Saídas de José Pedro Ribeiro e Maria João Seixas “são mais um sinal de morte do cinema”

O presidente do Instituto do Cinema e do Audiovisual demitiu-se e a directora da Cinemateca Portuguesa não concorreu ao concurso público, que terminou no dia 6 de Novembro. Sector quer explicações da SEC.

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Daniel Rocha

José Pedro Ribeiro demitiu-se e Maria João Seixas não se candidatou ao concurso público que abriu no final do mês de Outubro para a direcção da Cinemateca. Nenhum dos dois responsáveis explicou os motivos das suas decisões (José Pedro Ribeiro esteve incontactável e Maria João Seixas limitou-se a confirmar a sua saída) mas, apesar de abandonarem os cargos de forma diferente, as suas saídas dão um sinal negativo ao sector, que se mostra cada vez mais preocupado com o estado do cinema em Portugal.

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José Pedro Ribeiro demitiu-se e Maria João Seixas não se candidatou ao concurso público que abriu no final do mês de Outubro para a direcção da Cinemateca. Nenhum dos dois responsáveis explicou os motivos das suas decisões (José Pedro Ribeiro esteve incontactável e Maria João Seixas limitou-se a confirmar a sua saída) mas, apesar de abandonarem os cargos de forma diferente, as suas saídas dão um sinal negativo ao sector, que se mostra cada vez mais preocupado com o estado do cinema em Portugal.

“Isto é, provavelmente, um presságio de que coisas muito negras estão para acontecer nos próximos dias”, diz ao PÚBLICO o produtor e distribuidor da Midas Filmes, Pedro Borges, para quem o cinema português corre o risco de ter “mais um ano zero”. “Temos andado a falar do ano zero de 2012 mas a verdade é que sem fundos corremos verdadeiramente o risco de 2013 e 2014 serem também anos zeros.”

Para a cineasta Margarida Gil, presidente da Associação Portuguesa de Realizadores, se José Pedro Ribeiro e Maria João Seixas decidiram abandonar os seus cargos numa altura que é tão delicada para o cinema em Portugal, que se vê limitado nos apoios estatais e que luta pela aplicação da Lei do Cinema, é “porque existem motivos muito fortes”. “E não podem ser bons”, atesta Margarida Gil, que não é branda nas palavras.

“Como é que é possível que o secretário de Estado da Cultura continue o seu dia-a-dia como se nada se passasse?”, questiona a cineasta, para quem estas saídas “são mais um sinal de morte do cinema”. “É muito inquietante porque já não se espera nada de bom e isto é muito ameaçador”, continua, esperando que os responsáveis políticos “parem para pensar e assumam de verdade o que querem fazer”. “Querem ou não cinema? Querem ou não fechar a Cinemateca? Sejam sinceros. Querem tornar Portugal numa espécie de Film Commission para virem cá os Woody Allens filmar as nossas paisagens e usufruírem do tempo?”, acrescenta Margarida Gil.

Ao PÚBLICO a Secretaria de Estado da Cultura (SEC) limitou-se a explicar que “considerou-se não haver razões” para manter José Pedro Ribeiro, que entrou no ICA como assessor jurídico em 2000, tendo em 2003 assumido o lugar de vice-presidente e, dois anos depois a presidência, depois de este ter pedido a demissão na semana passada e de ter negado o pedido que lhe foi feito para que se mantivesse no cargo até à escolha de uma nova pessoa.

Foi então substituído por Filomena Serras Pereira, que ocupava, desde Setembro, o cargo de assessora do conselho directivo do ICA. Também a vice-presidente do ICA, Ema Favila Vieira, pediu a demissão ao mesmo tempo de José Pedro Ribeiro, tendo Jorge Barreto Xavier solicitado que se mantivesse no cargo durante este período de transição.

“Mas afinal o que é que aconteceu? O secretário de Estado deve-nos uma explicação sobre estas saídas”, defende Margarida Gil, pedindo a demissão de Barreto Xavier, caso este não tenha nem uma resposta para o que está a acontecer nem uma alternativa. Alternativa, essa, pedida também por Pedro Borges. “Tudo isto deixa-nos ainda mais preocupados, se é que isso é possível, porque não vejo nada que me possa levar a pensar que o secretário de Estado está a tentar resolver o problema. Ele não dos dá essa confiança”, diz o produtor, referindo-se à Lei do Cinema que estabelece o pagamento de uma taxa anual por parte dos operadores de televisão por subscrição — que se recusam até agora a pagar.

“Há aqui o problema de empresas que não cumprem a lei e o Estado existe para fazer cumprir a lei e este é um problema do Governo todo. O Governo devia estar preocupado em encontrar um plano B”, atesta, lamentando ainda que “se desperdicem pessoas que acumularam capital de experiência” como José Pedro Ribeiro e Maria João Seixas, na direcção da Cinemateca desde Janeiro de 2010.

António-Pedro Vasconcelos, presidente da Associação de Realizadores de Cinema e Audiovisuais, lamenta também “verificar que há pessoas das mais qualificadas que se vêem obrigadas a sair”. “Estou preocupado com a situação da Cinemateca, pela sua falta de meios e de condições que assegurem a sua missão de conservação do cinema”, diz o realizador, para quem a “ameaça” ao cinema e à produção audiovisual “é séria”. com S.C.A