Médicos prometem mais greves se não houver “inversão de 180 graus” nas negociações

Sindicato insiste em adesão de 90%, apesar de instituições avançarem números inferiores. Novas formas de protesto vão ser estudadas se próximas negociações não derem "resultados concretos".

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O ponto alto da greve dos médicos foi a manifestação de terça-feira frente ao Ministério da Saúde Nuno Ferreira Santos

O vice-presidente da Fnam, Mário Jorge Neves,, reagia desta forma às declarações de Paulo Macedo, para dizer que quando retomarem as negociações na comissão tripartida (composta pelos sindicatos e os ministérios das Finanças e da Saúde) “tem de haver produtividade e têm de ser apresentados resultados concretos”. Em declarações ao PÚBLICO, o sindicalista constata que os médicos deram “sinais claros e inequívocos” de descontentamento nos dois dias da greve, estimando que nesta quarta-feira tenha havido “um nível de adesão sobreponível ao do primeiro dia, de 90%”.

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O vice-presidente da Fnam, Mário Jorge Neves,, reagia desta forma às declarações de Paulo Macedo, para dizer que quando retomarem as negociações na comissão tripartida (composta pelos sindicatos e os ministérios das Finanças e da Saúde) “tem de haver produtividade e têm de ser apresentados resultados concretos”. Em declarações ao PÚBLICO, o sindicalista constata que os médicos deram “sinais claros e inequívocos” de descontentamento nos dois dias da greve, estimando que nesta quarta-feira tenha havido “um nível de adesão sobreponível ao do primeiro dia, de 90%”.

Questionado sobre o facto de os dados fornecidos por algumas unidades de saúde apontarem para uma paralisação menos expressiva, o dirigente sindical reiterou o valor, avançando que, “em relação ao protesto de 2012, até há mais centros de saúde com níveis de adesão de 100%”. Porém, as administrações de diferentes unidades falam em números inferiores. Por exemplo, no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, referem-se adesões na casa dos 32% e no Hospital do Espírito Santo, em Évora, o balanço é de 50% – uma percentagem que desce para os 40% na Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano. No Porto só foram dados, de forma dispersa, números de consultas e cirurgias que ficaram por fazer e que também não disparam para valores tão elevados.

Esta quarta-feira, o ministro da Saúde, à margem da assinatura de um acordo com a Associação Nacional de Farmácias, afirmou sobre a greve que “o Ministério não a minimiza, não pretende que se repita, porque quem foi prejudicado foram os utentes do SNS. As pessoas que foram ao privado e ao social foram todas atendidas e todas servidas”. “Não podemos fazer uma greve dizendo que se defende um SNS (...) e prejudicando os utentes do SNS”, acrescentou, citado pela Lusa, prometendo “continuar a trabalhar com os sindicatos, resolvendo problemas concretos”. Dos níveis de adesão avançados pelo sindicato, comentou apenas que os números são “aritmeticamente impossíveis”.

Paulo Macedo tinha também defendido na quarta-feira à noite, numa entrevista à SIC, que “há uma parte do descontentamento dos médicos que é semelhante porque se trabalham, e muitas das vezes trabalham em condições difíceis, com rendimentos menores, isso acontece também em muitos sectores da sociedade portuguesa”. E insistiu que, mesmo perante alguma redução da remuneração, estes profissionais de saúde são a “única entidade que tem um pleno emprego em Portugal”, e que é assegurado pelo Estado a “todos os médicos saídos da faculdade”.

Uma posição que é rejeitada pelo bastonário da Ordem dos Médicos, que tem frequentemente alertado para a saída de profissionais tanto do sector público para o sector privado, como para reformas antecipadas ou mesmo pela via da emigração. José Manuel Silva descreve ao PÚBLICO as declarações do ministro durante a greve como sendo de uma “argumentação confrangedora”.

Sobre o facto de a adesão apresentada pelos sindicatos ter ficado aquém da de 2012, o bastonário explicou que “o objectivo não era apenas a percentagem de adesão mas sim colocar na ordem do dia os problemas do Serviço Nacional de Saúde e isso foi 100% cumprido”. Ainda assim, admite que “não se pode escamotear a não adesão do Sindicato Independente dos Médicos” a esta paralisação.

Mário Jorge Neves também lamenta as declarações de Paulo Macedo e reitera que o ministro não tem sido sério nas negociações, falando em “falta de transparência nos métodos negociais, que se comprova pela falta de resultados concretos". "Digam o que quiserem mas a verdade é que não têm nada para mostrar”, remata. Do lado da Fnam, garante que na análise do pós-greve vão ser pensadas novas formas de protesto, mas para já não adianta quais. Assume apenas que a arma da greve continua em cima da mesa.

Falando já em nome pessoal, visto que ainda não debateu a questão internamente com a estrutura sindical, o médico defende também que são necessárias mudanças na comissão tripartida. Quais? “Os representantes do Ministério da Saúde [Carlos Neves Martins e Rui Santos Ivo] não são as pessoas indicadas para a interlocução negocial. Quebrou-se a confiança mas a culpa é sempre do Ministério da Saúde e não de quem ele designou. É o ministro que tem de ser responsabilizado”.

Já José Manuel Silva entende que essa não é a mudança fundamental. “O nosso problema não é o interlocutor, pois eles só veiculam as posições que lhes são transmitidas pela tutela. Não é um problema de mensageiro mas sim de mensagem. Isto não tem sido um diálogo, tem sido uma conversa sem fim, pois quando há diálogo chegam-se a conclusões”, afirmou o bastonário. O médico acredita que Paulo Macedo terá de reagir rapidamente à greve, dando sinais de abertura aos sindicatos e à Ordem dos Médicos.

“Na verdade, entristece-me que já tenham existido duas greves gerais de médicos com este ministro da Saúde quando a Ordem dos Médicos se esforçou para que não houvesse nenhuma até porque privilegia o diálogo”, prosseguiu José Manuel Silva. Questionado sobre o que seria necessário para avançar nas negociações, o bastonário reconhece que “não pode ser tudo resolvido de um dia para o outro”. “Mas se o ministério recuasse num diploma essencial e nuclear como a portaria sobre a medicina do trabalho, em vez de apresentar esclarecimentos irrazoáveis isso seria um sinal de vontade diálogo. Um sinal com o qual o ministro poderia ter travado a greve se o tivesse dado a tempo”, remata.