Deputados aprovam voto de saudação do CDS ao mundo rural mas lembram o mal que lhe fez no Governo

PAN votou contra; Bloco, Livre e o socialista Pedro Delgado Alves abstiveram-se.

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CDS propôs saudação ao mundo rural Paulo Pimenta

“Se o campo não planta, a cidade não janta.” A centrista Cecília Meireles usou a frase que leu num cartaz da manifestação que se realizou no Terreiro do Paço há uma semana - no dia seguinte à mais badalada, da PSP e GNR - para justificar o voto de “saudação ao mundo rural” que propôs nesta sexta-feira. E que foi aprovado apesar do voto contra do PAN, e a abstenção do Bloco e do Livre e do deputado do PS Pedro Delgado Alves.

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“Se o campo não planta, a cidade não janta.” A centrista Cecília Meireles usou a frase que leu num cartaz da manifestação que se realizou no Terreiro do Paço há uma semana - no dia seguinte à mais badalada, da PSP e GNR - para justificar o voto de “saudação ao mundo rural” que propôs nesta sexta-feira. E que foi aprovado apesar do voto contra do PAN, e a abstenção do Bloco e do Livre e do deputado do PS Pedro Delgado Alves.

Apesar de todos os partidos concordarem com a necessidade de valorizar o mundo rural, as bancadas da esquerda não se coibiram de considerar o voto do CDS como uma forma de branquear a sua acção política no Governo com o PSD.

Cecília Meireles vincou que o CDS “sempre valorizou a agricultura, a lavoura, a pecuária, a floresta, a caça, a pesca” e considerou que o mundo rural se manifestou “com razão” por ser muitas vezes “incompreendido e desrespeitado” por ser visto como sendo um mundo que se dedica a “actividades de exploração extractivista, inimigo dos animais e como algo que pertence ao passado”. “É urgente combater esta visão. Mais do que isso: somos todos portugueses, rurais e urbanos e devemos ter orgulho das nossas tradições e identidade e é o mundo rural que as preserva”, defendeu a deputada.

O deputado André Silva, do PAN, acusou o CDS de “extremismo” e de fazer uma “leitura enviesada da realidade” - e daí o seu voto contra - e de estar numa “tentativa desesperada de se eximir das responsabilidades que tem no despovoamento e a desertificação de boa parte do território”. Acrescentou que “os que agora mais defendem o mundo rural são os que mais o têm atacado”, citando como exemplos o encerramento de linhas ferroviárias, de serviços públicos como os CTT, bancos, farmácias e centros de saúde. A que somou a “expansão desregrada do olival e eucalipto, a plastificação da costa vicentina, o fechar de olhos a indústrias agro-pecuárias altamente poluentes, até à destruição dos últimos rios livres e selvagens com a construção de grandes barragens que provocam o despovoamento do interior, corroendo a coesão territorial”.

O voto do CDS, disse, pretende “virar uma parte do país contra a outra” e justificar práticas “anacrónicas” como a tauromaquia, o tiro ao voo, as corridas de galgos ou práticas de caça cruéis, como a realizada à paulada ou através de lutas entre animais, com recurso a matilhas”.

O socialista João Castro veio defender medidas do Governo para a revitalização do interior como o cadastro simplificado, os apoios às associações de desenvolvimento local, ou os estatutos do jovem empresário rural e da agricultura familiar que “é preciso promover ou reforçar”. “Faltam pessoas no mundo rural”, afirmou, lembrando que mais de 90% das explorações agrícolas são de cariz familiar.

A social-democrata lamentou que o mundo rural seja tratado como um “inimigo” ("como o PAN acaba de fazer") e que esteja “cada vez mais fora de moda, mais esquecido, deprimido, desertificado e incompreendido”, como se as pessoas do mundo rural fossem responsáveis pelas alterações climáticas, “fazendo-se tábua rasa do facto de serem os maiores agentes da sua preservação”.

O ecologista José Luís Ferreira fez questão de realçar as “potencialidades económicas” do mundo rural e o seu papel para a prevenção dos incêndios. O deputado defendeu a necessidade urgente de preservar e valorizá-lo, através do combate à desertificação com medidas claras para valorizar a agricultura familiar, reabrir serviços públicos de proximidade, incluindo serviços descentralizados do Ministério da Agricultura. Lembrou a contribuição do PEV para travar o eucalipto e a promoção de medidas para as micro, pequenas e médias empresas que se fixem no interior.

A estes argumentos, o bloquista Ricardo Vicente juntou mais críticas ao PSD e ao CDS para justificar a abstenção do BE. “O que falta no mundo rural foi o que falhou à direita enquanto foi Governo: política pública” para manter serviços públicos, regulamentar a floresta e travar o eucalipto e evitar incêndios ou as culturas intensivas como o olival e o amendoal.

E o comunista João Dias apontou o dedo ao PS, PSD e CDS por terem chumbado a proposta do PCP para criação de um estatuto da agricultura familiar - o único partido que o fez -, ao mesmo tempo que criticou estes partidos por comungarem posições sobre a PAC ou na aprovação da lei dos baldios, deram a machadada final na Casa do Douro.

Realçou que, apesar de o PCP aprovar o voto, discorda de alguns dos seus aspectos e considera que o objectivo do CDS é “branquear as suas responsabilidades na destruição do mundo rural”. Como exemplo, lembrou que Assunção Cristas, quando foi ministra da Agricultura “contribuiu para a destruição da agricultura familiar” ao impor burocracias como a obrigatoriedade de inscrição das Finanças para vender meia dúzia de produtos - e agora o texto do voto não tem uma única referência a este tipo de agricultura.