“PANificação” da campanha eleitoral, mas sem glúten

Os velhos partidos têm consciência de que os tempos estão a mudar e vão-se adaptando como podem, mas há certos poderes e hábitos difíceis de contrariar dentro das suas estruturas. Por isso vão esticando a corda enquanto se tentam enfeitar de tons verdes.

Foto
Francisco Guerreiro e o deputado André Silva, numa acção de campanha para as eleições europeias LUSA/LUÍS FORRA

Os programas eleitorais de todos os partidos estão repletos de preocupações ambientais. Antigamente, esses conteúdos, tendiam a ser aspectos pouco mais do que decorativos nas infindáveis páginas dos programas eleitorais. Mas, como quase ninguém os lia, a sua inclusão era apenas mais uma etapa numa extensa checklist que se tinha de fazer. Os velhos partidos têm consciência de que os tempos estão a mudar e vão-se adaptando como podem, mas há certos poderes e hábitos difíceis de contrariar dentro das suas estruturas. Por isso vão esticando a corda enquanto se tentam enfeitar de tons verdes. No entanto, como qualquer disfarce, a máscara pode cair a qualquer momento, especialmente com a incerteza do clima ambiental e social. Será que estão preparados para implementar essas medidas, algumas delas tão impopulares como as taxas ambientais e as restrições ao consumo?

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Os programas eleitorais de todos os partidos estão repletos de preocupações ambientais. Antigamente, esses conteúdos, tendiam a ser aspectos pouco mais do que decorativos nas infindáveis páginas dos programas eleitorais. Mas, como quase ninguém os lia, a sua inclusão era apenas mais uma etapa numa extensa checklist que se tinha de fazer. Os velhos partidos têm consciência de que os tempos estão a mudar e vão-se adaptando como podem, mas há certos poderes e hábitos difíceis de contrariar dentro das suas estruturas. Por isso vão esticando a corda enquanto se tentam enfeitar de tons verdes. No entanto, como qualquer disfarce, a máscara pode cair a qualquer momento, especialmente com a incerteza do clima ambiental e social. Será que estão preparados para implementar essas medidas, algumas delas tão impopulares como as taxas ambientais e as restrições ao consumo?

Vamos ser então ser bombardeados com propaganda ambiental, porque, aparentemente, estamos mais susceptíveis para isso. Mesmo assim, por toda a importância que se lhe dê na campanha eleitoral, será que iremos ter respostas necessárias para o problema ambiental? Duvido. Negar a urgência do problema ambiental é tão absurdo como achar que o sistema político e partidário está de boa saúde e que a democracia não está em risco. Pelo menos é o que eu acho, e isto de ter uma opinião individual, mesmo que infundada, hoje em dia parece ser razão suficiente para se ter razão.

Vamos ver então partidos de direita a defender a intervenção do Estado para controlar quem polui, incluindo as empresas. E vamos ver a esquerda a querer dar incentivos fiscais e outros benefícios a quem adopte medidas sustentáveis, mesmo que sejam no sector privado cujo objectivo é o lucro. Vamos ver esta causa transversal a misturar ainda mais os escassos limites da diferenciação ideológica na prática política, especialmente nas promessas. E as pessoas, ambientalmente mais conscientes, estarão preparadas para abdicar do seu modo de vida?

Neste processo de “PANificação”, o PAN tem a receita que tem escapado aos outros partidos. Sendo um partido recente, não tem as estruturas de poder que condicionam todos os outros e assume uma nova forma de comunicar, com novos intervenientes e uma mensagem actual. Assume a causa ambiental, que sempre pareceu ser uma mera colagem ou estar ao serviço de outros interesses políticos nos partidos mais antigos. O PAN, saindo do âmbito restrito dos defensores dos direitos dos animais, alarga o seu espectro assumindo-se como partido ambiental e defensor das liberdades das minorias e do progresso social sustentável. São mensagens fortes, novas e originais em Portugal, aproveitando a tendência internacional.

O PAN conjuga isso com uma capacidade de escapar às velhas dicotomias entre esquerda e direita que pouco dizem a tantas pessoas, especialmente aos mais novos. Isto não quer dizer que diferenciar entre esquerda e direita tenha deixado de fazer sentido, mas que tem sido difícil fazer isso de modo rápido e eficaz por culpa das práticas partidárias e por reinar uma generalizada falta de cultura política nas sociedades contemporâneas, apesar da tendência para a polarização ideológica em assuntos concretos. Isto é apenas mais um dos paradoxos deste fenómeno de “PANificação”, onde o glúten e outros elementos indesejáveis tentam ser corridos das novas propostas políticas.

Neste estágio da democracia cada um come o que quer e vão aparecer cada vez mais propostas, menus e receitas partidárias. Resta saber se mesmo assim as pessoas vão querer ir votar, porque a tendência de mobilização tem-se mostrado eficaz especialmente quando as causas são concretas, amplificadas quando o alarmismo e negativismo as conduz. Será que a urgência ambiental terá esse efeito? Os tempos são acelerados e instantâneos, tal como algumas receitas inovadoras que vão surgir com o fenómeno de “PANificação” e contrafacção política.