Bebé com VIH tratado à nascença continua em remissão aos três anos de vida

Ano e meio após a interrupção do tratamento antirretroviral, o vírus da sida continua indetectável no organismo da criança.

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Um dos bebés tratados com antirretrovirais voltou a apresentar sinais do VIH REUTERS / Edgard Garrido

Resultados preliminares sobre este primeiro caso documentado de remissão num bebé infectado pelo VIH, que já tinham sido apresentados em Março num congresso, são oficialmente publicados e confirmados esta quarta-feira, na revista New England Journal of Medicine, pelas três especialistas que têm acompanhado o bebé, duas médicas e uma imunologista.

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Resultados preliminares sobre este primeiro caso documentado de remissão num bebé infectado pelo VIH, que já tinham sido apresentados em Março num congresso, são oficialmente publicados e confirmados esta quarta-feira, na revista New England Journal of Medicine, pelas três especialistas que têm acompanhado o bebé, duas médicas e uma imunologista.

“Os nossos dados sugerem que a remissão desta criança não é apenas um acaso, mas muito provavelmente o resultado de uma terapia agressiva e muito precoce, que poderá ter impedido a instalação do vírus nas células imunitárias da criança”, diz em comunicado Deborah Persaud, da Universidade Johns Hopkins (EUA) e autora principal do artigo.

Após o início do tratamento, começou-se imediatamente a efectuar testes periódicos ao sangue do bebé, cuja mãe era seropositiva, para avaliar a carga viral. Os testes foram revelando um declínio da presença do VIH e, aos 29 dias, o vírus tornou-se indetectável no sangue com os testes habituais.

Esse tratamento continuou durante 18 meses, altura em que o contacto com a mãe da criança se perdeu. A equipa soube mais tarde que o tratamento fora interrompido mas, quando o contacto foi retomado, dez meses depois, novos testes mostraram que os níveis de VIH no sangue do bebé continuavam indetectáveis.

Actualmente, os recém-nascidos de alto risco recebem, durante as primeiras seis semanas de vida, uma combinação de antivirais em doses destinadas a prevenir a infecção pelo VIH da mãe. Mas só passam a ser tratados com doses terapêuticas, mais agressivas, se e quando a infecção for diagnosticada.

Ora, no caso deste bebé, as autoras acreditam que terá sido justamente a administração imediata de medicamentos em doses terapêuticas a evitar a formação no organismo de reservatórios onde o vírus permanece latente e de onde é muito difícil de extirpar – "esconderijos", esses, que fazem com que se o tratamento antirretroviral for interrompido, a infecção ressurja passadas umas semanas. “A rápida administração de antivirais aos recém-nascidos, horas ou dias após a exposição ao vírus, poderá, ao evitar de início a formação de esconderijos virais, ajudar os bebés a evacuar o vírus e a entrar em remissão de longo prazo sem necessidade de manter o tratamento durante toda a vida”, salienta Persaud.

Aos três anos de vida, o bebé continua livre de anticorpos específicos contra o VIH, bem como de certas células imunitárias que indicariam, caso fosse detectáveis, que ainda existe uma infecção activa. Contudo, o vírus ainda lá está, como o demonstraram testes ultra-sensíveis também realizados por estas cientistas. É aliás por isso que esta remissão não constitui uma cura total e não representa uma erradicação total do vírus. Mas segundo a equipa, o VIH remanescente parece, mesmo assim, incapaz de formar novos vírus e de relançar a infecção.

Um estudo financiado com dinheiros públicos está previsto nos EUA, em inícios de 2014, para testar este método de tratamento e determinar se ele poderia ser aplicado a todos os recém-nascidos infectados pelo VIH. Mas serão precisos estudos mais aprofundados, consideram as autoras, antes de se conseguir saber como e a quem um tal tratamento precoce deveria ser administrado.