“Não podemos replicar o passado”

Miguel Albuquerque convidou independentes para o executivo e vai alterar a orgânica do governo. Garante ainda que quer baixar IRS em 2016.

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Um dia depois de arrecadar uma vitória com maioria absoluta por uma margem mínima nas eleições regionais na Madeira, o líder do PSD-M e futuro presidente do governo regional diz que quer mudar a imagem “distorcida” que se tem da região.

Vai manter a mesma orgânica do governo deixado por Alberto João Jardim?
Não. Vamos separar a área Social da Saúde e possivelmente focar algumas questões políticas em secretarias, designadamente alguns sectores.

E vão entrar independentes para o executivo?
Sim. Não tenho nada contra os militantes, antes pelo contrário. Não tenho complexo nenhum relativamente aos filiados. Quero é que as pessoas sejam competentes, íntegras e profissionalmente habilitadas a exercer os cargos.

Está preocupado com a reanálise de votos nulos e protestados nas mesas?
Não. A verificação dos votos sempre aconteceu. A nossa vitória foi muito clara. Ganhámos em todos os concelhos, incluindo os sete que o PSD tinha perdido nas últimas autárquicas, e em 50 das 54 freguesias da Madeira. A segunda força política (CDS) obteve 13% e o PSD 44,33%. A nossa legitimidade para governar é incontestável. Temos o parlamento mais democrático do país em que um grupo de amigos com dois mil e tal votos pode eleger um deputado. E o PSD só atingiu este resultado porque fez uma transição com um grande debate, umas eleições internas bem disputadas e um congresso em que abriu o partido à sociedade e renovou as listas. Nenhum partido da oposição o fez, continuam com as mesmas caras, com os mesmos apparatchiki, um conjunto de pessoas que beneficiam deste sistema eleitoral para fazerem do poleiro parlamentar um modo de vida.

E o PSD fez o mesmo.
Está bem... mas houve uma mudança.

Vamos supor que a CDU consegue ir buscar os cinco votos. Governaria sem maioria absoluta?
É um cenário que nem vou colocar, porque teria grandes dificuldades, neste modelo, para a governação da Madeira. Não me passa pela cabeça.

O que o diferencia de Alberto João Jardim? No fundo nascem no mesmo partido.
Essa questão nem deve ser colocada. Temos personalidades diferentes. Eu tenho uma concepção de desenvolvimento da Madeira que assenta em alguns pressupostos doutrinários que são semelhantes, por exemplo, considero que a autonomia política é essencial, mas julgo também que a projecção da Madeira passa não por uma dialéctica igual ao passado, mas por firmeza de negociação frontal, transparente, com ligações permanentes com os órgãos da República. Muitas vezes há uma incompreensão da realidade madeirense. É preciso fazer pedagogia.

A que nível?
Dou como exemplo as ligações actuais dos transportes aéreos entre a Madeira e o continente. Defendo o mesmo regime aplicado aos dos Açores, com igual plafonamento de tarifa para residentes, estudantes e doentes. Nós fizemos a liberalização do espaço aéreo em 2008, mas não colocámos um limite tarifário. Isto significa que nas épocas altas as passagens atingam 500 ou 560 euros. É impossível para um português da Madeira circular em território nacional. Como é mais barato apanhar um avião em Lisboa e viajar por meia dúzia de euros para Londres ou Paris. Isto tem de acabar. É ridículo.

Durante 40 anos, a Madeira teve graves problemas com a República. Utilizou-se, por vezes, ameaças em tom separatista. Quando diz, agora, que vai criar “pontes de diálogo” significa que o “contencioso” da autonomia acabou?
Não podemos replicar o passado. A conjuntura era outra. A Madeira tem questões pendentes que precisa de resolver. E essa resolução passa pela intervenção da componente nacional e europeia. É óbvio que conseguimos um grande pacote relativamente aos fundos comunitários, 850 milhões de euros até 2020, um excelente negociação feita em Bruxelas. Se há essa ponte com a Europa, a mesma tem de existir com o país.

As boas relações irão manter-se seja qual for o partido que forme governo nas próximas legislativas nacionais?
Com certeza que sim. Essa é a minha obrigação enquanto presidente do governo.

A imagem da Madeira ficou muito marcada pelo discurso político de Alberto João Jardim. Como vai alterá-la?
Muitas vezes há uma imagem distorcida. A Madeira tem de ganhar uma notoriedade positiva e afirmação da região cosmopolita, aberta ao mundo, é decisiva para o nosso desenvolvimento. Os grandes ciclos de desenvolvimento regional, ao longo da sua história, aconteceram sempre quando a Madeira se virou para o exterior. A Madeira é ultraperiférica e o país é periférico. Só podemos ganhar escala se soubermos trabalhar bem com as nossas especificidades e que são diferentes das regiões continentais e isso tem de ser compreendido, razão por que defendo a atractividade fiscal.

Também acha que foram os jornalistas que “distorceram” a imagem da Madeira, como dizia Alberto João Jardim?
Não... não foram os jornalistas. Muitos aspectos centraram-se na retórica de política e alteraram a imagem da região.

Como será a sua relação com a comunicação social?
Sou defensor da liberdade de expressão e de respeito pelos media. Nem julgo saudável que haja conflitos. Uma coisa é a manipulação, outra é uma informação livre.

Pedro Passos Coelho ajudou à queda do jardinismo? Houve contrapartidas?
Não. Nem tinha de ajudar. Nem houve, nem há contrapartidas. Existem, sim, soluções para a Madeira que devem ser [dadas] por qualquer governo. Algumas delas já foram decididas com grande empenho do primeiro-ministro, com quem me reuni a 21 de Janeiro, sensibilizando-o para a urgência da entrada em vigor da diferenciação fiscal do IV Regime do Centro Internacional de Negócios (CIMN). Devido aos grandes escândalos do [offshore] Luxemburgo, havia uma grande relutância de Bruxelas que pretendia atribuir à Madeira o mesmo regime das Canárias, o que para nós era fatal. Houve um empenho pessoal do primeiro-ministro na resolução deste problema, mantendo um diferencial relativamente às Canárias e mantendo a competitividade do CINM.

Muitos consideram que a dívida da Madeira não é susceptível de ser paga. O PSD defendeu a renegociação. O perdão de, pelo menos, uma parte, a exemplo do que fez António Guterres, pode estar sobre a mesa?
O programa de assistência económica e financeira (PAEF) termina em Dezembro. A partir de Janeiro vamos injectar 319 milhões de euros na economia. O PAEF permitiu reduzir a dívida comercial que era quase 20% do PIB. Isto significa que em Dezembro de 2015 temos condições para efectuar operações de suavização da dívida. Mas há um problema: a carga fiscal é incomportável para os madeirenses e empresas. Já no orçamento de 2016 vamos aliviar o IRS sobre as famílias, sobretudo as mais carenciadas.

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