Cartografia da espera

Discute-se a passagem ao acto. Deverão os EUA participar numa nova guerra? Os comentadores não estão de acordo e vão esgrimindo argumentos. A imagem transita para a Casa Branca. Surge o vice-presidente, cabelo branco sobre um pano azul-cobalto. Mantém uma expressão dramática. Percebe-se que treinou a arte da persuasão antes de subir ao palanque. Os comentadores voltam, num discurso cada vez mais frenético. Perguntam-se: O que estará o Presidente a pensar? Será pior matar alguém com uma bala do que com um químico? Intervalo. Anuncia-se um medicamento para a disfunção eréctil. Os riscos da droga dominam o tempo de antena: “Não deverá tomar YYY tiver problemas cardíacos”; “não tome YYY sem consultar o seu médico”. Voltam as notícias. As letras brancas corropiam no ecrã e parecem enchê-lo totalmente: “s-h-o-u-l-d---w-e---g-o---t-o---w-a-r-?”

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Discute-se a passagem ao acto. Deverão os EUA participar numa nova guerra? Os comentadores não estão de acordo e vão esgrimindo argumentos. A imagem transita para a Casa Branca. Surge o vice-presidente, cabelo branco sobre um pano azul-cobalto. Mantém uma expressão dramática. Percebe-se que treinou a arte da persuasão antes de subir ao palanque. Os comentadores voltam, num discurso cada vez mais frenético. Perguntam-se: O que estará o Presidente a pensar? Será pior matar alguém com uma bala do que com um químico? Intervalo. Anuncia-se um medicamento para a disfunção eréctil. Os riscos da droga dominam o tempo de antena: “Não deverá tomar YYY tiver problemas cardíacos”; “não tome YYY sem consultar o seu médico”. Voltam as notícias. As letras brancas corropiam no ecrã e parecem enchê-lo totalmente: “s-h-o-u-l-d---w-e---g-o---t-o---w-a-r-?”

À minha volta há muitas mesas e quase todas estão ocupadas por médicos e enfermeiros. Comem e falam apressadamente, de costas para o ecrã. Ao fundo à esquerda estão alguns homens mais velhos, cada um sozinho na sua mesa. São provavelmente veteranos de guerra, os doentes deste hospital. Também não olham para a televisão. Preocupam-se em fazer chegar a comida à boca com gestos frágeis a que dedicam toda a atenção. Terão passado pela Coreia ou Vietname e agora, no hospital, são o museu vivo da glória e do sofrimento. Alguns já não comem e aproveitam para deixar cair a cabeça sobre a mão apoiando o braço num parapeito.

A Sul daqui está uma cidade de onze colinas onde milhares de jovens vivem com os seus smartphones. Há Sillicon Valley e as start-up de biotecnologia. Uma nova ponte sobre a baía será inaugurada brevemente e com ela o gélido Verão de São Francisco deverá aproximar-se do fim.

Mas agora estou no Patriot Cafe, Hospital dos Veteranos de Guerra.

À minha direita as nuvens toldam o Pacífico.

Do outro lado, os homens esperam.

Bernardo Moura é médico