Laqueação de trompas “nunca pode ser imposta”, mesmo que mãe maltrate filhos

Presidente do Conselho de Ética para as Ciências da Vida comenta caso da mulher de 34 anos que arrisca perder sete dos seus filhos para adopção.

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Miguel Oliveira da Silva preside ao Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida PÚBLICO

O presidente do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (CNECV), Miguel Oliveira da Silva, disse à Lusa que “a laqueação de trompas nunca pode ser imposta a uma mulher que disponha de autonomia ética”.

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O presidente do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (CNECV), Miguel Oliveira da Silva, disse à Lusa que “a laqueação de trompas nunca pode ser imposta a uma mulher que disponha de autonomia ética”.

De acordo com o responsável, cujas especialidades médicas são a Ginecologia e a Obstetrícia, tal ideia “é um absurdo impensável num Estado de Direito”. “Mesmo que se comprove que uma mãe maltrata os filhos, isso não pode levar a qualquer tipo de pressão para laquear as trompas”, acrescentou.

Miguel Oliveira da Silva sublinhou mesmo que, “em caso algum”, esse procedimento médico pode ser “condicionado ou relacionado com a possibilidade de se retirar o poder parental a uma mãe que maltrate os filhos”, porque “uma coisa nada pode ter que ver com a outra”.

O presidente do CNECV comentava à Lusa um caso noticiado recentemente, segundo o qual o Tribunal de Sintra ordenou que fossem retirados a uma mulher sete dos seus dez filhos, para serem entregues para adopção.

Alegadamente, a decisão judicial baseia-se nas dificuldades económicas da família e no incumprimento, por parte da mãe, de várias medidas do acordo de promoção de protecção de menores, de que estava a ser alvo. Uma dessas medidas era que a mulher provasse que estava a ser acompanhada no hospital com vista à laqueação de trompas, o que nunca fez.

Também o presidente da Associação Portuguesa de Bioética comentou nesta sexta-feira este caso, dizendo que não se pode impor a laqueação de trompas a uma mulher com capacidade de fazer escolhas livres e alertando para o grave precedente que a medida pode criar.

“Do ponto de vista de análise ética, ou uma mulher tem capacidade para se autodeterminar e fazer escolhas livres ou não tem, mas, se tem, não se pode fazer essa imposição”, disse Rui Nunes à Lusa.

O especialista, também membro do Conselho Nacional de Ética da Ordem dos Médicos, vai mais longe, considerando que a laqueação não deve sequer ser aconselhada a uma mulher por esta não ter condições para criar os filhos.

“Pode-se aconselhá-la no sentido de haver uma atitude responsável no planeamento familiar. Hoje há contraceptivos e pílulas que obtêm o mesmo objectivo. Para uma pessoa que pode fazer escolhas livres, este seria o caminho adequado”, afirmou.