Quando o comboio a vapor em 1917 era mais rápido do que o autocarro de hoje

Em 1917, o ronceiro comboio a carvão demorava 1 hora e 15 minutos a ligar Coimbra à Lousã. E parava em todas as estações e apeadeiros. Hoje o autocarro de substituição dos comboios da CP demora 1 hora e 25 minutos.

Foto
pr PAULO RICCA

Não é certo que o progresso seja sempre mais rápido e que as distâncias se encurtem à medida que os modos de transporte são mais modernos. Pelo menos, entre Coimbra e Lousã (e Serpins e Miranda do Corvo...) não foi isso que aconteceu entre o dealbar do séc. XX e a actualidade.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Não é certo que o progresso seja sempre mais rápido e que as distâncias se encurtem à medida que os modos de transporte são mais modernos. Pelo menos, entre Coimbra e Lousã (e Serpins e Miranda do Corvo...) não foi isso que aconteceu entre o dealbar do séc. XX e a actualidade.

Vejamos o ano de 1917. Os 30 quilómetros do ramal da Lousã, entre Coimbra e aquela vila, são percorridos em 1 hora e 15 minutos por locomotivas alimentadas a carvão, que rebocam carruagens de madeira com bancos de pau. O poder de aceleração destes comboios era muito lento e qualquer passageiro retardatário podia, correndo um pouco, apanhar a composição em andamento antes que ela ganhasse velocidade.

Nesse ano apenas três comboios em cada sentido ligavam as duas localidades. As outras circulações demoravam um pouco mais: 1 hora e 23 minutos e 1 hora e 29 minutos. Com paragens em todas as estações e apeadeiros.

Curiosamente, 12 anos depois, em 1929, e também com tracção a vapor, a viagem é agora um pouco mais lenta. Demora-se entre 1 hora e 22 minutos a 1 hora e 56 minutos a percorrer os 30 quilómetros do ramal, sendo certo que o comboio mais lento é um misto, que transporta passageiros e mercadorias e tarda muito nas estações para descarregar e carregar volumes.

É a partir dos anos 50 que a distância encolhe no ramal da Lousã. A CP atribui a esta linha o privilégio de receber as novíssimas automotoras Allan, importadas da Holanda e que acabariam por ser a imagem da marca do ramal. Durante algum tempo ainda coexistem comboios a vapor com o material diesel, mas em breve as viagens são uniformizadas e o horário de 1953 é certinho: o trajecto entre Coimbra e Lousã percorre-se em 47 minutos.

Há ainda outra melhoria: em vez de três comboios por dia em cada sentido, passa agora a haver seis.

A frequência vai crescendo, à medida que a linha se vai suburbanizando. Crescem as construções em redor de Coimbra e há cada vez mais gente que apanha o comboio para vir trabalhar ou estudar na cidade. Em 1985 havia oito comboios em cada sentido, mas dez anos depois a CP oferecia já 17 circulações em cada sentido.

O tempo de percurso é que sobe um pouco. As mesmas Allans que se estreiam com 47 minutos entre Coimbra e Lousã, demoram 49 minutos em 1968 e 52 minutos em 1995. No ano 2000 já demoram 54 ou 56 minutos (embora haja um serviço rápido que liga as duas localidades em 39 minutos).

Mais comboios implica mais cruzamentos e como a linha é de via única, estes só podem ser efectuados nas estações. O ramal da Lousã ganha mais comboios, mas perde um pouco na velocidade.

Até 2009, ano de encerramento da linha, mantêm-se os 52 minutos entre Coimbra e Lousã. Mas hoje o autocarro de substituição ao serviço do Metro Mondego demora 1 hora e 5 minutos para ligar as duas localidades.

Em transporte individual o site da ViaMichelin apresenta três alternativas entre Coimbra e Lousã: pela velha N17 (27 quilómetros), pela N342 e A 13 (37 quilómetros) e pela A13 e IC2 (43 quilómetros). Demora-se, respectivamente, 47, 44 e 42 minutos (sem paragens). É praticamente o mesmo tempo que faziam – a parar em todo o lado - as já então velhas automotoras do ramal da Lousã em 2009.