A luta contra a corrupção em Portugal nas ruas de Nova Iorque: quem não se cala, não consente

O retrato de Portugal que trago para as ruas de Nova Iorque, onde vivo há 13 anos, é o de um país cujos responsáveis se recusam a legislar no sentido de as instituições nacionais não premiarem e legitimarem a corrupção.

Em 2012, o programa da troika completava o seu primeiro aniversário e eu idealizava um país pós-troika fortalecido e renovado. Em 2013 lancei o projeto de livro “Reforma do Sistema Parlamentar em Portugal: Análises e Instrumentos para um Diálogo Urgente” e, em 2015, criei o Espaço Diálogos com deputados e deputadas de todos os partidos representados na Assembleia da República, precisamente para oferecer um contributo para as análises que uma recuperação sustentada iria exigir.

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Em 2012, o programa da troika completava o seu primeiro aniversário e eu idealizava um país pós-troika fortalecido e renovado. Em 2013 lancei o projeto de livro “Reforma do Sistema Parlamentar em Portugal: Análises e Instrumentos para um Diálogo Urgente” e, em 2015, criei o Espaço Diálogos com deputados e deputadas de todos os partidos representados na Assembleia da República, precisamente para oferecer um contributo para as análises que uma recuperação sustentada iria exigir.

Contudo, continuo a ver Portugal a afundar-se em corrupção e sinto que tenho que fazer alguma coisa mais. Se não, vejamos: em 2019, o Corruption Perception Index indica-nos que, nos últimos 19 anos, regredimos do 23.º para o 30.º lugar em termos de corrupção no sector público entre 198 países. E se perceções são “apenas” perceções, vamos a factos. Viemos a saber este ano pela GRECO, entidade do Conselho da Europa que monitoriza o combate a este fenómeno, que apenas 6,7% das medidas anticorrupção recomendadas por este organismo europeu foram implementadas em Portugal. Em 2015, Paulo de Morais estimava que o custo para os Portugueses dos casos de corrupção conhecidos (apenas os conhecidos) equivalia a 30% da dívida pública nacional. Um roubo público astronómico que esvazia os Portugueses das suas aspirações pessoais e das liberdades mais fundamentais.

Já escrevi livros, fiz estudos, dei entrevistas, escrevi artigos, falo com amigos e familiares, oiço e leio especialistas, converso comigo mesmo e o sentimento de que algo mais tem de ser feito persiste por dois perturbadores motivos:

  • degradação da democracia portuguesa e das suas instituições por falta de vontade dos órgãos do Estado para inverter a situação. Não é por falta de capacidade – conheço muitos dos nossos representantes e não tenho nenhuma razão para crer que sejam incapazes;  
  • marasmo, passividade e permissividade generalizada do povo português. Como cidadãos, precisamos interiorizar que as nossas aspirações futuras continuarão sempre a ser minadas enquanto o nosso comportamento e imobilismo for orientado por cálculos de curto-prazo para suprir necessidades do imediato. 

No dia 5 de outubro, dia em que se comemora a implantação da República Portuguesa, iniciei a primeira ação de rua na cidade de Nova Iorque, cujo objetivo principal é promover a mobilização dos Portugueses para a adoção de soluções já conhecidas, avaliadas e recomendadas para o problema insidioso da corrupção.

A iniciativa, associada ao slogan #freemycountryfromcorruption – #libertemomeupaísdacorrupção, representa um esforço de mobilização com base na organização de ações de rua semanais. Baseia-se na interação com o público no local e online através das redes sociais, em locais icónicos da cidade de Nova Iorque que têm um contexto histórico relativo à democracia, liberdade, direitos civis, direitos humanos e igualdade. Na próxima terça feira, estarei com a minha guitarra no mosaico "Imagine”, no Central Park – dedicado à memória de John Lennon –, e continuarei a debater o tema nas redes sociais com várias pessoas que se têm dedicado a analisar e denunciar este problema dos mais diversos ângulos. O retrato de Portugal que trago para as ruas de Nova Iorque (onde vivo há 13 anos) é o de um país cujos responsáveis se recusam a legislar no sentido de as instituições nacionais não premiarem e legitimarem a corrupção.

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Temos todas as razões para recear que o dinheiro que vai entrar em Portugal vindo da Europa para enfrentar os estragos provocados pela pandemia de covid-19 acabe por ir parar às mãos erradas. A atribuição de fundos do plano de recuperação e resiliência da União Europeia deve ser acompanhada por um Observatório/Grupo Técnico independente com peritos e participação da sociedade civil em articulação com a Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO). Capacite-se e invista-se nestas unidades devidamente.

Penso que muito mais pode ser feito: a Presidência da República deve criar uma entidade devidamente financiada (resultante da fusão de todas as atuais instituições, tais como o Conselho de Prevenção da Corrupção (CPC) e a nova Entidade da Transparência que ainda não saiu do papel) que, reportando diretamente ao Presidente, mantenha um estatuto de independência. Os presidentes e staff sénior das Entidades Reguladoras devem ser recrutados mediante concurso internacional credível, ao qual se podem também candidatar cidadãos nacionais. Estas são apenas algumas das exigências imediatas num conjunto de dez por mim priorizadas que tem como olho do furacão a captura de interesses e as portas giratórias entre os espaços político, judicial e económico.

O acompanhamento das ações e interações pode ser feito através das redes sociais em:

Facebook: André Corrêa d'Almeida
Instagram: @andrecdauthor
Twitter: ‏ @AndreCdAlmeida

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico