Um candidato e os partidos

Já não são somente os partidos que canalizam e ordenam o debate e a opinião.

As eleições autárquicas são sui generis: os cidadãos votam mais na pessoa que se candidata à câmara do que no seu partido. Essa é uma das características destas eleições — a decisão de votar não assenta sobre um partido, mas importa o líder que se candidata.

Esta saída personalista na crise de representação elimina a ideia de que os partidos não são capazes de se adaptar aos novos tempos. Há cada vez mais candidaturas independentes e candidatos independentes a concorrer por indicação de partidos.

Em democracia, as eleições não registam a mera distribuição de preferências ou rejeições dos cidadãos, mas abrem também um processo de deliberação pública para conformar a opinião. Actualmente, não são somente os partidos que canalizam e ordenam o debate e a opinião. O princípio representativo contínua a ser identificado com os partidos, mas também conta a personalidade do candidato e o nexo identitário com os cidadãos — valoriza-se o que o candidato é e, não unicamente, o que pode fazer.

É fundamental um candidato ter poder esclarecedor, para ser mais fácil ao público entender as suas políticas. Não vale a pena prometer coisas inexequíveis e não assumir responsabilidades. Actualmente, a política exige responsabilidades e responsáveis. É preciso mudar o discurso político para atrair a opinião pública e cidadãos que, por norma, não votam.

A linguagem e a retórica devem ser comedidas, com um palavreado acessível a todos. Um político, para ganhar eleições, deve chamar à atenção sem ser chocante, gritante e extremista. Uma campanha baseia-se em partidos, mas também na narração e na imagem que gera um candidato como pessoa.

Há uma tentativa de converter a soberania popular numa selecção de pessoas e transformar um candidato num homem do povo. Mas a luta política tem necessariamente de passar pelas ideias. No fundo, é achar que vale a pena ir-se votar por um candidato no seu todo.

Se fazes um bom par de sapatos, podes pô-los numa montra para vender e alguém os comprará, porque estão bem-feitos, têm valor e são úteis. Hoje em dia, a política é o momento e a sua personalização. Um programa e as ideias contam mas quem as apresenta e escolhe é primordial. Fundador do Clube dos Pensadores

 

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