Mobilização contra a reforma da lei do aborto cresce em Espanha

Presidente do Governo admitiu que o projecto contém "pontos controversos". Técnicos de saúde, juristas, escritoras e artistas denunciam reforma e exigem que o projecto seja abandonado.

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Manifestantes em Málaga contestam anteprojecto de reforma da lei do aborto AFP/JORGE GUERRERO

A proposta foi aprovada em Conselho de Ministros mas tem agora de ser votada no Congresso, onde a bancada do Partido Popular, na maioria, poderá estar sujeita à disciplina partidária de forma a garantir a sua aprovação. O projecto encontra-se agora em fase de estudo e a votação final ainda não foi agendada: é precisamente neste período de tempo que os opositores da reforma pretendem montar uma “ofensiva”.

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A proposta foi aprovada em Conselho de Ministros mas tem agora de ser votada no Congresso, onde a bancada do Partido Popular, na maioria, poderá estar sujeita à disciplina partidária de forma a garantir a sua aprovação. O projecto encontra-se agora em fase de estudo e a votação final ainda não foi agendada: é precisamente neste período de tempo que os opositores da reforma pretendem montar uma “ofensiva”.

“Os nossos esforços estão concentrados sobretudo em tentar que a lei não seja aprovada”, disse à AFP a presidente da Federação Nacional do Planeamento Familiar, Isabel Serrano, que também assumiu a coordenação do colectivo “Decidir nos hace libres” [Decidir faz-nos livres], onde participam mais de 300 organizações.

Além dos técnicos de planeamento familiar, também a Associação Espanhola de Neuropsiquiatria, da Sociedade Espanhola de Saúde Pública e a Associação Espanhola de Diagnóstico Pré-natal manifestaram publicamente a sua rejeição da proposta legislativa, que dizem comportar “riscos para as mulheres e para as crianças”. Numa tomada de posição em nome dos psiquiatras, a associação denunciou a tentativa de “instrumentalização” por parte do Governo, para “dar uma pretensão científica à ideologia de determinadas pessoas”.

No debate parlamentar desta segunda-feira, o presidente do Governo, Mariano Rajoy, admitiu que a proposta do executivo contém alguns pontos “mais controversos” e mostrou abertura para dialogar no sentido de aperfeiçoar a reforma da lei. “Temos um anteprojecto que está em fase de tramitação com os órgãos consultivos, e [o Governo] está disposto a falar e a escutar a oposição para que não se rompa unilateralmente um consenso que durava desde 1985”, observou Rajoy, referindo-se à norma relativa ao aborto que foi substituída pelo executivo socialista de Rodríguez Zapatero em 2010 (com os votos contra do PP).

A lei actual consagra o direito ao aborto até às 14 semanas de gravidez. A proposta do Governo, alegam os críticos, “é um regresso à era franquista” (1939-75), quando as mulheres espanholas eram forçadas a abortar clandestinamente ou viajar para o estrangeiro. “Se a reforma for aprovada, a segunda etapa será construir uma rede como a que existia nessas décadas”, estimou Silvia Aldavert, que coordena os serviços de planeamento familiar na região da Catalunha. “Com a nova lei, mais de 90% das mulheres que abortam actualmente terão de se deslocar ao estrangeiro, e precisarão de apoios para pagar a viagem”, notou à AFP.

A associação de mulheres juristas Themis fez saber que entregará ao Congresso um pedido para a retirada do anteprojecto do Governo da discussão. Notando que a Espanha terá provavelmente a “lei mais restritiva da Europa”, as juristas valiam-se do apoio recebido de vários países europeus, nomeadamente França. Ontem, várias mulheres espanholas entregaram – simbolicamente – pedidos de asilo político na embaixada francesa de Madrid. No próximo sábado 1 de Fevereiro, está prevista a chegada à capital espanhola de um “comboio da liberdade” com centenas de militantes prontos para se manifestarem contra a reforma.

A inciativa conta com o apoio das mais de mil signatárias de um Manifesto contra a Reforma da Lei do Aborto: escritoras, actrizes, músicas, jornalistas e cientistas que defendem o direito ao aborto e exigem que o anteprojecto seja abandonado. “Esta lei representa um grave retrocesso para os direitos reprodutivos e a liberdade das mulheres espanolas” e é uma “ameaça à sua dignidade”, escrevem. “Nenhuma maioria política nascida das urnas, por mais absoluta que seja, e nenhuma crença religiosa está legitimada para converter os direitos dos cidadãos e cidadãs em delitos, impondo-lhes princípios ideológicos particulares mediante a aplicação de uma sanção penal”, argumentam.