Adjudicação do cais do Funchal viola regras da contratação pública

Tribunal de Contas deu visto condicionado ao contrato de construção da polémica obra, que viola princípios da transparência, igualdade e concorrência.

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A secção regional do Tribunal de Contas (TdC) visou sub judicio o contrato da empreitada do novo cais do Funchal, com recomendações à adjudicatária Administração dos Portos da Madeira (APRAM) no sentido de suprir ou evitar no futuro as ilegalidades apuradas.

Segundo concluiu o tribunal, na auditoria de fiscalização prévia ao concurso, o modelo de avaliação das propostas “não observa a disciplina normativa plasmada no Código dos Contratos Públicos“, nomeadamente os princípios da transparência, igualdade e concorrência. O modelo adoptado assentou, diz o relatório, “no critério de adjudicação deficientemente desenvolvido nas peças de procedimento elaboradas pela empresa WW Consultores de Hidráulica e Obras Públicas”, responsável pela polémica marina do Lugar de Baixo, encerrada desde a inauguração em 2004 por questões de segurança.

Entre outras ilegalidades detectadas, o TdC frisa que o modelo “faz apelo a aspectos da execução do contrato que não são passíveis de submetidos à concorrência”. Além disso, as escalas de pontuação definidas “utilizam expressões pouco claras e precisas, fazendo uso de paradigmas de referência demasiado vagos e genéricos, pondo em questão a objectividade e a transparência que deveria ter norteado o critério de adjudicação adoptado” - o da proposta economicamente mais vantajosa.

O relatório considera que, do ponto de vista da fiscalização prévia, estas situações “são passíveis de integrar o motivo de recusa de visto” traçado no quadro da Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas, na medida em que poderiam ter conduzido à alteração do resultado financeiro do contrato.

No entanto, porque não deu por adquirida a alteração, o TdC, em vez de decidir pela recusa, fez uso da faculdade que lhe confere a citada lei, tendo visado o processo de visto sub judicio com recomendações à APRAM, no sentido de suprir ou evitar no futuro as ilegalidades apuradas que, adverte, são “susceptíveis de gerar responsabilidade financeira sancionatória punível com multa” e imputável à presidente e vogais da sua administração. E, tendo em conta as respectivas alegações, relevou a sanção ao concluir que as ilegalidades praticadas “não terão sido intencionais, mas meramente negligentes”.

Em sede do contraditório, a secretária do Turismo e Transportes, com a tutela da APRAM, alegou que dos poderes que exerce sobre esta sociedade anónima que integra o sector público empresarial regional, não decorre “qualquer poder de ingerência nos actos da administração”, remetendo para estes gestores as alegações sobre a matéria.

Depois de ter anulado o primeiro concurso público, em Fevereiro de 2012, porque as quatro propostas ultrapassavam o valor-base fixado (15 milhões), a APRAM adjudicou ao consórcio Etermar/Somague, em Janeiro de 2013, a empreitada de construção do novo cais de cruzeiros, no depósito de inertes do temporal de 2010, a nascente do antigo cais, pelo preço de 17,88 milhões de euros. Foram excluídas as concorrentes Conduril (18,5 milhões) e Way28/ACE (16,9).

A construção da obra, iniciada antes do visto do TdC e contestada por envolver verbas concedidas pelo Estado para a recuperação de infra-estruturas afectadas pelo temporal, foi decidida pelo presidente do governo regional, em Julho de 2010. Alberto João Jardim excluiu do processo a Câmara do Funchal que, fundamentada em pareceres de especialistas nacionais, emitiu um parecer desfavorável ao novo cais, considerando que a solução preconizada "tem grandes limitações em termos de operacionalidade e segurança em todos os seus aspectos".

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