Cadilhe acusa Governo de ter medo das análises custo/benefício

Antigo titular da pasta das Finanças diz que grandes investimentos devem ser feitos com análises na relação custo/benefício por entidades independentes. Secretário de Estado dos Transportes admite não ter “assim tanta fé” nos resultados.

Foto
Sérgio Monteiro foi o rosto do Governo no debate Daniel Rocha

O economista e antigo ministro das Finanças Miguel Cadilhe defende que as grandes despesas de investimento público devem ser sujeitas a análises de custos e benefícios por entidades independentes.

Num debate organizado esta terça-feira em Viseu pelo Instituto Nacional de Defesa (IND) e intitulado “Fundos Estruturais e Investimentos: Onde devemos investir?”,  Miguel Cadilhe disse que “qualquer despesa pública de investimento ou aparentada (grandes eventos), seja na área social, da administração da justiça, da educação, das infra-estruturas ou militar, deve ser chamada a uma análise de custo/benefício”. Sustentou ainda que os políticos têm receio de assumir esta lógica quando é hora de tomar a decisão sobre os investimentos.

“Os políticos não gostam de modo nenhum de análises de custo/benefício independentes e competentes. Por exemplo, mandar fazer análises de construção de uma auto-estrada, aeroporto, porto ou terminal ao Laboratório de Engenharia Civil não é independência, por muito competente que os técnicos sejam”, disse, perante um grupo de oradores onde estava presente o secretário de Estado das Infra-estruturas, Transportes e Comunicações, Sérgio Monteiro.

O governante, em resposta, assumiu ter “uma profunda desconfiança”  e não fazer “tanta fé assim” nestas análises por considerar que os resultados são “facilmente manipuláveis” e “não é pelas entidades independentes ou dependentes de uma certa tutela as fazerem”.

Segundo Sérgio Monteiro, “quase todos os estudos de análise de custo/benefício em Portugal foram feitos por consultores independentes, que não dependiam de nenhuma tutela política para apresentar os seus resultados” e, no entanto, o seu grau de eficácia foi “péssimo”. “Tudo o que estava previsto de benefícios raramente se concretizou e o que estava previsto do ponto de vista de custos mais do que se concretizou”, disse.

Palavras que não convenceram Miguel Cadilhe que, ironizando, disse que a melhor forma de um político decidir despesa pública é “não se sujeitar a estas análises”.

“Alguma vez na vida teríamos feito aquela enormidade de despesa pública em submarinos se tivesse havido na altura uma análise custo/benefício independente e competente?”, questionou, colocando em causa outras obras, como os estádios de futebol.

O economista disse ainda estar convencido de que muitos dos grandes empreendimentos ou grandes despesas públicas realizadas nos últimos anos não teriam passado nesta análise.

“Hoje temos aí, e fala-se tanto, no grande projecto de investimento que é o chamado terminal dos contentores do Barreiro, desejo profundamente que esse investimento não se faça, mas é um exemplo onde eu penso que não foi analisada a relação entre o custo e o benefício”, concluiu.

Na quarta conferência dinamizada pelo IND interveio ainda Vital Moreira, que deixou a indicação de que o Estado deve apostar na qualificação e competitividade e nos factores que a influenciam como a inovação e a investigação. “Esta foi a grande falha das últimas décadas”, disse o jurista. Também Caldeira Cabral defendeu que o investimento deve ser feito nas pessoas, no turismo, no mar e na agricultura, sectores que estão “subaproveitados”.

Na abertura do debate, o ministro da Defesa, Aguiar-Branco, lembrou que as iniciativas descentralizadas que estão a ser realizados pelo país “enriquecem a linha de orientação” para uma estratégia concertada.

Ferrovia Aveiro/Viseu nas mãos da REFER
À margem do debate, o secretário de Estado das Infra-estruturas, Transportes e Comunicações, anunciou que a validação relativamente à futura linha ferroviária entre Aveiro/Viseu e Guarda está nas mãos da REFER.

“Tenho muita confiança de que sejamos capazes de chegar a bom porto nesta negociação e, portanto, que tenhamos o misto entre a requalificação da Linha da Beira Alta e uma parte do traçado novo, desde que o custo seja compatível com a nossa realidade orçamental”, disse o governante, lembrando tratar-se de um projecto que faz parte do Plano Estratégico de Transportes e Infra-estruturas e que está englobado nos grandes investimentos públicos.

Os autarcas de Viseu, Aveiro e Guarda defendem que a melhor solução que serve o Centro e Norte do país passa pela construção de uma nova linha entre Aveiro e Mangualde (numa ligação a Viseu) e depois a requalificação da actual linha da Beira Alta até à fronteira com Espanha. Para os presidentes de câmara, esta é a solução que potência as exportações e não esquece os passageiros.

Sugerir correcção
Ler 1 comentários