A cúria suíça

1. O anúncio da candidatura de Luís Figo à presidência da FIFA e algumas das suas afirmações, conduzem-nos, necessariamente, a uma aproximação ao patamar actual da governança do Estado do futebol.

Ser presidente da FIFA não é apenas ser titular de um alto cargo numa associação sem fins lucrativos, constituída em conformidade com as normas do Código Civil suíço. Ser presidente da FIFA é ser chefe de estado, no duplo sentido de que alguém passa a liderar os destinos de uma organização de vocação universal, composta por 209 membros, reguladora (eficaz) de uma modalidade desportiva, economicamente bem saudável (uma verdadeira multinacional) e ainda que assume, no plano das nações, no plano político internacional, as vestes de um importante líder.

2. A actual liderança da FIFA – para não ir mais longe no tempo – encontra-se enredada em suspeitas e fumos de indesejável governança. Um dos mais recentes – e significativo – caso relaciona-se com o processo de atribuição da organização dos Campeonatos do Mundo de 2018 e 2022, que conduziu à indignação de Michael J. Garcia e à sua tentativa de fazer valer a publicação integral do respectivo relatório do processo de investigação.

3. Sucede que, na actualidade, e disso já aqui demos conta, o “mal-estar” não se pressente somente no seio do Estado futebol. A Suíça, a insuspeita Suíça, sempre generosa para com as organizações desportivas, uma espécie de nação desportiva, alterou recentemente a sua legislação financeira e bancária, tendo em conta, precisamente, a situação dos dirigentes desportivos “internacionais” que vivem nos seus cantões. Por outro lado, a Comissão da Cultura, Ciência, Educação e Media, da Assembleia Parlamentar do Concelho da Europa, veio muito recentemente afirmar que a atribuição do Campeonato do Mundo ao Qatar foi viciada. Significa este estado de coisas, que o chefe de estado do futebol vive, agora, sob pressão interna e externa.

4. Contudo, a cúria, com as suas tendências e lobbyings, não é - sem preconceito continental nosso – predominantemente europeia. Não há, pois, como fugir a uma ideia quase feita: os dados, para esta eleição, já há muito foram lançados, mais precisamente no Congresso da FIFA, que teve lugar no Brasil aquando do Mundial.

Jorge Mendes, em entrevista que concedeu à Reuters, em Singapura, Jorge Mendes “criticou abertamente a proibição imposta pela FIFA da posse, por entidades terceiras, do passe de jogadores (TPO, na sua versão inglesa). O agente apelidou mesmo de ilegal a decisão e acrescentou que ela vai matar a competição no futebol europeu.” ”Atacou ainda o fair play financeiro, sistema de normas impostas aos clubes que, grosso modo, impedem que estes gastem mais do que recebem: É ilegal, completamente ilegal, ilegal, ilegal, ambas as imposições são ilegais. A maior parte das pessoas não sabe do que estão a falar.” E rematou (no basquetebol dir-se-ia que afundou): “Isso vai acabar. Um tribunal, não sei onde, não sei quando, não sei como vai acabar com isso. Se o fair play financeiro for parar aos tribunais vai perder com um milhão por cento de certeza. Se o TPO for a tribunal vai perder com um milhão por cento de certeza”. Um milhão por cento de certeza? Palavras para quê e tribunais para quê? Eu, por mim, entrei em depressão face à minha formação jurídica. Que será da minha vida a partir de agora, em que tudo já está decidido?

josemeirim@gmail.com

Sugerir correcção
Ler 1 comentários