Benfica arrisca ser investigado por sucessão de casos de doping

Foto
O Benfica espera decisões disciplinares favoráveis a António Tavares e Paulo Barata Fernando Veludo/PÚBLICO

Em apenas um mês, o râguebi e o basquetebol do Benfica registaram dois controlos antidoping positivos. Este número sobe para três se for considerado o caso de Nuno Assis, no futebol. Segundo a legislação portuguesa, o clube “encarnado” pode ser alvo de um inquérito extraordinário do Conselho Nacional Antidopagem (CNAD) devido à sucessão de casos de dopagem, dois causados pela mesma substância.

De acordo com a Lei n.º 183/97, o CNAD pode “determinar e instruir a realização de inquéritos extraordinários e dos inerentes controlos antidopagem sempre que receba ou reúna fortes indícios de procedimentos habituais ou continuados de dopagem por parte de algum praticante ou nalgum sector de actividade desportiva”.

A possibilidade de o CNAD abrir um inquérito ao Benfica - hipótese confirmada ao PÚBLICO por um antigo membro daquele órgão - já foi seguida no passado por aquele organismo. Em 2002, devido a uma sucessão de testes positivos (por nandrolona) e de dezenas de outros cujos resultados estiveram perto da positividade, todos concentrados em apenas quatro clubes de futebol, o CNAD decidiu investigar. Resta saber se agora seguirá o mesmo caminho.

O inquérito aberto na altura originou uma queixa às autoridades judiciais, que seguiu para a Direcção Central de Investigação da Corrupção e Criminalidade Económica e Financeira, da Polícia Judiciária (PJ), então dirigida por Maria José Morgado. Não são conhecidos resultados das diligências da PJ, mas a legislação continua a permitir ao CNAD apresentar queixas ao Ministério Público, “se nos processos de inquérito ou disciplinares forem apurados factos susceptíveis de indiciarem o crime de tráfico ilegal de estupefacientes ou de substâncias psicotrópicas ou tráfico de quaisquer outras substâncias dopantes, ou de auxílio ou incitamento, por qualquer forma, ao seu consumo”, pode ler-se na lei.

Assis, basquetebol e râguebi

Ainda não tinha terminado a ressaca do caso Nuno Assis, que durou mais de um ano e foi concluído com uma sanção do Tribunal Arbitral do Desporto (um ano), e já o Benfica regressava às primeiras páginas dos jornais devido a outro teste positivo, desta vez por detecção de finasterida ao basquetebolista António Tavares. Uma semana depois, novo caso suspeito atingiu o râguebi, causado pela mesma substância, tomada por Paulo Barata.

Entre os dopantes encontrados, o de Nuno Assis (19-norandrosterona) é considerado o mais grave, porque é um anabolizante. A substância detectada a António Tavares e a Paulo Barata é proibida porque pode ser usada para esconder produtos mais fortes. “É um mascarante, não é um dopante, não altera o rendimento desportivo”, insistiu ao PÚBLICO o vice-presidente do Benfica para as modalidades, Fernando Tavares.

Segundo este responsável, Paulo Barata “já foi controlado antes, numa competição internacional, pela selecção de “sevens”“. “Ele declarou que medicamentos estava a tomar e o médico que fez o controlo disse-lhe que não havia problema”, afirmou Tavares.

Benfica fala em atenuantes

Este dado foi confirmado pelo secretário-geral da Federação Portuguesa de Râguebi, Delfim Barreira, mas nenhum dos responsáveis se lembra se o controlo foi realizado antes ou depois de Janeiro de 2005, altura em que a finasterida entrou na lista proibida. O vice “encarnado” vincou também que o râguebi é uma modalidade amadora, sem intervenção do departamento médico do clube. Aos jogadores são feitos apenas exames no início das épocas.

Segundo Delfim Barreira, o órgão disciplinar da federação deverá anunciar uma decisão sobre o processo de Paulo Barata “na quinta ou sexta-feira”. Mais atrasado está o caso de António Tavares, pois o Benfica ainda não recebeu a nota de culpa.

Neste processo, o médico da equipa profissional de basquetebol, Amílcar Miranda, responsabilizou-se por ter autorizado António Tavares a usar um fármaco de tratamento capilar. “O médico desconhecia a entrada do medicamento na lista de substâncias proibidas”, explicou o clube.

Questionado pelo PÚBLICO se o médico explicara o porquê do desconhecimento sobre a proibição da finasterida, em vigor desde Janeiro de 2005, Fernando Tavares respondeu: “Não, e isso não era importante. Houve uma falha grave, há informação sobre o assunto e não havia razão para tal, mas há que destacar a nobreza do médico ao assumir a sua responsabilidade.” O dirigente considera que este facto é “uma atenuante importante” para a avaliação do processo do basquetebolista. Nos dois casos, Tavares espera decisões favoráveis aos atletas.

Estudos indicam que finasterida pode esconder outros dopantes

A finasterida é o nome genérico do medicamento Propecia, utilizado para tratar a queda de cabelo. É também uma substância proibida, desde Janeiro de 2005, pela Agência Mundial Antidopagem (AMA), depois de pesquisas científicas patrocinadas por este organismo terem concluído que pode esconder o consumo de dopantes que têm influência no desempenho desportivo, entre os quais os esteróides anabolizantes.

Uma destas pesquisas foi realizada pelo Instituto de Bioquímica da Universidade Alemã de Desporto, em Colónia. Segundo indica o resumo do estudo, “os resultados demonstram que a finasterida pode causar sérios problemas de interpretação dos perfis dos esteróides, que têm um papel importante no controlo da dopagem (detecção do consumo de esteróides endógenos, estudos longitudinais, individualização da amostra, etc.).

Além disto, a finasterida pode complicar ou mesmo impedir a detecção de esteróides 19-nor”, entre os quais a 19-norandrosterona, encontrada na urina de Nuno Assis. Os investigadores do instituto germânico concluíram, por isso, que “os resultados demonstram que a finasterida pode ser usada como um agente mascarante”.

Sugerir correcção
Comentar