Ministério anula licenciamento para construção de hotel na Praia da Memória

O empreendimento em construção em cima do areal da praia do concelho de Matosinhos está em Reserva Ecológica Nacional, diz o Ministério do Ambiente após averiguação da licença passada pela autarquia com o aval da CCDR-N e da APA.

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Nelson Garrido

O licenciamento para a construção do hotel na Praia da Memória foi considerado nulo pelo Ministério do Ambiente. O resultado da averiguação relativamente à licença passada para o empreendimento que está a ser erguido em cima do areal saiu ontem com a nota de que aquela área, a cerca de 100 metros do mar, está incluída na Reserva Ecológica Nacional (REN). Promotor e autarquia dizem não ter sido notificados da decisão.

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O licenciamento para a construção do hotel na Praia da Memória foi considerado nulo pelo Ministério do Ambiente. O resultado da averiguação relativamente à licença passada para o empreendimento que está a ser erguido em cima do areal saiu ontem com a nota de que aquela área, a cerca de 100 metros do mar, está incluída na Reserva Ecológica Nacional (REN). Promotor e autarquia dizem não ter sido notificados da decisão.

O despacho ainda não chegou aos intervenientes do processo, mas já motivou uma reacção da Câmara de Matosinhos, que em 2017 deu o aval para o licenciamento, quando Eduardo Pinheiro, actualmente a exercer funções de secretário de estado da Mobilidade no Ministério do Ambiente, presidia à autarquia. O actual secretário de Estado assumiu este cargo após a morte de Guilherme Pinto. À frente do município está agora Luísa Salgueiro, que herda este dossier aberto em 2007 — era na altura vereadora —, quando a câmara deliberou, por unanimidade, mandar elaborar o Plano Municipal de Ordenamento do Território que incide sobre a faixa litoral Pampelido-Memória-Cabo do Mundo, que viria a ser fundamental para o futuro licenciamento.

“A Câmara de Matosinhos reafirma que só aprovou o projecto do hotel depois de recolher todos os pareceres das entidades responsáveis, designadamente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDR-N), entidade a que compete a verificação do regime da REN”, lê-se em comunicado enviado à imprensa.

Acrescenta o texto que “no momento da aprovação o empreendimento em causa em nada contrariava os instrumentos de gestão territorial, conforme confirmam os pareceres favoráveis das entidades que tutelam o ordenamento urbanístico do local, entre os quais o que foi emitido pela CCDR-N, que excluía da Carta da REN de Matosinhos a área específica de implantação daquele empreendimento turístico”. No final do ano passado, a autarquia sublinhava também ter sido emitido parecer favorável pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA), tutelada pelo ministério encabeçado por João Pedro Matos Fernandes, que assinou o despacho da anulação do licenciamento.

Foi precisamente ao lado da APA que a autarquia se sentou à mesa com o promotor da obra para, após alguma contestação na sequência do início dos trabalhos, em Outubro do ano passado, negociar uma possível alteração do local do hotel, que se deslocaria para um terreno nas imediações, mas fora do areal. As negociações não chegaram a bom porto, o promotor não aceitou a contrapartida e os trabalhos, ao contrário do que tinha sido anunciado por autarquia e ministério, nunca chegaram a parar.

Um revés no processo

Quando todas as garantias indicavam que o processo em marcha não enfrentaria um revés, em Dezembro de 2019, o ministro do Ambiente pediu uma​ averiguação da Inspecção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (IGAMAOT) ao processo de licenciamento do hotel. Um dia depois, na sequência do anúncio de João Pedro Matos Fernandes, a autarquia dizia não existir “fundamentação legal” para travar a construção.

Ontem, o ministério fez chegar às redacções um comunicado que dá conta do despacho da averiguação levada a cabo pelo IGAMAOT com informações que vão no sentido contrário dos pareceres favoráveis da APA e da CCDR-N. Concluído o processo de averiguação homologado por Matos Fernandes aferiu-se que “o terreno de construção está incluído na REN, pelo que o licenciamento para a construção do referido empreendimento é nulo”. Para que aquela parcela de terreno fosse excluída da REN diz o despacho que “deveria ter sido elaborado um plano de urbanização”. O ministério diz que isso não aconteceu.

Contactada pelo PÚBLICO a CCDR-N preferiu não comentar o despacho. O promotor da obra, Mário Ascensão, tal como a autarquia, disse não ter sido notificado. Afirma ter tomado conhecimento deste despacho pela imprensa. Até ser notificado prefere não tomar uma posição.

Relativamente a eventuais medidas de compensação para a BB — Sociedade Imobiliária, empresa responsável pela unidade de talassoterapia, a explorar por um grupo estrangeiro, o ministério de Matos Fernandes prefere não prestar qualquer esclarecimento.