Activistas do SOS Racismo "não deixam ninguém dormir"

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José Falcão esteve na génese do SOS Racismo e ainda é o seu principal rosto Foto: Miguel Manso

Quando o SOS Racismo apareceu, Portugal era outro país. A morte de José Carvalho, dirigente do PSR, revelava a força irada dos skinheads, que escreviam o que lhes apetecia em qualquer parede: "Morte aos pretos", "Portugal aos portugueses", "Primazia de emprego e de casa para os brancos". A extrema-direita organizara-se. No segundo boletim de 1990 da Associação Cultural de Acção Nacional podia ler-se: "Exigimos a proibição imediata da imigração, o repatriamento progressivo mas total dos imigrantes". A extrema-esquerda reagiu, recorda o jornalista do PÚBLICO Amílcar Correia, que acompanhou os primeiros anos da associação.

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Quando o SOS Racismo apareceu, Portugal era outro país. A morte de José Carvalho, dirigente do PSR, revelava a força irada dos skinheads, que escreviam o que lhes apetecia em qualquer parede: "Morte aos pretos", "Portugal aos portugueses", "Primazia de emprego e de casa para os brancos". A extrema-direita organizara-se. No segundo boletim de 1990 da Associação Cultural de Acção Nacional podia ler-se: "Exigimos a proibição imediata da imigração, o repatriamento progressivo mas total dos imigrantes". A extrema-esquerda reagiu, recorda o jornalista do PÚBLICO Amílcar Correia, que acompanhou os primeiros anos da associação.

No dia 10 de Dezembro de 1990, Dia dos Direitos Humanos, José Falcão, Filomena Aivado e Rosana Albuquerque registaram o SOS Racismo. "Portugal era o país dos brandos costumes. Dizia-se que não havia racismo, mas os skinheads matavam", lembra José Falcão. E, nas ruas, nos prédios, não era raro alguém dizer coisas como: "O trabalho é para o preto", "as pretas são boas para curtir, não para casar", "estás a fazer ciganices". Era preciso produzir materiais, chatear jornalistas, ir às escolas sensibilizar professores e alunos.

O consultor João Tocha viveu o fervor desses primeiros anos. Foi ali que conheceu o músico João Aguardela e outros rapazes cheios de vontade de mudar o mundo - gente do PSR e do PCP, independentes. Já não é o membro activo desses tempos, a vida levou-o para outro lado, mas ainda colabora. E ainda se emociona com isso: "Quando pago a quota anual de 20 euros ou compro uma brochura por cinco euros, as pessoas ficam tão contentes que até parece que estou a dar uma fortuna. Eles fazem tanto com tão pouco!".

Três condenações num ano

Portugal já não é o deserto em matéria de associações de defesa dos direitos das minorias. Hoje, o país é mais diverso e conta com várias organizações não governamentais. Não há, porém, quem não reconheça o papel de uma entidade, como o SOS, a interligá-las, a uni-las numa frente de combate ao racismo e à xenofobia. "O SOS faz com que estejamos mais alerta", considera Rosário Farmhouse, alta comissária para o Diálogo Intercultural. "Às vezes, deviam recolher mais informação antes de avançar para a queixa, mas são pró-activos, não deixam ninguém dormir, e isso é bom."

Pela primeira vez, o Estado atribuiu-lhes um subsídio (a propósito do documentário SOS Racismo - 20 anos a quebrar tabus, de Bruno Cabral, um jovem realizador que se espantou com "a diversidade do trabalho realizado pela associação", sobretudo nas escolas). Mas a convivência com o antes Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas já foi muito tensa. Vaz Pinto chegou a processar José Falcão por este acusá-lo de "falsidade, cobardia, desonestidade e incompetência". Na origem do desentendimento com o então alto comissário, a exclusão da associação do Conselho Consultivo para os Assuntos da Imigração. Rui Marques, que ocupou o cargo depois de Vaz Pinto e antes de Farmhouse, sempre foi mais diplomático: "Discordo de muitas posições que toma, mas com certeza tem desempenhado um papel importante".

Olhando para estes 20 anos, José Falcão destaca contributos para a criminalização do ódio racial, para a lei da discriminação racial, para a Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial. Sem deixar de sublinhar o baixíssimo número de condenações, o cheiro a impunidade. "Primeiro, muitas pessoas não sabem que é possível denunciar esses casos e não os denunciam. Segundo, é muito difícil provar um acto racista", justifica Farmhouse, reconhecendo que no ano que agora finda só houve "duas ou três condenações".

A luta continua dentro de momentos, noutro sítio. O SOS deixará em breve o espaço periférico que ocupa na Ameixoeira. Helena Roseta, vereadora da Habitação Social, tinha pensado num sítio central, mas descobriu que estava destinado a moradia. "Para irem para lá, o Plano Director Municipal teria de ser alterado", explicou. "Agora temos duas hipóteses para o SOS ver." Bem mais centrais. A precisar de algumas obras. Será isso uma forma de reconhecimento?