Reaver concessão da água custa 87 milhões de euros à Câmara de Barcelos

Autarquia aprovou nesta quinta-feira “acordo de princípio” com privados por um valor que é menos de metade da cláusula de resgate do contrato original. Operação ainda tem de passar pelo crivo do Tribunal de Contas

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Foram detectadas várias situação de desperdício de água PAULO RICCA/Arquivo

A Câmara de Barcelos vai ter que pagar, até ao próximo mês de Janeiro, 87 milhões de euros ao consórcio privado que gere a água e saneamento no concelho, de modo a reaver a propriedade da rede concessionada em 2004. A verba acordada representa menos de metade da cláusula de resgate do contrato original e da indemnização para o reequilíbrio financeiro da empresa que a autarquia tinha sido obrigada a pagar por decisão judicial. Não é ainda o ponto final na polémica, mas o presidente do município, Miguel Costa Gomes, acredita que abriu “um caminho” para resolver o problema.

O acordo entre a autarquia e o consórcio privado, detido a 75% pela AGS – uma empresa que pertencia ao grupo Somague mas foi vendida no ano passado a uma firma japonesa – recebeu “luz verde” dos vereadores do executivo municipal de Barcelos, numa reunião extraordinária que se realizou esta quinta-feira. Este entendimento tem ainda que ser validado pela Assembleia Municipal e receber visto prévio do Tribunal de Contas, antes de poder ser concretizado.

A câmara sabe, no entanto, que vai precisar de recorrer à banca para cumprir este acordo. Na reunião desta quinta-feira foi igualmente aprovado o recurso a um empréstimo bancário por um período de 20 anos. Essa será a única forma de a autarquia conseguir cumprir o pagamento dos 87 milhões de euros ao consórcio privado que ainda detém a concessão da Águas de Barcelos. A câmara barcelense tem um orçamento para 2016 de pouco mais de 60 milhões de euros e receitas próprias anuais à volta dos 50 milhões de euros.

Numa conferência de imprensa após a reunião do executivo, o presidente da câmara valorizou o acordo alcançado. “Aquilo que se conseguiu são valores substancialmente mais baixos do que aquilo que foram as sentenças judiciais”, defende Miguel Costa Gomes.

O contrato de concessão da água e saneamento de Barcelos tinha uma cláusula de resgate de 190 milhões de euros. Quando a empresa privada deu início a um processo de indemnização para reequilíbrio económico-financeiro da concessão – evocando as perdas geradas pelo facto de não terem sido cumpridas as estimativas de consumo que constavam do acordo original – um tribunal arbitral obrigou o município a pagar 172 milhões de euros ao concessionário. A decisão foi entretanto confirmada pelo Tribunal Central Administrativo do Norte. Neste momento, está ainda em apreciação no Supremo Tribunal Administrativo um recurso da autarquia. “Mesmo que o contrato fosse eventualmente considerado nulo, a rede nunca seria entregue ao município a custo zero”, esclarece também Costa Gomes. A autarquia teria sempre que indemnizar o privado pelos investimentos feitos na rede de água e saneamento desde 2004. Um valor que, de acordo com o presidente da câmara barcelense, está acima dos 87 milhões de euros agora acertados.

A Águas de Barcelos tem a concessão da água e saneamento no concelho desde 2004 – num acordo assinado pelo executivo municipal então liderado pelo social-democrata Fernando Reis. Entretanto, uma inspecção da IGAL (Inspecção-Geral da Administração Local), de 2011, detectou ilícitos de natureza administrativa, contra-ordenacional e criminal por parte do anterior presidente e da técnica da autarquia Perfeita Fernandes. O resultado da inspecção foi  remetido para o DCIAP, que abriu um processo-crime para averiguar suspeitas de crimes de falsificação de documentos, tráfico de influências, participação económica em negócio e corrupção passiva em acto ilícito.

 

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