“Só o tribunal nos pode impedir de continuar a explorar a terra” avisam rendeiros da Herdade dos Machados

Agricultores terão de abandonar as courelas até ao final deste mês. Deputado do PSD pede que a decisão seja congelada para dar início a negociações entre as partes e o Estado.

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PCP considera "lamentável" que o Governo esteja envolvido neste processo Enric Vives-Rubio

O deputado do PSD, Mário Simões, deslocou-se na tarde de terça-feira à Herdade dos Machados para tentar interpretar em que medida a decisão de retirar a 17 rendeiros as terras que receberam em 1980, das mãos de Sá Carneiro, pode afectar a vida das suas famílias e dos outros que continuam a explorá-las, acabando por pedir ao Governo que aguarde mais um tempo.

À sua espera estava mais de meia centena de rendeiros e suas famílias com uma expressão no rosto bastante elucidativa. “Fez muito bem em vir, senhor deputado, porque já não conseguíamos dar esta gente por calada”, confessou um deles, dando expressão “à zanga” que todos têm contra a actual equipa do Ministério da Agricultura.

Francisco Farinho, porta-voz dos rendeiros, faz com os braços um largo gesto para apresentar as pessoas em círculo. “Estão aqui os rendeiros reformados que querem pôr fora e os filhos que trabalham as terras porque os pais já não o podem fazer. Todos estão à espera de uma explicação”. Outro puxa de um papel e lembra ao deputado o que ele tinha dito em dias anteriores: “O Estado deve honrar a sua palavra” e o compromisso que assumiu “deve ser mantido”.

As vozes dos presentes eram reveladoras, até pelos apartes que se iam ouvindo, do mal-estar que tem mantido, sempre “em constante sobressalto, quase 200 pessoas”, as que vivem e sobrevivem do que as courelas produzem. São neste momento 54 rendeiros que não escondem o sentimento de insegurança perante as constantes “arremetidas” da tutela para “os afastar das terras” explica Farinho.

“Desta vez, não vamos ficar quietos”, observa outro rendeiro, exigindo que o deputado se comprometa com um documento “a anular o despacho” que pretende colocar fora da Herdade dos Machados 17 rendeiros por terem atingido a idade da reforma. Farinho tenta acalmar os mais nervosos: “Tenham calma que daqui ninguém sai senão por decisão de tribunal”.

”Garantiram-nos que ao fim de 20 anos a terra era nossa”, lembra uma mulher elevando a voz e recordando que, para além Sá Carneiro que lhes “deu um papelinho e um aperto a mão, até Pinto Balsemão esteve aqui a almoçar” com os rendeiros.

Mário Simões insiste: “A palavra de honra é sagrada”. Por isso, diz que não consegue aceitar que “alguém de Lisboa diga por carta que têm de abandonar a terra” até ao dia 31 de Outubro. “Faz-me muita confusão”, este tipo de procedimentos, acentua o deputado.

Estava rodeado de pessoas que, do ponto de vista ideológico, deixavam claro de que lado é que estavam. “Qualquer um daqui gosta e admira Sá Carneiro, comunistas ou não comunistas”, diz um, enquanto outro o classifica como “o maior estadista que Portugal já teve”. Mas tal declaração não ficou sem resposta. “Estás a esquecer o Álvaro Cunhal”, apressou-se outro a dizer.

Mário Simões, no entanto, lembrou: “Não se esqueçam que não são proprietários das terras” admitindo, contudo, que a posição expressa por Sá Carneiro “pressupõe o direito de transmissão do arrendamento”.

No entanto, é ao Estado que “compete” encontrar uma solução definitiva para este problema que se “arrasta há 34 anos” seja por via da compra, dando o direito de preferência, seja regulamentando contratualmente à luz daquilo que é a legislação em vigor do arrendamento rural.

Referindo-se aos proprietários da Herdade dos Machados, lamenta que estes “ainda não tenham sido indemnizados pelo Estado”, que continua a manter com os proprietários “uma situação por resolver”.

Para superar o contencioso existente, o Estado “devia iniciar negociações com as partes para se chegar a consensos”, diz o deputado social-democrada, defendendo o congelamento da decisão já tomada de retirar a exploração da terra a 17 rendeiros.

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