Igreja de Covas do Barroso sacudiu a sombra das armas e reergueu-se recuperada

A requalificação do espaço onde o padre Fernando Guerra escondia armas insere-se no projecto “Românico Atlântico” que tem recuperado monumentos no Norte e em Castela e Leão.

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A Igreja de Covas do Barroso antes da intervenção Paulo Pimenta

A Igreja Paroquial de Covas do Barroso, em Boticas, abriu de novo portas na passada semana depois de obras de requalificação. Esta iniciativa realizou-se no âmbito do projecto “Românico Atlântico”, desenvolvido pela Direcção Regional de Cultura do Norte e pela Junta de Castela e Leão, conjuntamente com a Fundação Iberdrola e com o apoio da Câmara de Boticas, que tem como objectivo proceder à intervenção num conjunto de monumentos românicos nas imediações do Rio Douro e Tâmega, situados nas províncias espanholas de Zamora e Salamanca e nas regiões portuguesas do Porto, Vila Real e Bragança.

Já há muitos anos que o monumento se encontrava debilitado e deteriorado e, por isso, segundo o Director Regional de Cultura do Norte, António Ponte, as intervenções de beneficiação da Igreja de Covas do Barroso, “foram ditadas pela necessidade urgente e inadiável de execução de uma nova estrutura para a cobertura, pois já chovia há muitos anos no interior da igreja, o que estava a estragar os altares, as pinturas murais no seu interior e todas as infra-estruturas de electricidade”. Foram, também, realizados trabalhos de instalação de um novo sistema eléctrico, de telecomunicações e de segurança, substituindo os “tubos que ainda passavam pelas paredes da igreja”, acrescentou o Presidente da Câmara de Boticas, Fernando Queiroga.

Recorde-se que a igreja românica esteve há poucos anos sob os holofotes mas por razões que nada tinham a ver com a salvaguarda do património mas antes por ter servido de cenário às actividades do padre Fernando Guerra. Este foi afastado da Igreja de Covas de Barroso depois de condenado pelo Tribunal, em Outubro de 2011, por posse ilegal de armas, branqueamento de capitais, ligação a uma rede de tráfico de armas e de droga e por roubar dinheiro às comissões fabriqueiras das paróquias. Os crimes custaram-lhe a demissão das cinco paróquias em que ministrava (Covas de Barroso, Cerdedo, Alturas, Vilar e Canedo), a condenação a três anos de prisão com pena suspensa, a doação de mil euros aos bombeiros de Boticas e o pagamento de uma coima de 700 euros referente ao processo de contra-ordenação.

Fernando Queiroga não acredita que o padre tenha nesmo cometido os delitos de que foi acusado e diz mesmo que o pároco foi “o grande impulsionador para que as obras se fizessem” e estas só não se fizeram mais cedo porque “a igreja está classificada como património local e precisava do apoio da Direcção Regional do Norte que não tinha verbas para a reabilitar”. Portanto este projecto que junta o Norte a Castela e Leão “veio na hora certa e no tempo exacto”, acrescenta.

O custo total da intervenção foi de 120 mil euros, um valor que foi comparticipado em 25% pela câmara de Boticas. No decurso da empreitada, continua Fernando Queiroga, “a população viu com muito bom grado a iniciativa e até deram o seu donativo para que este património fosse preservado”.

A Igreja de Covas do Barroso foi um dos 24 monumentos escolhidos para este projecto por estar incluída na rota românica da Direcção Regional da Cultura do Norte e por estar classificada como imóvel de interesse público. Em Vila Real, foram requalificadas outras oito igrejas; em Santo Tirso, no Porto, foi recuperada a Igreja de Roriz; no distrito de Bragança, quatro tiveram obras de beneficiação; enquanto na província de Zamora sofreram obras seis monumentos e na província de Salamanca foram cinco as intervenções. Com a conclusão da requalificação da Igreja de Covas do Barroso fecha-se o ciclo de intervenções no distrito de Vila Real.

O projecto termina no final deste ano. Para a sua conclusão estão previstas ainda três intervenções: restauro da pintura mural da Igreja de Malhadas, em Miranda do Douro; recuperação das estruturas arqueológicas da igreja de Castro de Avelãs, em Bragança; e ainda a conclusão da empreitada na Igreja de Roriz, em Santo Tirso, onde se irá proceder à reformulação das instalações eléctricas, telecomunicações e segurança.

O Presidente da Câmara de Boticas faz um balanço muito positivo deste projecto pois “esta é uma região onde existe muita afinidade com os vizinhos espanhóis e, portanto, é um bom início de parcerias até para projectos futuros”. Fernando Queiroga diz ainda que a Igreja de Santa Maria de Covas entrará nos roteiros turísticos do concelho, uma vez que “é um património muito valioso que estava a degradar-se”.

Para o director-geral do Património Cultural de Castela e Leão, Enrique Saiz, “esta parceria é muito importante porque serviu para promover o património de Portugal e da zona transfronteiriça de Salamanca e Zamora, o que levou ao aumento dos turistas em Espanha”. O responsável acrescenta ainda que “Portugal é um país com uma grande importância histórica e patrimonial e pode atrair visitantes de fora da Europa que chegam para visitar o Douro e os seus vinhos e que perceberão a cultura e o território" que une as duas regiões ibéricas.

Numa altura em que Portugal e Espanha atravessam situações de crise económico-financeira, o Director da Fundação Iberdrola, Rafael Landin, salientou que está convencido de que “as alianças público-privadas são as melhores ferramentas para atender a situações como a que estamos a viver, de crise, em que os recursos são escassos e é importante valorizar o património”.

O Plano de Restauração do Românico Atlântico implicou um investimento de quatro milhões e meio de euros, foi assinado em 2010 e a primeira fase do projecto terminará no final deste ano. Contudo, a ideia é negociar uma nova fase de intervenção, mantendo-se esta parceria por mais um ciclo do novo quadro comunitário de apoio até 2020.

No futuro, segundo António Ponte, os quatro parceiros já estão a “programar um projecto mais ambicioso, que vá para além do âmbito patrimonial e de envolvimento das comissões fabriqueiras, e que passe a incluir a intervenção das comunidades locais como guias de visita e que promova uma maior articulação com as câmaras municipais”.

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