J. J. Cale (1938-2013): o criador de sucessos alheios

Guitarrista e compositor, escreveu grandes canções, como Cocaine ou Call Me the Breeze, que Eric Clapton, os Lynyrd Skynyrd e outros tornaram célebres. Génio discreto, J. J. Cale foi um dos criadores do género musical Tulsa Sound e influenciou várias gerações de músicos, de Neil Young a Mark Knopfler.

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J. J. Cale parece nunca ter tido grande desejo de se tornar famoso, e é de crer que se sentisse confortável como autor de sucessos alheios DR

John Weldon Cale, que adoptou o nome artístico de J. J. Cale, nasceu em Tulsa em 1938, e ajudou a criar um novo género musical que adoptaria o nome da sua cidade natal, no estado de Oklahoma: o Tulsa Sound, uma singular mistura de blues, country e jazz com o rockabilly dos anos 50. Já o estilo peculiar de Cale ficou conhecido como laid back, ou seja, descontraído, relaxado.

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John Weldon Cale, que adoptou o nome artístico de J. J. Cale, nasceu em Tulsa em 1938, e ajudou a criar um novo género musical que adoptaria o nome da sua cidade natal, no estado de Oklahoma: o Tulsa Sound, uma singular mistura de blues, country e jazz com o rockabilly dos anos 50. Já o estilo peculiar de Cale ficou conhecido como laid back, ou seja, descontraído, relaxado.

O próprio Cale explica numa entrevista que as suas primeiras influências musicais foram os discos de rockabilly que vinham de Memphis, e músicos de blues, como Clarence Brown ou Billy Butler. “Ao tentar imitá-los, falhei e acabei por criar uma coisa minha”, resume. 

Tendo-se sempre considerado essencialmente um guitarrista, que apenas se decidiu a escrever canções para ganhar algum dinheiro, Cale interpretou os seus próprios temas, mas foram quase sempre as versões de terceiros que os tornaram famosos. Os exemplos mais óbvios são After Midnight ou Cocaine, imortalizados por Eric Clapton, mas muitos outros cantores e bandas adoptaram canções de Cale, como Johnny Cash, Santana, o malogrado grupo rock Lynyrd Skynyrd, os Deep Purple ou os The Band. Só o tema After Midnight teve uma dezena de versões, tendo sido gravado, entre outros, por Chet Atkins, pelo grupo feminino The Shirelles e pelo músico brasileiro Sérgio Mendes.

O estilo “relaxado” de Cale influenciou ainda músicos como Neil Young – que o considerava, a par de Jimy Hendrix, um dos dois melhores guitarristas que alguma vez vira actuar – ou o líder dos Dire Straits, Mark Knopfler, que também reconheceu publicamente a sua dívida ao músico de Tulsa, bastante evidente em Sultans of Swing, o êxito que lançou o grupo britânico. 

Fuga para Los Angeles

Depois de alguns anos a tocar nos bares de Tulsa, e de alguns singles gravados com o nome Johnny Cale, que não tiveram grande sucesso, Cale decidiu-se a seguir o exemplo de outros músicos locais, como David Gates, Leon Russell (então ainda Russell Bridges), ou Carl Radle, futuro baixista da banda de Eric Clapton, e rumou à Califórnia. Chegou a Los Angeles em 1964 e ali conheceu, através de Leon Russell, o produtor independente Snuff Garrett, que o coloca na editora Liberty, onde Garrett trabalhara e que gravará vários discos de Cale.

Nesses meados dos anos 60, Cale trabalha ainda num célebre bar de Sunset Strip, em Hollywood, o Whiskey A-Go-Go, que Elmer Valentine abrira inspirado no sucesso de um bar homónimo em Paris. Contratado para cobrir as folgas de Johnny Rivers, o dinheiro que ganha com estas actuações, somado aos dividendos dos discos, ajuda-o a ir sobrevivendo. É Elmer Valentine quem lhe sugere que adopte o nome artístico J. J. Cale, para evitar confusões com o co-fundador dos Velvet Underground.

Em 1966, Garrett funda uma nova chancela, a Viva Records, e grava com Cale e outros músicos – agrupados sob a designação Letahercoated Minds – o álbum A Trip Down the Sunset Strip. É no contexto deste projecto que Cale compõe After Midnight, pensada para ser uma faixa instrumental do disco. Mas a música acaba por não entrar no álbum, e depois de Cale a transformar num tema cantado e de escrever a respectiva letra, edita-a, juntamente com Slow Motion, num single da Liberty, lançado ainda em 1966. 

Só quatro anos mais tarde, ao ouvir a sua própria canção na rádio, cantada por outro, é que J. J. Cale se apercebe de que Eric Clapton gravara uma versão de After Midnight.

O empurrão de Clapton

Numa entrevista à revista Mojo, Cale explica que ouvir a sua canção na voz de Clapton foi uma excelente surpresa. “Eu era mesmo pobre, não ganhava o suficiente para comer, e já não era um rapazinho, estava nos meus trinta, de modo que fiquei muito contente com a perspectiva de ir ganhar algum dinheiro”. 

O sucesso de After Midnight não só representou um balão de oxigénio financeiro, como chamou a atenção para o seu autor, então ainda bastante pouco conhecido. Capitalizando esta nova notoriedade, Cale consegue gravar o seu primeiro álbum a solo, Naturally, lançado em 1972 na Shelter. O disco recupera After Midnight, já então popularizada por Clapton, e inclui Call Me the Breeze, que ficará famosa na versão dos Lynyrd Skynyrd, e Crazy Mama, canção com a qual Cale alcançará assinalável sucesso comercial, e por uma vez na sua própria interpretação original.

Nos anos seguintes, a Shelter edita uma série de álbuns de Cale, todos com títulos igualmente concisos: Really (1973), Okie (1974) e Troubadour (1976). Este último inclui dois temas que Eric Clapton irá adoptar: Travelin’ Light e Cocaine, que se tornará um dos maiores êxitos do cantor e guitarrista inglês.

Clapton gravou a canção logo em 1977, no álbum Slowhand, e volta a inclui-la no reportório do seu álbum ao vivo Just One Night. É então que Cocaine, editada em single com Tulsa Time, se torna um grande sucesso de vendas. Outras versões desta canção de Cale serão mais tarde gravadas pela banda rock Nazareth e pelo guitarrista Andy Taylor, dos Duran Duran. 

J. J. Cale parece nunca ter tido grande desejo de se tornar famoso, e é de crer que se sentisse confortável como autor de sucessos alheios. “O que é mesmo agradável”, respondia a quem lhe perguntava se não o incomodava a sua relativa obscuridade, “é receber o cheque pelo correio”.

A sua amizade com Clapton era genuína. Um dos últimos trabalhos de Cale foi The Road to Escondido, um álbum gravado em colaboração pelos dois músicos, que ganhou um Grammy em 2007. No ano anterior, Cale declarara, numa entrevista à Associated Press: “Se não fosse por Eric Clapton, estaria provavelmente a vender sapatos”.