Desflorestação pode comprometer barragens na Amazónia

Estudo sugere que destruição da floresta reduzirá quantidade de chuva, diminuindo potencial de produção eléctrica.

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Num estudo publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences, sete investigadores concluem que a desflorestação diminui a quantidade de chuva, reduzindo a disponibilidade de água nos rios, contrariamente ao que se supunha até agora.

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Num estudo publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences, sete investigadores concluem que a desflorestação diminui a quantidade de chuva, reduzindo a disponibilidade de água nos rios, contrariamente ao que se supunha até agora.

O estudo teve por base a polémica barragem de Belo Monte, a terceira maior do mundo, que está a ser construída na bacia do Xingu, um afluente do Amazonas. A barragem resultará num lago artificial de 500 quilómetros quadrados, o dobro da área do Alqueva, inundando vastas áreas de floresta.

Por um lado, menos árvores pode resultar em menos consumo de água pelas plantas e, portanto, mais escoamento para os rios. Este dado é confirmado pelo estudo: num cenário de 20% a 40% de desflorestação na bacia do Xingu, poderia haver, caso não existam outros efeitos, um aumento de 4% a 12% no volume de água que corre nos rios.

Mas o estudo vai além e investiga os efeitos indirectos que uma floresta menos densa tem sobre os níveis de precipitação, chegando a um resultado oposto. “Considerando-se os efeitos indirectos, a desflorestação da região da Amazónia inibe as chuvas na bacia do Xingu, contrabalançando a queda na evapotranspiração e reduzindo as descargas em 6-36%”, conclui o artigo.

Se até 2050 houver uma redução de 40% da floresta amazónica, a quantidade de chuva poderá cair 11-15% e a electricidade produzida em Belo Monte sofreria uma baixa de 35-40%.

O climatologista Marcos Costa, da Universidade Federal de Viçosa e um dos autores do artigo, diz que os resultados são importantes para o planeamento energético a longo prazo. “Estamos a investir milhares de milhões de dólares em centrais hidroeléctricas em todo o mundo. Quanto mais floresta ficar de pé, mais água teremos nos rios e mais electricidade conseguiremos gerar com estes projectos”, afirma, num comunicado.

A desflorestação na Amazónia tem diminuído nos últimos anos, tendo chegado a um mínimo histórico no ano passado, desde se iniciou, em 1988, a monitorização regular com imagens de satélite. Ainda assim, entre Agosto de 2011 e Julho de 2012, despareceram 4656 quilómetros quadrados de floresta, o equivalente à área ardida na pior época de fogos de Verão em Portugal, em 2003.

Além disso, os números globais escondem variações regionais importante. “O nosso estudo mostra que os enormes passos que o Brasil tem dado para reduzir a desflorestação da Amazónia estão na prática a ajudar a garantir a segurança do abastecimento energético do país”, afirma a autora principal do estudo, Cláudia Stickler, do Programa Internacional do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazónia (IPAM). “Mas estes esforços têm de andar de mãos dadas com a conservação a nível regional”, completa.

O estudo lança mais uma acha na polémica sobre a barragem de Belo Monte, que tem sido defendida pelo Governo brasileiro mas contestada por ambientalistas, populações indígenas e organizações internacionais. Recentemente, índios de várias etnias ocuparam o estaleiro de obras da barragem durante uma semana.