Morreu a fada-madrinha da literatura infantil portuguesa

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Além de livros para adultos, deixou, em prosa e em verso, mais de duas dezenas de obras para crianças, organizou antologias e divulgou incansavelmente quer autores mais jovens, quer os pioneiros da literatura infanto-juvenil portuguesa, como Aquilino Ribeiro, Ana de Castro Osório ou Olavo d'Eça Leal. "A Matilde foi a fada-madrinha da literatura infantil" portuguesa, disse o escritor António Torrado, num dos muitos e comovidos testemunhos que assinalaram a morte da autora.

Para se perceber a que ponto a escritora se tornou na grande "figura tutelar para autores das gerações seguintes, como António Torrado, Luísa Ducla Soares ou Alice Vieira", como afirma o poeta e ensaísta José António Gomes, autor de um estudo sobre a poesia de Matilde Rosa Araújo, é preciso ter em conta não apenas os seus livros, mas também o empenho com que se dedicou a divulgar a literatura infanto-juvenil portuguesa, em artigos de imprensa e conferências, bem como o seu contributo para que estes livros começassem a ser adoptados nas escolas.

Matilde Rosa Araújo não terá sido uma escritora do calibre de uma Sophia de Mello Breyner Andresen, a cuja geração pertenceu, mas, mesmo assim, António Torrado pode bem ter razão quando diz que a autora de O Livro de Tila "era a medida padrão para a literatura infanto-juvenil".

Nascida, em 1921, numa quinta que os avós possuíam em Benfica, Matilde estudou em casa, com professores particulares, e formou-se depois em Filologia Românica pela Faculdade de Letras de Lisboa, tendo tido como professores Vitorino Nemésio e Jacinto Prado Coelho. A sua tese, sobre o género jornalístico da reportagem, foi a primeira análise académica que em Portugal se dedicou ao jornalismo. A imprensa sempre a interessou e foi colaboradora regular de diversos jornais - e de revistas literárias como Távola Redonda, Graal, Árvore, Vértice ou Seara Nova -, deixando dispersos um grande número de contos, poemas, crónicas e artigos.

Professora do ensino secundário ao longo de quarenta anos, em escolas de norte a sul do país, revelou-se como escritora em 1943, com A Garrana, que venceu o concurso "Procura-se um novelista", organizado pelo jornal O Século e pelo Rádio Clube Português. Mas, descontados alguns poemas infantis publicados em revistas, só em 1957, com O Livro de Tila, inaugurou a sua carreira de escritora infanto-juvenil.

Com raras excepções, toda a sua poesia para crianças ronda em torno desta Tila, diminutivo do seu próprio nome. A parte mais substancial da sua obra é constituída por novelas e livros de contos, mas também a sua prosa, como nota José António Gomes, "valoriza mais a escrita do que o enredo" e está cheia de "marcas líricas" que a afastam da narrativa convencional. Gomes recorda ainda que a qualidade da sua poesia levou Fernando Lopes-Graça a musicar integralmente O Livro de Tila, criando aquele que, na sua opinião, "é o melhor cancioneiro infantil na história da música portuguesa".

Antes de 1974, a obra de Matilde Rosa Araújo, diz Gomes, estava próxima do ideário neo-realista e "trouxe para a literatura os meninos de pé descalço, do trabalho infantil". Mas, sem mudar a sua visão essencial, soube adaptar-se aos novos tempos, tratando, por exemplo, temas ambientais. Deixa inédito o livro Florinda e o Pai Natal.

A ministra da Educação, Isabel Alçada, também autora de livros para crianças, descreveu Matilde Rosa Araújo como "uma pessoa com uma grandeza de alma extraordinária", que "deu um contributo maravilhoso para a nossa literatura e para a forma como os adultos se relacionam com as crianças". Também a ministra da Cultura, Gabriela Canavilhas, prestou homenagem à escritora que "povoou o imaginário de inúmeras crianças portuguesas" e "influenciou inequivocamente gerações de escritores".

Na literatura infanto-juvenil, diz o comunicado do Ministério da Cultura, "haverá sempre um antes e um depois de Matilde Rosa Araújo".

O funeral da escritora, cujo corpo está hoje a ser velado na sede da Sociedade Portuguesa de Autores, tem lugar esta tarde, pelas 15h00, no Cemitério dos Prazeres, em Lisboa.

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Além de livros para adultos, deixou, em prosa e em verso, mais de duas dezenas de obras para crianças, organizou antologias e divulgou incansavelmente quer autores mais jovens, quer os pioneiros da literatura infanto-juvenil portuguesa, como Aquilino Ribeiro, Ana de Castro Osório ou Olavo d'Eça Leal. "A Matilde foi a fada-madrinha da literatura infantil" portuguesa, disse o escritor António Torrado, num dos muitos e comovidos testemunhos que assinalaram a morte da autora.

Para se perceber a que ponto a escritora se tornou na grande "figura tutelar para autores das gerações seguintes, como António Torrado, Luísa Ducla Soares ou Alice Vieira", como afirma o poeta e ensaísta José António Gomes, autor de um estudo sobre a poesia de Matilde Rosa Araújo, é preciso ter em conta não apenas os seus livros, mas também o empenho com que se dedicou a divulgar a literatura infanto-juvenil portuguesa, em artigos de imprensa e conferências, bem como o seu contributo para que estes livros começassem a ser adoptados nas escolas.

Matilde Rosa Araújo não terá sido uma escritora do calibre de uma Sophia de Mello Breyner Andresen, a cuja geração pertenceu, mas, mesmo assim, António Torrado pode bem ter razão quando diz que a autora de O Livro de Tila "era a medida padrão para a literatura infanto-juvenil".

Nascida, em 1921, numa quinta que os avós possuíam em Benfica, Matilde estudou em casa, com professores particulares, e formou-se depois em Filologia Românica pela Faculdade de Letras de Lisboa, tendo tido como professores Vitorino Nemésio e Jacinto Prado Coelho. A sua tese, sobre o género jornalístico da reportagem, foi a primeira análise académica que em Portugal se dedicou ao jornalismo. A imprensa sempre a interessou e foi colaboradora regular de diversos jornais - e de revistas literárias como Távola Redonda, Graal, Árvore, Vértice ou Seara Nova -, deixando dispersos um grande número de contos, poemas, crónicas e artigos.

Professora do ensino secundário ao longo de quarenta anos, em escolas de norte a sul do país, revelou-se como escritora em 1943, com A Garrana, que venceu o concurso "Procura-se um novelista", organizado pelo jornal O Século e pelo Rádio Clube Português. Mas, descontados alguns poemas infantis publicados em revistas, só em 1957, com O Livro de Tila, inaugurou a sua carreira de escritora infanto-juvenil.

Com raras excepções, toda a sua poesia para crianças ronda em torno desta Tila, diminutivo do seu próprio nome. A parte mais substancial da sua obra é constituída por novelas e livros de contos, mas também a sua prosa, como nota José António Gomes, "valoriza mais a escrita do que o enredo" e está cheia de "marcas líricas" que a afastam da narrativa convencional. Gomes recorda ainda que a qualidade da sua poesia levou Fernando Lopes-Graça a musicar integralmente O Livro de Tila, criando aquele que, na sua opinião, "é o melhor cancioneiro infantil na história da música portuguesa".

Antes de 1974, a obra de Matilde Rosa Araújo, diz Gomes, estava próxima do ideário neo-realista e "trouxe para a literatura os meninos de pé descalço, do trabalho infantil". Mas, sem mudar a sua visão essencial, soube adaptar-se aos novos tempos, tratando, por exemplo, temas ambientais. Deixa inédito o livro Florinda e o Pai Natal.

A ministra da Educação, Isabel Alçada, também autora de livros para crianças, descreveu Matilde Rosa Araújo como "uma pessoa com uma grandeza de alma extraordinária", que "deu um contributo maravilhoso para a nossa literatura e para a forma como os adultos se relacionam com as crianças". Também a ministra da Cultura, Gabriela Canavilhas, prestou homenagem à escritora que "povoou o imaginário de inúmeras crianças portuguesas" e "influenciou inequivocamente gerações de escritores".

Na literatura infanto-juvenil, diz o comunicado do Ministério da Cultura, "haverá sempre um antes e um depois de Matilde Rosa Araújo".

O funeral da escritora, cujo corpo está hoje a ser velado na sede da Sociedade Portuguesa de Autores, tem lugar esta tarde, pelas 15h00, no Cemitério dos Prazeres, em Lisboa.