Uma “democracia” com quatro deputados para cinco milhões de portugueses

Aumentar a representação das comunidades na Assembleia da República seria uma meta simbólica para a comemoração dos 50 anos do regime democrático, em 2024

Em breve, os cinco milhões de portugueses e lusodescendentes residentes no estrangeiro estarão envolvidos nas próximas eleições legislativas tendo em conta o elevado número de eleitores inscritos nos círculos da emigração.

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Em breve, os cinco milhões de portugueses e lusodescendentes residentes no estrangeiro estarão envolvidos nas próximas eleições legislativas tendo em conta o elevado número de eleitores inscritos nos círculos da emigração.

Assim, os portugueses da diáspora darão também o seu contributo na democracia nacional.

Ou talvez não.

Isso, porque, independentemente do número de votantes, os portugueses da emigração somente irão eleger quatro deputados. Podemos ser mil a votar ou um milhão, o resultado será o mesmo: quatro deputados eleitos pela emigração sobre um total de 230. Assim fixa a lei.

E, tomando o exemplo do círculo da Europa, já é possível antecipar o resultado relativamente aos partidos vencedores, a não ser que haja uma surpresa de peso. Desde 1976, ano em que se começou a eleger dois deputados por esse círculo, decorreram 15 eleições legislativas e por 14 vezes (só houve uma exceção em 1999) o resultado foi sempre o mesmo: um deputado eleito pelo PS, outro pelo PSD. E assim será o “suspense” em futuros atos eleitorais legislativos, enquanto não se elegerem mais deputados nos círculos da emigração. É esta a nossa democracia.

Uma democracia que determinou que 172.699 portugueses elegessem nove deputados pelo distrito de Faro em 2019, ao mesmo tempo que 158.252 portugueses residentes no estrangeiro (o número de votantes poderia ser muito superior, com o aperfeiçoamento do voto por correspondência ou a implementação do voto eletrónico à distância) elegiam quatro pelos círculos da emigração.

É esta a nossa “democracia” que, com a cumplicidade do legislador, não atualiza o número dos eleitos na emigração desde 1976, quando a diáspora tinha possivelmente metade ou o terço da dimensão que tem hoje.

Mas face a essas incoerências que dificilmente se entende lá fora, também é possível antecipar que muita gente nas Comunidades Portuguesas continuará a apelar ao voto, até porque a implementação do recenseamento automático na diáspora foi um passo extremamente positivo no sentido de reaproximar os emigrantes da vida política portuguesa.

Uma melhor e maior representação política na Assembleia da República é o passo que se deveria seguir, uma meta que seria simbolicamente relevante de se alcançar, sabendo que celebraremos meio século de democracia em 2024.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico