Câmara de Gaia acusa Menezes de procurar "álibis” para justificar contrato que lesou o município

A autarquia terá de pagar perto de 150 milhões de euros até 2026 na sequência da renegociação com a empresa Suma, da Mota-Engil, que implicou uma redução dos serviços prestados.

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Menezes diz estar a ser alvo de um “ataque de homicídio pessoal e político inacreditável”. Paulo Pimenta

O actual presidente da Câmara de Gaia, Eduardo Vítor Rodrigues, acusa o seu antecessor, Luís Filipe Menezes, “de estar à procura de álibis para justificar a renegociação do contrato de concessão” com a empresa de recolha de resíduos Suma, do grupo Mota-Engil. A mesma empresa que ganhou o concurso de privatização da EGF na quinta-feira.

O contrato com a Câmara de Gaia, que está a ser investigado pela Polícia Judiciária, é considerado lesivo para a autarquia, que terá pagar cerca de 150 milhões de euros até 2026, como o PÚBLICO avançou esta sexta-feira.

“A Câmara de Gaia tem-se mantido silenciosa neste processo e não percebo qual é o argumentário do doutor Luís Filipe Menezes, porque não foi da autarquia que saiu qualquer divulgação sobre a investigação que está a ser feita pelas autoridades relativamente aos contornos do contrato com a Suma”, disse Eduardo Vítor Rodrigues.

Esta reacção do socialista actualmente na liderança da autarquia surge na sequência de declarações de Menezes à Lusa, nas quais o ex-autarca rejeitou ter feito “um negócio alegadamente fraudulento com a empresa Suma”. Afirmou ainda que a prorrogação da concessão do contrato com aquela empresa teve “resposta positiva” do Tribunal de Contas e a anuência do actual presidente da autarquia.

Porém, a própria Suma refere, em comunicado, que em Fevereiro de 2013 o Tribunal de Contas disse que o "aditamento contratual com a renovação não estava sujeito a fiscalização prévia". Contactado pelo PÚBLICO, aquele Tribunal adiou uma resposta sobre o assunto para os próximos dias.

Por outro lado, o actual presidente da Câmara esclarece que votou favoravelmente, em 2012, a renegociação do contrato com a câmara, mas não a sua transferência para as Águas de Gaia (o que terá ocorrido ainda 2010), que passou a ser a responsável pela gestão do serviço de resíduos no concelho.

Certo é que o assunto está a ser investigado judicialmento. Fonte judicial confirmou que a procuradora titular do processo e a coordenadora da PJ encarregue da investigação reuniram-se esta quinta-feira no Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) do Porto para instruir o processo. Apesar de Menezes ser um dos alvos da investigação, não foi até ao momento constituído arguido, confirmou ao PÚBLICO fonte policial.

Face a suspeitas de corrupção ligadas também ao património do social-democrata, os investigadores pretendem passar a pente fino as contas bancárias do social-democrata. Mas para tal será necessário requerer o levantamento do sigilo bancário de Menezes, o que só será possível se este vier a ser constituído arguido.

O PÚBLICO noticiou na sua edição desta sexta-feira que o DIAP do Porto e a Polícia Judiciária estão a investigar o social-democrata a propósito da renegociação do contrato entre a empresa municipal Águas de Gaia e a Suma que terá prejudicado os cofres da autarquia. Segundo fontes envolvidas nessa renegociação, a factura do município passou de cerca de oito milhões de euros por ano para 12 milhões, tendo a câmara ficado obrigada a pagar mais cerca de 40% por cada tonelada de lixo.

No entanto, em comunicado, a empresa nega ter havido um aumento desta ordem, garantindo, pelo contrário, que houve uma redução em 10% do custo anual com o serviço. A Suma garante que a redução da facturação desceu de 12 para 11 milhões de euros por ano, e que esse valor entrou em vigor logo após a renegociação em 2012.

A sociedade explica que a autarquia lhe solicitou que realizasse um estudo para o “investimento em novos meios de recolha” menos poluentes para corresponder a padrões ecológicos recomendados pela União Europeia. Garantiu ainda que a cedência da posição contratual da câmara para as Águas de Gaia “em nada altera, diminui ou modifica os direitos e obrigações das partes, nem restringe ou diminui o escrutínio das decisões ou contratos públicos celebrados por essas entidades”.

"Homicídio político", diz Menezes
Depois de apenas ter comentado pontualmente o caso na sua página de Facebook, Menezes quebrou esta sexta-feira o silêncio, para se queixar de estar a ser alvo de um “ataque de homicídio pessoal e político inacreditável”. Num comunicado enviado à Lusa, o social-democrata explicou que, em 2012, “face ao aperto financeiro que sofriam as autarquias, os técnicos municipais propuseram uma renegociação com esse grupo em que uma prorrogação do contrato de concessão, como estava previsto no mesmo, pressuporia uma poupança para a autarquia de cerca 15 milhões”.

Menezes revelou também que chamou então a oposição liderada precisamente por Eduardo Vítor Rodrigues a dar a sua opinião e solicitou “um número alargado de pareceres” de juristas de “referência”. Apesar de receber o apoio do socialista e de os pareceres serem favoráveis, “com infinita prudência e na defesa de uma quase estúpida hipertransparência, fiz um despacho a exigir que fosse ouvido sobre o tema o Tribunal de Contas”, acrescentou.

Contudo, as explicações do presidente do conselho de administração das Águas de Gaia, Silva Martins, apontam para uma versão ligeiramente diferente. O responsável confirma que o actual presidente da câmara votou favoravelmente a proposta de renegociação das condições do contrato e prorrogação do prazo por mais dez anos, mas nega que tivesse havido um agravamento dos preços praticados.

“A Suma apresentou uma nova proposta de prorrogação do prazo por dez anos, com novas condições, em que houve uma redução de cerca de 10% do valor a pagar anualmente. Essa proposta foi aprovada por unanimidade pelo executivo”, disse o responsável. Todavia, Silva Martins admitiu que a renegociação implicou o corte de vários serviços da Suma antes prestados no âmbito do contrato original.

Todavia, a Suma refere que se manteve o mesmo universo de serviços que já eram prestados pela empresa antes da renegociação do contrato. No entanto, os esclarecimentos da empresa não foram prestados quando o PÚBLICO solicitou, mas apenas no dia seguinte, após a publicação das notícias.

 

 

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