregar o Grammy a Beyoncé". Na cerimónia, Beck pôde portanto agradecer sem interrupções. “Fiz a maior parte deste disco em minha casa, portanto gostaria de agradecer aos meus filhos por me deixarem mantê-los acordados até um pouco mais tarde”, disse o músico, um dos mais influentes da década de 1990 e que teve no melancólico e densamente orquestrado Morning Phase um regresso celebrado.

Porém, seria a declaração prévia de Prince, ícone com o seu quê de Benjamin Button, cada ano que passa de aparência mais jovem, a originar um dos momentos mais comentados da cerimónia de domingo no Staples Center, em Los Angeles, apresentada pela quarta vez pelo rapper LL Cool J. Curto e incisivo: “Tal como os livros e as vidas dos negros, os álbuns ainda importam”, declarou, aludindo à discussão sobre racismo reaberta nos Estados Unidos após os casos de assassinatos de negros desarmados às mãos da polícia ou de vigilantes civis que ocorreram em 2014. Durante a interpretação de Happy, a canção viral de 2014, vencedora em duas categorias (Performance Pop a Solo e Melhor Vídeo), Pharrel Williams, vestido de paquete num cenário inspirado no filme de Wes Anderson Grand Budapest Hotel, incluiu na coreografia o gesto utilizado nas manifestações de protesto que se seguiram: “Hands up, don’t shoot” (“Mãos no ar, não disparem”). 

Naquele contexto, terá sido tudo menos inocente que os Grammys tenham terminado com Beyoncé, acompanhada de coro gospel, a cantar o hino Precious Lord, take my hand e com Common e John Legend em dueto em Glory, canção da banda-sonora de Selma, o filme biográfico sobre a luta pelos direitos civis liderada por Martin Luther King.

Na cerimónia que o Los Angeles Times classificou como “tépida” e que o New York Times descreveu como “uma noite repleta de actuações soporíferas”, a denúncia da violência policial sobre a comunidade negra não foi o único episódio de activismo social a marcar presença. Confirmando a importância que os Grammys têm ainda no contexto americano, o próprio presidente, Barack Obama, gravou uma declaração para uma cerimónia. A sua mensagem era clara. É necessário lutar sem tréguas contra a violência doméstica: “Não é correcto – e tem que acabar”. Seguiu-se o testemunho de uma vítima e Katy Perry a interpretar By the grace of God numa actuação sóbria, nos antípodas da exuberância protagonizada no espectáculo de intervalo do Super Bowl há uma semana.

"Obrigado por me partires o coração"

No rescaldo dos Grammys, porém, sobressai com grande destaque um nome: Sam Smith. O cantor de 22 anos sucedeu a Adele (seis Grammys em 2012) enquanto jovem estrela britânica conquistadora do público e indústria americanas. Revelado enquanto voz de Latch, single do duo de música electrónica Disclosure, Sam Smith tornou-se um dos fenómenos pop de 2014, culpa do single Stay with me, canção de pulsar soul e refrão épico, e do álbum em que o encontrávamos, In the Lonely Hour. Quatro vezes subiu a palco para receber os célebres gramofones dourados que representam os Grammys. Na primeira agradeceu aos pais. Depois explicou que, antes do álbum de estreia, tentara tudo para levar a sua música ao mundo (“tentei perder peso e estava a fazer música horrível”) e que foi apenas quando tentou ser fiel a si mesmo que ela começou a “fluir”. No fim, ao receber o Grammy para Gravação do Ano dirigiu-se a um antigo namorado: “Quero agradecer ao homem de quem fala este álbum, por quem me apaixonei o ano passado. Muito obrigado por me partires o coração, deste-me quatro Grammys”.

De fora, ficou o agradecimento a Tom Petty. O nome do músico americano tem sido muito citado juntamente ao do Sam Smith, quando começaram a surgir online vídeos demonstrando as semelhanças entre o refrão de Stay with me e o de I won't back down?, canção editada por Petty em 1989. Sam Smith alegou tratar-se de uma coincidência, Tom Petty perdoou e o caso ficou resolvido com a inclusão deste último nos créditos autorais da canção.

A cerimónia de três horas e meia foi aquilo que os Grammys são desde há muito. “Um concerto interminável onde também se atribuem alguns prémios”, como titulou a Time. De facto, apenas uma pequena percentagem dos vencedores nas 83 categorias em que se dividem os prémios da indústria discográfica americana são apresentados na cerimónia exibida pela CBS.

No final, fica a memória das actuações: a estranheza causada por terem sido os velhos mestres do hard-rock, os AC/DC, a abrir cerimónia; Madonna a apresentar o novo single, Living for love, entre dançarinos de máscaras bizarras e fatos mariachi; a cantora australiana Sia a cantar Chandelier no cenário de um apartamento decrépito, acompanhada pela actriz Kirsten Wiig e pela bailarina adolescente Maddie Ziegler; e os habituais duetos entre músicos de gerações diferentes, com Annie Lennox ao lado do fenómeno recente Hozier para  interpretar o Take me to the church dele e o I put a spell on you de Screaming Jay Hawkins, com os britânicos Tom Jones e Jessie J a cantar You’ve lost that lovin’ feelin’”, dos Righteous Brothers, e Rihanna, Kanye West e Paul McCartney a juntarem-se tal como o vídeo revelado recentemente para levar a palco o novo single da cantora, FourFiveSeconds.

No final, além das actuações, ficam as contas: além dos referidos Sam Smith, com quatro Grammys, Beyoncé e Pharrell, com três, e Beck, com dois, a 57ª edição dos Grammys inscreveu no seu quadro de honra nomes como Tony Bennett e Lady Gaga (Melhor Álbum Vocal Pop Tradicional para Cheek to Cheek, cuja tema título interpretaram na cerimónia), Jack White (Melhor Performance Rock para Lazaretto), Aphex Twin (Melhor Álbum Dança/Electrónica para Syro), St. Vincent (Melhor Álbum de Música Alternativa para o álbum homónimo), o veterano hip hop Eminem, vencedor em duas categorias (Melhor Álbum Rap para The Marshall Mathers LP2, e Melhor Colaboração Rap/Cantada para The monster, com Rihanna) ou a revelação hip hop recente Kendrick Lamar (Melhor Performance Rap e Melhor Canção Rap para I,).