O regresso ao passado

O CDS, na aceitação falaz de uma aparente irrelevância dogmática e discursiva, foi conivente com uma intervenção essencialmente política do Estado.

Para justificar o apoio dado ao Novo Banco e à solução proposta pelo Banco de Portugal para o Grupo BES, Paulo Portas recordou a decisão de Vítor Constâncio em nacionalizar o BPN.

Com o mal dos outros posso eu bem, como sói dizer-se. O vice-primeiro-ministro considerou que, entre as possíveis soluções para o Banco Espírito Santo, esta foi “a mais aceitável”. Irrevogavelmente, na voz de Portas, o que deveria ter sido antecipado e jurídico foi improvisado e político.

Os problemas do Grupo BES e a falta de idoneidade da sua anterior gestão não são de ontem. Os reguladores não atalharam a tempo a estrondosa insolvência do Grupo BES e o (super) Ministério da Economia CDS também não. O preço a pagar foi a irrelevância do Estado regulador, a total descredibilização do mercado de valores mobiliários em Portugal e uma prometida barafunda e confrontação legal ampla. Protegeram-se depósitos e depositantes contra accionistas (sejam neste caso os do BES). Tenham ou não tido aqueles accionistas efectiva capacidade de gestão ou de influenciar a gestão do banco, pagaram o preço.

Porque sim.

Não está certo, não é aceitável, não é material, nem constitucionalmente legal. É errado e muito injusto. E é evidentemente certo que, a prazo, o contribuinte acabará sempre por ficar desprotegido num contexto de arbitrariedade e discricionariedade do Estado.

Infelizmente, o caos (tão laboriosamente construído por tantos governados e governantes em Portugal nas últimas décadas) traz sempre consigo o gérmen da tirania.

O CDS, na aceitação falaz de uma aparente irrelevância dogmática e discursiva, foi conivente com uma intervenção essencialmente política do Estado que, bem ao contrário do que diz Portas, em nada contribuirá para a estabilidade do sistema financeiro como um todo, não protege o mercado de valores mobiliários (ao invés, o risco dos accionistas foi elevado por lei do Estado para patamares de absoluta incerteza que estão muito para lá da simples variação futura da rendibilidade), diminui e desresponsabiliza a regulação e destrói os pequenos aforradores.

Onde está o campeão dos pequenos?

Ser membro eficiente de uma coligação governativa passa, desde logo (e sempre), por exigir o cumprimento do Estado de Direito, a estruturação da melhor decisão e a decorrente explicação detalhada aos governados.

Nada foi (bem) explicado. Acendem-se as habituais fogueiras mediáticas que prejudicam o bem-fazer da justiça. Mas já não estamos no país dos autos-de-fé, dos patíbulos de Belém, nem dos bodes expiatórios.

Subliminarmente, voltam a ouvir-se os slogans antimercado de capitais. Mas o tempo não volta para trás.

Ou nunca saímos de 1975?

Advogado, conselheiro nacional do CDS

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