Ataque a Macomia mostra que os jihadistas de Cabo Delgado estão recuperados das baixas sofridas
Centenas de insurgentes atacaram a sede de município de Macomia num ataque coordenado de várias direcções, que incluiu combates com forças sul-africanas. Força ruandesa foi impedida de vir em socorro.
Para quem ainda acreditava, apesar de todas as evidências, que o conflito em Cabo Delgado estava perto do fim, o ataque de sexta-feira em Macomia veio demonstrar que o recrudescimento dos ataques dos últimos meses é mesmo uma demonstração de força dos jihadistas, num aparente sinal de que foram capazes de recuperar das baixas, escolher novos líderes e refazer as fileiras a ponto de ousar um ataque em grande escala à sede de um município.
Durante 24 horas, os membros do Al-Shabab moçambicano mantiveram o controlo da vila, naquele que foi a sua operação mais ousada desde a chegada das forças ruandesas e da Missão Militar Internacional da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SAMIM) em meados de 2021. Tal a dimensão do ataque que o Governo moçambicano, contrariando o que tem sido a sua prática desde o início do conflito em Cabo Delgado em Outubro de 2017, emitiu um comunicado a admitir o ataque, mas para dizer que tinha sido repelido ao fim de 45 minutos.
Um relato que as provas e as testemunhas no terreno contrariam, dando conta de uma dezena de mortos, entre eles membros das Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM). Machude Salimo Abudo disse ao Carta de Moçambique que, em 24 horas de ocupação, entre sexta e sábado, os jihadistas terão matado pelo menos dez pessoas, deixando um rasto de destruição de bens públicos e privados e levando consigo 15 viaturas, incluindo dos Médicos Sem Fronteiras e da Acção Contra a Fome.
"Começando pelos mortos, dois corpos foram encontrados em Changane, igual número em Napulubo e um [também de militar] ali na estação. Outros quatro corpos foram encontrados na zona da Ceta e aqui também devo incluir o comandante da força local de Xinavane e outro das FADM aqui mesmo em Nanga", disse a fonte.
As viaturas terão sido usadas para levar toda a comida que os jihadistas conseguiram saquear em Macomia, vila situada junto à costa no percurso da estrada nacional N1, que liga o extremo sul ao extremo norte de Moçambique. Um funcionário dos Médicos Sem Fronteiras confirmou ao mesmo jornal moçambicano que quase todas as viaturas da organização foram levadas, bem como muitos medicamentos.
Os relatos que chegam à imprensa local dão conta que os insurgentes terão as suas bases junto ao rio Messalo, nos postos administrativos de Mucojo e Quiterajo.
Soldados sul-africanos englobados na SAMIM, que só termina o processo de retirada total da sua missão em Moçambique em Julho, terão sofrido uma emboscada no ataque jihadista a Macomia levada a cabo por centenas de terroristas provenientes de várias direcções, mas terão conseguido escapar sem ferimentos. Dois dos cinco veículos blindados de transporte sul-africanos foram danificados no ataque.
Segundo a Carta de Moçambique, os soldados sul-africanos tiveram de receber reforços, em armas e munições, por via aérea, através de um helicóptero Oryx que transportou membros das forças especiais desde Pemba, a capital provincial, situada 200 quilómetros a sul de Macomia. A maioria dos soldados sul-africanos que estavam integrados na SAMIM estão concentradas em Pemba à espera de regressar à África do Sul.
“A Força de Defesa Nacional Sul-Africana confirma que teve um confronto com o grupo insurgente na área de Macomia e que a SANDF repeliu com êxito o ataque sem sofre quaisquer mortos ou feridos”, disse o porta-voz dos militares sul-africanos ao Daily Maverick.
Segundo o mesmo jornal online sul-africano, soldados da Força de Defesa do Ruanda terão tentado vir em socorro dos sul-africanos desde Mocímboa da Praia, 103 quilómetros a norte de Macomia, mas foram travados por um forte contingente de jihadistas.
No domingo, os jihadistas terão atacado também à aldeia de Missufine, no distrito de Ancuabe, 115 quilómetros a sul de Macomia e 105 quilómetros a leste de Pemba. Este ataque durou quatro horas, mas não se sabe se causou ou não mortos ou feridos. Só se sabe que, tal como aconteceu em Macomia, parte da população fugiu e vai agora engrossar o número de deslocados que desde o final do ano passado tem voltado a subir novamente.