Sporting, Benfica e FC Porto não cumprem critérios de fair play financeiro

Economista António Samagaio alerta para a gravidade da situação dos “leões”, a mais preocupante dos três “grandes”. Em causa estão eventuais punições da UEFA, que podem chegar à suspensão das provas.

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Os esforços da direcção de Bruno de Carvalho para recuperar as finanças do Sporting poderão sensibilizar a UEFA Miguel Manso/PÚBLICO (arquivo)

A participação do Sporting nas competições europeias da próxima temporada ou a aplicação de outro tipo de sanção, menos grave, aos “leões” pelo incumprimento dos critérios de fair play financeiro está dependente da relevância que o Comité de Controlo Financeiro (CCF) dos Clubes da UEFA der aos esforços encetados pelos responsáveis de Alvalade nesta temporada para tornar a SAD (Sociedade Anónima Desportiva) financeiramente viável a médio prazo.

Entre os três “grandes” em Portugal, o Sporting é o que apresenta uma situação mais preocupante, com um prejuízo acumulado de 89 milhões de euros nas temporadas de 2011-12 e 2012-13, ultrapassando largamente o limite de cinco milhões imposto pela UEFA. Mas FC Porto e Benfica também não cumprem alguns dos requisitos do <i>fair play</i> financeiro. A avaliação feita aos clubes será divulgada no princípio de Maio pelo organismo máximo do futebol europeu.

“Analisando as contas apresentadas nos últimos dois exercícios (2011-12 e 2012-13), que são as temporadas relevantes para esta primeira avaliação da UEFA [com implicações práticas no acesso às provas europeias relativas a 2014-15], as SAD dos três ‘grandes’ não cumprem alguns dos citérios exigidos”, revelou ao PÚBLICO o economista António Samagaio, professor do ISEG (Instituto Superior de Economia e Gestão), que tem estudado as contas dos principais clubes portugueses. Sublinhando a particular gravidade das contas apresentadas pelos “leões” relativas ao período em análise, o docente não está, no entanto, convencido de que a SAD de Alvalade venha a sofrer, nesta fase, a penalização mais grave, que seria a exclusão das provas da UEFA.

“Acho difícil que algum clube português venha a ser impedido de participar nas competições europeias, porque, nesse caso, seriam também abrangidos com essa penalização alguns clubes europeus de topo [como o PSG ou o Manchester City]. Acredito que esta eventualidade poderá servir como uma espécie de tábua de salvação para os principais clubes portugueses”, defendeu Samagaio.

Uma ideia reforçada pelas recentes declarações de Michel Platini, presidente da UEFA. “Os que esperam sangue e lágrimas vão ter uma decepção. Haverá medidas duras, mas não exclusão das competições europeias”, garantiu o dirigente na última quinta-feira, após ser questionado acerca da situação específica do PSG. Já ontem, Platini voltou ao tema, mas não foi tão taxativo.

“Oxalá não haja nenhuma exclusão, porque o fair play financeiro foi implementado para ajudar os clubes, não para matá-los, não para puni-los, mas serão os órgãos independentes que decidirão [que tipo de sanções serão aplicadas aos prevaricadores]”, referiu, citado pela agência AFP.

O fair play financeiro pretende impor aos clubes europeus a obrigatoriedade de não apresentarem nas suas contas despesas superiores às receitas no conjunto das temporadas em avaliação (relativas a duas temporadas, nesta primeira fase, mas alargadas aos últimos três exercícios a partir da próxima época). A ideia é limitar as despesas dos clubes às receitas geradas. Para tal, serão controladas as contas de exploração das sociedades desportivas, incluindo as transferências de jogadores, ficando de fora apenas as despesas com infra-estruturas (como estádios e centros de treino), assim como os investimentos na formação.

Em bom rigor, os clubes não poderão exceder os cinco milhões de euros em relação ao total dos proveitos obtidos no período de monitorização. No entanto, podem ultrapassar este limite até um certo nível (um máximo de 45 milhões de euros no acumulado das temporadas em análise), desde que os prejuízos venham a ser cobertos pelos accionistas.

Portugueses incumpridores

Mas as regras do fair play financeiro implicam ainda outras obrigações, como o não agravamento de uma eventual situação de falência técnica face ao exercício anterior; a ausência de dívidas em mora a credores ou referências explícitas por parte dos auditores ao risco de continuidade de uma sociedade desportiva. Neste último ponto, o incumprimento é transversal aos três “grandes”, como salientou António Samagaio.

“Nos três casos, os auditores questionam a continuidade das sociedades, referindo que a mesma estaria dependente do suporte financeiro dos credores, das instituições financeiras e das vendas de jogadores. Algo que contraria as regras de fair play financeiro”, esclareceu.

Mas a situação mais grave estará relacionada com os défices apurados pela diferença entre proveitos e custos. Neste ponto fundamental, as três SAD apresentam prejuízos superiores aos impostos pela UEFA no conjunto dos dois exercícios em análise. O caso do Sporting, como já foi referido, é o mais grave, com um total de 89 milhões negativos, mas, numa dimensão menos dramática, o Benfica, com 22 milhões de prejuízos, e o FC Porto, com 15, superam igualmente o tecto estabelecido.

“O FC Porto e do Benfica poderão justificar esse diferencial com despesas ao nível da formação e das infra-estruturas [centros de estágio, por exemplo], mas o Sporting, face aos valores envolvidos, terá maiores dificuldades em fundamentar os prejuízos com este argumento”, alertou Samagaio. Apesar de tudo, o CCF da UEFA poderá ser sensível à inversão da política financeira promovida pela nova direcção de Bruno de Carvalho e optar por não punir, nesta fase, o clube de Alvalade, ou, em último caso, aplicar-lhe uma sanção menos pesada.

O que parece ser inevitável, na opinião de Samagaio, é que os três principais emblemas portugueses farão parte do grupo dos clubes europeus que ficarão dependentes da apreciação que será feita pela UEFA. “As contas do actual exercício [2013-14] poderão ser importantes para demonstrar que os clubes nacionais estão a encetar um programa de equilíbrio financeiro ou mesmo de recuperação de perdas do passado”, defendeu. Mas, face aos resultados apresentados no primeiro semestre desta temporada, será inevitável que recorram à venda de activos dos plantéis para equilibrar os exercícios.

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