PCP e Bloco dizem que relatório da comissão de inquérito aos Estaleiros iliba Governo

Partidos ainda podem propor alterações ao documento. Relatório da comissão de inquérito será votado no dia 10 de Julho.

Foto
Paulo Pimenta

Um projecto de relatório que iliba ou branqueia a actuação do Governo em relação aos Estaleiros Navais de Viana do Castelo (ENVC). É assim que PCP e BE reagem ao documento elaborado pela deputada do PSD Ângela Guerra.

Por outro lado, o Governo reagiu afirmando que as conclusões permitem demonstrar que a actuação do Executivo foi "transparente". O relatório, que contém 811 conclusões e seis recomendações, será remetido à Procuradoria-Geral da República, disse à Lusa fonte parlamentar.

Segundo as conclusões do relatório elaborado pela deputada social-democrata Ângela Guerra, o actual Governo  "não teve qualquer alternativa quanto à forma de lidar com a questão dos auxílios [estatais] passados" a esta empresa, que são classificados como "ilegais".

Na conferência de imprensa em que apresentou o relatório, Ângela Guerra referiu o "ambiente que rodeou a constituição" da comissão de inquérito, dizendo ter havido acusações de falta de transparência, ilegalidades e "negócios nebulosos" em torno do processo de subconcessão, ganho pelo grupo português Martifer.

"O relatório quis aligeirar as responsabilidades do Governo e da actual maioria neste processo. É um relatório que elimina as responsabilidades do Governo, reagiu a parlamentar comunista Carla Cruz. A deputada considerou ainda que o relatório "chega ao absurdo de apontar o excesso de trabalhadores como uma das causas para este desfecho", referindo-se à extinção da empresa e subconcessão dos terrenos e infra-estruturas.

Carla Cruz criticou uma das principais conclusões do relatório, que refere que o actual Governo "não teve qualquer alternativa" quanto à forma de lidar com os auxílios estatais à empresa, que classifica como "ilegais". "O Governo tinha mecanismos. Se avançasse com a construção dos navios de patrulha Oceânica, e com a programação [da construção] militar para justificar ajudas de Estado. O Governo optou por não fazer e para encontrar aí o alibi para justificar a ideia inicial, a privatização dos ENVC e a sua liquidação enquanto empresa nacional", acusou.

Também a deputada do BE Mariana Aiveca anunciou a intenção de votar contra o relatório da comissão de inquérito por considerar que este faz "um branqueamento das responsabilidades" do Governo. "A relatora [Ângela Guerra] diz-nos claramente que há responsabilidades dos governos entre 2004 e 2011, e sobre os últimos anos de gestão dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo faz um absoluto branqueamento, o que nos leva a concluir imediatamente que o BE irá com certeza votar contra este relatório", afirmou Mariana Aiveca.

PSD e CDS alinhados na transparência

PSD e CDS concordam que do relatório resulta claro que houve transparência na actuação do actual executivo. O deputado do CDS Abel Batista defendeu que o projecto de relatório apresenta "conclusões objectivas" das quais resulta claro que não houve "nenhum tipo de falta de transparência na privatização e depois na subconcessão".

Para o deputado, a empresa "deixou de ter qualquer tipo de viabilidade "desde 2006" por os projectos de reestruturação recomendados não terem sido aplicados.

Do lado do PSD, o deputado Afonso Oliveira destacou as responsabilidades do anterior governo socialista. Para o parlamentar, o relatório demonstra uma "ausência total de empenhamento" do PS relativamente à empresa.

"Ficou claro que de 2005 a 2011 tiveram um processo de endividamento crescente e exponencial, ficou claro também que as administrações dos Estaleiros foram sucessivamente alteradas, houve uma ausência total de empenhamento da parte do anterior Governo nos Estaleiros", afirmou.

Afonso Oliveira sublinhou que "resulta da comissão de inquérito" que a acção do Governo foi "transparente", numa alusão à iniciativa da criação da comissão de inquérito, por parte do PCP, com o apoio do PS.

"O PSD e a maioria na altura defenderam que não tinha que haver uma comissão de inquérito. O PCP e o PS resolveram avançar. Ainda bem que existiu, ficou claro que não havia nada a esconder. O PCP tinha conclusões precipitadas", acusou.

António Gameiro, deputado do PS, já veio, no entanto, rejeitar auxílios ilegais aos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, contrariando a versão apresentada no projetco de relatório.

"Não é verdade que tenha havido financiamentos ilegais. O que houve foi financiamentos e não houve auxílios de Estado ao contrário do que disse o ministro [Aguiar-Branco] na comissão. Aquilo que havia era financiamento do Estado a uma empresa pública que tinha que retornar o dinheiro aos cofres públicos. Grande parte desses financiamentos eram bancários, sujeitos a taxa de juro", defendeu.

Relatório votado dia 10
O relatório da comissão conclui que houve uma "clara intervenção política" no processo do navio Atlântida, paradigmático de anos de "incapacidade de gestão" da empresa pública.

"Pese embora que das audições tenham resultado inúmeras contradições entre os vários depoentes, ficou claro que este é um exemplo paradigmático da incapacidade de gestão que a empresa teve ao longo de muitos anos, bem como de uma excessiva interferência política nas suas decisões", referem as conclusões do relatório.

Por outro lado, o documento conclui que o actual Governo "não teve qualquer alternativa" quanto à forma de lidar com os auxílios estatais à empresa, que classifica como "ilegais".

Quanto aos ENVC, o relatório destaca que houve "muita instabilidade" nos conselhos de administração entre 2004 e 2011 e que o endividamento aumentou em mais de 100 milhões de euros nesses anos, "partindo de uma situação relativamente equilibrada nos anos de 2003, 2004".

Pelas audições "conclui-se que a ENVC tinha graves deficiências na estrutura comercial e de orçamentação, no controlo financeiro dos projetos e no processo de aquisição de materiais", bem como uma estrutura intermédia com "falta de competências" e excesso de mão-de-obra.

O relatório em causa vai ser discutido em comissão nesta quinta-feira, ocasião em que poderão ser apresentadas propostas de alteração, e será votado no dia 10 de Julho.

Sugerir correcção
Comentar