Portugal tem das mais altas taxas de mortalidade por gripe A

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Gripe A provocou 17 mil mortes no mundo, 121 em Portugal Adriano Miranda (arquivo)

Ainda não há estudos que permitam saber o que teria acontecido se os governos não tivessem tomado medidas após a declaração da pandemia de gripe A (H1N1). Mas Filipe Froes, pneumologista e consultor da Direcção-Geral da Saúde (DGS), acredita que "sem preparação teriam morrido duas a três vezes mais pessoas". Números do Centro Europeu para a Prevenção e Controlo de Doenças (ECDC) colocam Portugal como um dos países europeus com maior taxa de mortalidade por gripe A.

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Ainda não há estudos que permitam saber o que teria acontecido se os governos não tivessem tomado medidas após a declaração da pandemia de gripe A (H1N1). Mas Filipe Froes, pneumologista e consultor da Direcção-Geral da Saúde (DGS), acredita que "sem preparação teriam morrido duas a três vezes mais pessoas". Números do Centro Europeu para a Prevenção e Controlo de Doenças (ECDC) colocam Portugal como um dos países europeus com maior taxa de mortalidade por gripe A.

Passa hoje um ano desde que foram conhecidos os primeiros casos no México. A doença afectou 214 países, foram confirmadas 17.798 mortes no mundo, 121 pessoas morreram em Portugal. O pneumologista acredita que se não tivessem sido tomadas medidas de precaução teria havido mais mortes e mais recursos de saúde gastos.

A avaliação da DGS está ainda a decorrer mas Filipe Froes lembra que as pessoas que morreram eram jovens - a média de idades foi de 47,7 anos - e um quinto eram saudáveis. Contando que vivessem pelo menos até aos 70 anos, é possível contabilizar "2843 anos potenciais de vida perdidos", sublinha.

Números do ECDC colocam Portugal como um dos países com piores taxas de mortalidade por gripe A, ainda assim baixas: de 0,91 a 1,2 mortes por 100 mil habitantes, face a países como a Espanha, França e Itália, onde se ficou pelos 0,31 a 0,6 mortes por 100 mil habitantes.

A subdirectora-geral da Saúde, Graça Freitas, diz que ainda é cedo para saber se estes números traduzem diferenças reais de mortalidade e não diferentes taxas de detecção e notificação. Por outro lado, nota que os números são tão pequenos que a comparação se torna estatisticamente difícil.

Vai levar algum tempo a perceber se diferentes taxas de vacinação se traduziram em menos mortes. O certo é que os países escandinavos tiveram maior capacidade de vacinação, diz Filipe Froes, dando o exemplo da Suécia, onde a taxa de vacinação andou pelos 60 por cento e onde os números de mortes são os mais baixos, juntamente com a Áustria. Portugal ficou-se pelos cinco por cento de cobertura vacinal, acrescenta.

Este ano pode dizer-se que as mortes por gripe sazonal, que afectam sobretudo maiores de 75 anos, "são indetectáveis", nota o especialista em saúde pública da DGS, Mário Carreira. Isto porque 99 por cento das amostras deram conta da presença do H1N1.

Graça Freitas recusa a acusação de "excesso de zelo" e usa a imagem do seguro de incêndio que se paga todos os anos esperando que a casa nunca arda. "Devemos estar satisfeitos porque o vírus não foi agressivo. Além disso, os governos tiveram capacidade para se organizar." Onde Graça Freitas julga que é preciso melhorar é na comunicação. Com os media convencionais (jornais, TV, rádio) até correu bem, "mas onde circularam as notícias mais estranhas, sobre as vacinas, foi em blogues anónimos, no YouTube, Facebook, Twitter". "Temos muito que aprender", diz.

António Vaz Carneiro, director do Centro de Estudo de Medicina Baseada na Evidência, não duvida de que as medidas "diminuíram a mortalidade" mas afirma que é preciso medir riscos e ponderar decisões, porque "os recursos em saúde são finitos". O impacto da vacina está por calcular mas Vaz Carneiro estima que para se salvar uma vida seria preciso vacinar entre 80 a 100 mil portugueses, o que "é muito". Ao mesmo tempo, o clínico pensa que, a nível da comunicação, a gripe A deve servir de "estudo de caso do que não se deve fazer", começando pela Organização Mundial de Saúde e pelas "hiper-reacções nacionais". "Gostava que a ciência nos ajudasse a ser menos emocionais", desabafa.

Por outro lado, o fornecimento de vacinas contra a gripe A tem ajudado no aumento das receitas de alguns dos maiores laboratórios. Entre Janeiro e Março deste ano, os lucros do grupo suíço Novartis cresceram 49 por cento e as vendas 25 por cento, para mais de 2200 milhões de euros - 300 milhões de euros acima do previsto pela farmacêutica. Mais de 826 milhões de euros deveram-se às vacinas contra o H1N1.

A GlaxoSmithKline, que forneceu a vacina a Portugal, foi outro dos laboratórios que mais lucraram com a venda de novos produtos contra a gripe. Só entre Outubro e Dezembro de 2009 forneceu 130 milhões de doses de vacinas para o H1N1. No ano passado, as vendas desta vacina traduziram-se num ganho acrescido de 1020 milhões de euros para as receitas do grupo britânico, para além de quase 832 milhões com o anti-viral Relenza.