Último registo de vandalização da estátua do cónego Melo remonta a Abril

As inscrições a vermelho que cobrem o memorial do antigo sacerdote, em Braga, foram alvo de atenção neste domingo, mas fonte da PSP salienta que o último alerta de vandalismo recebido pela força de segurança aconteceu em Abril.

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No memorial do cónego Melo, instalado na rotunda contíguo ao largo Monte d’Arcos, próximo do cemitério municipal de Braga, podem ler-se, em tinta vermelha, as palavras “assassino”, “fascista” e “P [Padre] Max”. Essas inscrições foram alvo de atenção na manhã deste domingo, num tempo em que se questiona as algumas das figuras históricas celebradas em estátuas erguidas na Europa e nos Estados Unidos. Mas a estátua pode já estar assim desde Abril, mês em que a PSP de Braga recebeu o último alerta de vandalismo. A força de segurança não recebeu qualquer notificação sobre actos de vandalismo neste fim de semana, adiantou ao PÚBLICO uma fonte da força de segurança.

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No memorial do cónego Melo, instalado na rotunda contíguo ao largo Monte d’Arcos, próximo do cemitério municipal de Braga, podem ler-se, em tinta vermelha, as palavras “assassino”, “fascista” e “P [Padre] Max”. Essas inscrições foram alvo de atenção na manhã deste domingo, num tempo em que se questiona as algumas das figuras históricas celebradas em estátuas erguidas na Europa e nos Estados Unidos. Mas a estátua pode já estar assim desde Abril, mês em que a PSP de Braga recebeu o último alerta de vandalismo. A força de segurança não recebeu qualquer notificação sobre actos de vandalismo neste fim de semana, adiantou ao PÚBLICO uma fonte da força de segurança.

A vandalização daquela estátua não é inédita. Erguido em 10 de Agosto de 2013, após a iniciativa de uma comissão instaladora, aprovada pelo executivo municipal de então, liderado pelo socialista Mesquita Machado, o memorial apareceu vandalizado três dias depois; a estátua estava coberta de tinta azul e o pedestal tinha gravadas as palavras “assassino” e “fascista”, a vermelho. Esse primeiro episódio de vandalismo deu-se após um protesto pacífico contra a instalação da estátua. Em Dezembro de 2017, uma notícia do Correio da Manhã deu conta de novas a inscrições a vermelho no local, com as palavras “fascista”, “assassino” e “padre Max”.

Controvérsia com ligação ao Estado Novo

Essas palavras referem-se à simpatia do antigo vigário-geral da Arquidiocese de Braga pelo Estado Novo, como atesta a biografia gravada no pedestal aquando da inauguração da escultura - “admirador confesso do Estado Novo e do ditador Oliveira Salazar” – e também ao atentado à bomba que matou o padre Max no seu automóvel, em Santa Marta de Penaguião, em 2 de Abril de 1976.

Maximino Barbosa de Sousa era um sacerdote radicado em Vila Real e candidatou-se à Assembleia Constituinte pelo círculo de Vila Real, enquanto membro da União Democrática Popular (UDP), um dos partidos que, mais tarde, deu origem ao Bloco de Esquerda, em 1999. Eduardo Melo foi associado ao atentado, mas essa ligação não foi, contudo, provada. O cónego nem sequer foi constituído arguido no julgamento.

Nascido em Braga, em 30 de Outubro de 1927, Eduardo Melo foi ordenado sacerdote em 1951 e ganhou mediatismo no “Verão quente” de 1975 pelo combate à influência que o PCP almejava no Norte e pelas alegadas ligações a movimentos que se opunham à corrente revolucionária de esquerda: o Movimento Democrático de Libertação de Portugal, liderado pelo general António de Spínola a partir do Brasil, e o Exército de Libertação de Portugal, organização de extrema-direita criada por Agostinho Barbieri Cardoso, que fora subdiretor-geral da PIDE-DGS.

Depois de vários cargos na Arquidiocese de Braga, onde se distinguiu por ter organizado um congresso relativo aos 900 anos da sagração da Sé de Braga, em 1989, e noutras instituições da cidade, Eduardo Melo morreu em 19 de Abril de 2008. Controverso em vida, o cónego continuou a sê-lo após a morte. Na Assembleia da República, o voto de pesar pela sua morte foi aprovado com os votos favoráveis do CDS-PP e do PSD, bem como a abstenção do PS, mas mereceu a oposição do PCP, do PEV e do BE.

Estátua não é “consensual”, mas deve ser respeitada, diz Rio

A Câmara Municipal de Braga promete seguir o procedimento adoptado nos anteriores episódios de vandalismo na estátua do cónego Melo: “proceder à sua limpeza e repor a sua integralidade”, esclarece o presidente, Ricardo Rio, contactado pelo PÚBLICO.

O autarca reconheceu que nem o memorial, nem a “personalidade que ela representa” são “consensuais em Braga”, mas vincou que aquela escultura deve ser respeitada a partir do momento em que houve um “entendimento maioritário” para a sua colocação – a decisão foi tomada em Maio de 2013, numa reunião de Câmara com votos a favor do PS, então no poder, e as abstenções de PSD e CDS-PP. Ricardo Rio disse aceitar o desagrado que a estátua provoca em alguns bracarenses, mas repudiou o “vandalismo” como forma de o exprimir. “Não é através do vandalismo que se devem exprimir as diferenças”.

O presidente da Câmara rejeitou ainda que as mais recentes inscrições no pedestal do cónego Melo espelhem as inscrições e até os derrubes de que outras estátuas têm sido alvo, na Europa e nos Estados Unidos. “Esta é uma situação recorrente na cidade de Braga, muito associada a esta estátua em particular”, observa.