AML exige ser ouvida sobre mudanças na Emel para assumir gestão da Carris e do metro

A Câmara de Lisboa queria alterar os estatutos da empresa sem ouvir a assembleia municipal, possibilidade que os deputados rejeitam.

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A câmara quer que a Emel passe a ter como objecto social a "prestação de serviços no âmbito do transporte público" Vítor Cid

A Assembleia Municipal de Lisboa exige ser ouvida sobre a alteração dos estatutos da Empresa Municipal de Mobilidade e Estacionamento de Lisboa (Emel) que prevê a inclusão da “prestação de serviços de interesse geral no âmbito do transporte público urbano de passageiros” no seu objecto social. O deputado Nunes da Silva diz que é preciso evitar que a eventual assunção da gestão da Carris e do Metropolitano seja feita de forma “menos transparente e sem o devido controlo político”.

Em causa está uma proposta, do vereador Manuel Salgado, que visa “apreciar” uma alteração dos estatutos da empresa e “mandatar o representante do município de Lisboa na assembleia geral da empresa [que é o próprio Manuel Salgado] para aprovar essa alteração”. O objectivo dessa modificação, segundo se diz na proposta datada de Julho de 2014, é “harmonizar os estatutos com a diversidade das intervenções a cargo da Emel”, bem como consagrar a participação da empresa “em projectos de internacionalização”.

A votação da proposta em câmara acabou por não se realizar, tendo sido adiada duas vezes depois de vários vereadores da oposição e dos Cidadãos por Lisboa (eleitos na lista do PS), terem manifestado dúvidas sobre a sua legalidade, por entenderem que ela deveria também ser apreciada pela assembleia municipal.

“Face à situação criada e ao facto de os Cidadãos por Lisboa terem informado o presidente que votariam contra a proposta, foi sugerido por estes que fosse ouvida a Comissão de Mobilidade da assembleia municipal antes que a câmara se pronunciasse”, resume o deputado Fernando Nunes da Silva, que integra esse movimento de cidadãos.

E o resultado está à vista: na semana passada essa comissão aprovou, por unanimidade, um parecer no qual se diz que a “interpretação” de que a alteração de estatutos de uma empresa municipal não tem de ser submetida à apreciação da assembleia “contraria a prática existente no município de Lisboa e em inúmeros outros municípios portugueses”. “Como se poderá aceitar que quem tem o poder de criar uma empresa municipal não tenha depois o mesmo poder para aprovar a alteração da sua área e domínio de intervenção ou das normas que regem o seu funcionamento?”, questionam os deputados, sublinhando que está em causa uma alteração “profunda” do objecto social da Emel.

Face a isso, a Comissão de Mobilidade decidiu recomendar à câmara que dê à assembleia a oportunidade de se pronunciar sobre este assunto, “como lhe compete”. O PÚBLICO perguntou ao município se pretende fazê-lo, mas não foi possível obter uma resposta em tempo útil.

“Acho que se ganhava muito”, diz o líder da bancada do PS na assembleia, considerando que dada a existência de “divergências jurídicas” a submissão da proposta a este órgão autárquico seria importante por uma questão de “cautela”. “Se há dúvidas e controvérsia, fica tudo muito mais salvaguardado com uma dupla deliberação”, defende Rui Paulo Figueiredo.

“Não tenho qualquer dúvida de que qualquer alteração estatutária terá de ser deliberada pela câmara e pela assembleia”, diz o vereador António Prôa, do PSD, acrescentando que “era só o que faltava” não haver “um escrutínio dos órgãos eleitos democraticamente”. O autarca também critica que se esteja com essa alteração “a abrir a porta, de uma forma indirecta” a que a Emel possa assumir as competências de gestão das empresas de transportes colectivos.    

Posição semelhante tem o líder da bancada social-democrata na assembleia municipal. Sérgio Azevedo considera que está em causa “uma transformação do negócio da empresa, uma alteração do seu core business” que tem de ser avalizada por aquele órgão autárquico.

O deputado não tem dúvidas de que com a proposta no cerne desta discussão aquilo que o executivo camarário pretende é “permitir a possibilidade” de a Emel vir a assumir a concessão da Carris e do Metropolitano de Lisboa. Algo que na opinião de Sérgio Azevedo “é precipitado”, dada a falta de informação sobre o assunto. “Estamos no vazio”, diz, criticando a falta de esclarecimentos da maioria presidida por António Costa sobre esta matéria.

Muito crítico é também o deputado Nunes da Silva, que acusa Manuel Salgado de, tanto neste processo como no da Colina de Santana, se ter “esquecido” que “na estrutura do poder local, o órgão deliberativo por excelência é a assembleia”. O ex-vereador da Mobilidade entende que as iniciativas da Emel que ocorram “fora do concelho de Lisboa ou do seu objecto principal de actuação” devem ser sempre previamente autorizadas por este órgão, sob pena de se estar a passar "um verdadeiro cheque em branco". 

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