Declarações de Álvaro Santos Pereira foram “superficiais e injustas”

Pedro Catarino, que presidiu à Comissão Permanente de Contrapartidas entre 2007 e 2010, revelou hoje na comissão parlamentar de inquérito que “houve um problema de quebra de confiança” com o escritório de advogados que assessorava o Estado.

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Foto de arquivo Rui Gaudêncio

“Os escritórios de advogados tinham os arquivos, escreviam as actas, passavam as cartas para inglês”, explicou o embaixador jubilado Pedro Catarino, actual representante da República nos Açores, que chefiou a estrutura estatal de acompanhamento dos contratos de contrapartidas geradas pelos negócios de aquisição de armas e veículos militares.

Um desses escritórios, em particular, o de Sérvulo Correia, já tinha sido referido ontem na audição de Rui Neves, o antecessor de Pedro Catarino na Comissão Permanente de Contrapartidas (CPC). Era naquele escritório de advogados que se encontrava, em 2005, todo o arquivo da comissão. Hoje, durante uma longa audição, que durou quase toda a tarde, Pedro Catarino revelou aos deputados que, em 2009, decidiu “cessar” o relacionamento com aquele escritório por um “problema de quebra de confiança”, que pediu aos deputados para não especificar.<_o3a_p>

A documentação desta comissão do Estado foi, ainda, motivo para mais uma pergunta, do deputado João Semedo, BE. O deputado leu uma carta, de Maio de 2008, enviada por Pedro Catarino ao secretário-geral da Presidência do Conselho de Ministros, José Sousa Rego, na qual o presidente da CPC procurava “documentação extraviada” da comissão. Nomeadamente, todas as “actas das reuniões” anteriores a 2003. Na altura, “após pesquisa”, nada foi encontrado. Hoje, Pedro Catarino repete a resposta que recebeu: “Julgo que nunca foram encontradas.”<_o3a_p>

A dependência de assessores jurídicos exteriores ao Estado, o desaparecimento de documentação relevante, e isso não era tudo. “A comissão funcionava na base da boa-vontade”, revela Catarino. Militares que trabalhavam “graciosamente” no acompanhamento dos projectos. “O gabinete técnico nunca teve os 10 elementos previstos, tinha seis”, e só foi constituído no segundo semestre de 2008, o representante do Ministério da Ciência só integrou a comissão em 2010.<_o3a_p>

Enquanto isso, o país tinha de gerir o maior volume de contrapartidas da sua histórias (após a compra de helicópteros, submarinos, blindados, torpedos e aviões). E a comissão lidava com documentos e contratos que, como lembra Catarino, “são muito complexos”. Uma oportunidade perdida? Se comparada com outros casos, como o de Espanha, onde o seu homólogo exerceu um mandato de 23 anos, “tinha acesso directos aos ministros e um staff de 70 elementos”,  Catarino acredita que o êxito das contrapartidas portuguesas podia ter sido maior. Porém, adverte, “o quadro não é tão negro como é geralmente anunciado”.<_o3a_p>

“O problema mais grave da nossa administração é a continuidade”, defende. Ou a falta dela… Neste caso, segundo os depoimentos feitos na comissão de inquérito, os governos mudaram, as comissões estatais mudaram, só permaneceram os interlocutores do outro lado.

E nem sempre com “boa-fé”… “O que nos está a dizer é que olhando para o contrato das contrapartidas oferecidas pelo consórcio alemão [Mann/Ferrostaaal] era previsível que as coisas não iam correr bem?”, perguntou António Filipe, PCP. Responde Pedro Catarino: “Se tomarmos em conta o [pausa para consultar papéis] ‘passivo reputacional’ da Mann/Ferrostaal tínhamos razão para desconfiar.”

Os deputados sorriram, quase todos. A expressão, aliás bastante rebuscada, “passivo reputacional” fora ontem utilizada pelo ex-ministro Álvaro Santos Pereira, noutro contexto. Ontem, durante a sua audição, Santos Pereira disse que foi alertado para os riscos de mexer neste dossier. Pedro Catarino foi buscar a expressão para criticar o autor. Ontem, Santos Pereira criticou a execução das contrapartidas, no período em que Catarino presidiu à CPC. “declarações que considero superficiais e injustas”, afirmou, hoje, Pedro Catarino. <_o3a_p>

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