Tudo começou num hospital para os trabalhadores da CUF

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O novo Hospital de Braga é um dos dois hospitais públicos geridos pelo grupo privado Nelson Garrido

"O que o País não tem, a CUF cria" chegou a ser, na primeira metade do século XX, um lema dentro daquele viria a ser o maior império industrial português, a Companhia União Fabril (CUF).

Numa altura em que o Estado ainda não tinha a seu cargo nem educação nem saúde, além de produzir sabões, tecidos, adubos, entre outros produtos, o empresário Alfredo da Silva, chamado pelos seus empregados “pai-patrão”, criou creches, bairros, bibliotecas, cinema, escolas, serviços de assistência médica, refere uma história do império industrial no site oficial do grupo. Cerca de três anos após a morte de Alfredo da Silva, em 1945, vai ser criado o Hospital CUF, em Lisboa, para prestar cuidados de saúde aos cerca de 80 mil empregados e familiares que o grupo então empregava.

O edifício original, de quatro pisos, ainda existe, mas do outro lado da Avenida Infante Santo, nasceu outro que tem 9 pisos, chama-se hoje CUF Infante Santo. É neste sítio que começa aquele que é hoje o maior grupo privado de saúde em Portugal, o José de Mello Saúde, que gere actualmente 5 hospitais (2 deles públicos), oito clínicas e 15 unidades de imagiologia, concentrando cerca de um quarto da facturação do sector da saúde privada em Portugal – cerca de 400 milhões de euros por ano, estima o presidente da Associação Portuguesa da Hospitalização Privada, Artur Osório.

O império industrial CUF teve momentos conturbados no pós-25 de Abril, acabando por ser nacionalizado. A partir dos anos 80, os dois netos de Alfredo da Silva, Jorge de Mello e José de Mello, voltaram a construir os seus grupos, comprando empresas que tinha sido da CUF, mas de forma separada. Se Jorge de Mello se dedicou mais à indústria, José de Mello apostou mais nos serviços. Actualmente, é Vasco de Mello, bisneto de Alfredo da Silva, quem está à frente do grupo que ficou com nome do seu pai. Já a empresa de saúde é presidida por Salvador de Mello, irmão de Vasco de Mello.

 Um grande impulso do grupo privado de saúde haveria de ser uma experiência pioneira no país, a primeira vez que a gestão de um hospital público, o Amadora-Sintra, foi entregue a um grupo privado, em 1995. O processo não será pacífico e, em 2008, depois de diferendos relativos a acerto de contas com a Administração regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo, o Estado retira a gestão do hospital ao grupo. Não obstante a interrupção - o grupo defende que poupou dinheiro ao Estado - ganharam com uma experiência de 13 anos. O Estado haverá de colocar de novo na mão do grupo, depois de concursos públicos, a gestão de dois hospitais públicos, primeiro o de Braga, que serve uma população de milhão de habitantes e tem capacidade para cerca de 700 camas, inaugurado em 2011, e o novo Hospital de Vila Franca de Xira, que abriu no ano passado e tem capacidade de internamento de cerca de 200 camas. Nos dois casos, o acordado prevê que o grupo faça a gestão clínica da unidade (que inclui contratação de pessoal e prestação de cuidados) durante dez anos e a do edifício durante 30 anos.

Foi também no ano (1995) em que o José de Mello de Saúde se abalançou na gestão do Amadora-Sintra que o grupo abriu a primeira clínica do grupo CUF, em Belém (Lisboa), depois da CUF Infante Santo. Seis anos depois abrirá portas o hospital CUF Descobertas, também em Lisboa. As restantes unidades privadas foram sendo acrescentadas desde 2001. O ano de 2006 marca a entrada no Norte, no que o grupo chama de estratégia “de diversificação geográfica”, com um hospital e uma clínica no Porto e uma rede de 15 clínicas de imagiologia clínica (onde são realizados exames como mamografias a Tacs).

O presidente da Associação Portuguesa da Hospitalização Privada, Artur Osório, nota que, caso se concretize a OPA, este grupo, juntamente com o Espírito Santo Saúde (o segundo maior grupo privado na área), somarão cerca de 50% do sector privado na saúde (se o critério for a facturação); em número de doentes a quem prestam cuidados somariam 45%, em camas para internamento concentrariam 52%, calcula o responsável.

Os dois grupos têm acordo com a ADSE, ou seja, são pagos por darem assistência a funcionários públicos, uma área de cuidados que representa 30% da facturação dos grupos privados. Mais de 80 por cento do volume de negócios da hospitalização privada em Portugal está nas mãos dos dois grupos, seguidos do Lusíadas Saúde (antigos HPP) e Trofa Saúde, acrescenta Artur Osório.

Ao longo dos últimos anos, os hospitais privados têm vindo gradualmente a ganhar dimensão e peso em Portugal. Em Abril, num balanço sobre o período 2002 a 2012, a partir de um inquérito aos hospitais, o Instituto Nacional de Estatística (INE) concluía que, numa década, as unidades oficiais (públicas, incluindo as militares e prisionais) tinham perdido cerca de três mil camas, enquanto as privadas passaram a ter mais 1400 camas. Em 2012, os hospitais privados asseguravam já mais de um quarto (28%) das consultas externas e quase 12% das urgências a nível nacional. O INE constatava que o número de hospitais privados tinha crescido neste período (de 94 para 104), enquanto os hospitais tutelados pelo Estado se mantiveram. Com Luís Villalobos

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