O Coutinho continua ocupado por quem lá mora, mas sem garantias de água e luz

O despejo dos moradores estava agendado para as 9h00 desta segunda-feira mas 12 das 105 fracções do edifício de 13 andares continuam na posse dos proprietários. A sociedade VianaPolis promete usar “todos os meios legais para desocupar” o prédio. Água e luz podem ser cortadas, dizem moradores.

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Paulo Pimenta

Os proprietários das 12 fracções do Prédio Coutinho ainda por entregar à VianaPolis, sociedade que almeja a demolição do edifício, prometem continuar a lutar para manter as suas habitações “até ao limite daquilo que for legalmente admissível”, mas podem não ter condições para o fazer por muito mais tempo, depois de terem sido avisadas de que a água e a electricidade podem falhar em breve, vincou o seu advogado, Magalhães Sant’Ana.

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Os proprietários das 12 fracções do Prédio Coutinho ainda por entregar à VianaPolis, sociedade que almeja a demolição do edifício, prometem continuar a lutar para manter as suas habitações “até ao limite daquilo que for legalmente admissível”, mas podem não ter condições para o fazer por muito mais tempo, depois de terem sido avisadas de que a água e a electricidade podem falhar em breve, vincou o seu advogado, Magalhães Sant’Ana.

“A VianaPolis, diz-nos que, dentro de umas horas, será suspenso o abastecimento de água e que, dentro de um ou dois dias, a electricidade”, disse aos jornalistas, à porta do imóvel de 13 andares, construído em meados da década de 70. O advogado negou ainda que a sociedade detida pelo Estado (60%) e pela Câmara Municipal de Viana do Castelo (40%) esteja a “usar força contra pessoas”. Para já, está a arrombar as portas das fracções em sua posse, para mudar as fechaduras.

Filha de dois moradores do Coutinho desde 1975, Manuela Cunha revelou que a sociedade detida pelo Estado e pela Câmara Municipal de Viana do Castelo tentou chegar a acordo com eles para saírem da habitação, tendo igualmente alegado a hipótese da água e da luz serem cortadas. “Nestas condições, eles podem ficar na casa até terça-feira, mas depois é para esquecer”, reconheceu. Os seus pais foram ainda avisados que, a partir de hoje, não podem regressar à sua habitação, se a deixarem em algum momento. “Dois senhores da VianaPolis disseram-lhes que não podem sair do seu apartamento ou que, se saírem, não entram mais”, acrescentou durante a tarde, junto à entrada para o prédio, vigiado por alguns elementos da PSP.

VianaPolis diz ter a lei do seu lado

A VianaPolis agendou o despejo de quem ainda reside no Coutinho para as 9h desta segunda-feira. A decisão foi anunciada em 30 de Maio, depois do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga (TAFB) ter considerado improcedente uma providência cautelar apresentada pelos moradores em Março de 2018, contra a expropriação pela VianaPolis. Magalhães Sant’Ana reiterou, no entanto, que os moradores vivem numa habitação “comprada com o esforço de uma vida” e numa construção “perfeitamente legal”, tendo apresentado, na semana anterior, uma intimação para protecção das liberdades e garantias junto do TAFB. O advogado disse ainda ter interposto, nesta segunda-feira, uma providência cautelar no mesmo órgão, para acompanhar a intimação.

A sociedade criada ao abrigo do programa Polis alegou, no entanto, que essa providência cautelar é apenas uma repetição da que foi apresentada em 2018, sem qualquer hipótese de ser considerada procedente pelo TAFB e considera-se no direito de retirar todos os moradores do Coutinho, dentro dos “meios legais”, acautelando possíveis riscos de segurança, referiu o presidente da Câmara de Viana do Castelo, José Maria Costa, durante a tarde. Apesar de reconhecer o direito dos moradores à defesa dos seus interesses, o autarca lembrou que os tribunais deram razão à VianaPolis em todas as sentenças. A sociedade tem assim todo o direito de travar “uma ocupação ilegal de propriedade do Estado”, reiterou.

O presidente da Câmara de Viana defendeu também que a VianaPolis sempre teve uma postura de “cooperação e de abertura” perante os moradores: depois de os ter notificado do despejo, reuniu com eles no dia 07 de Junho para planearem a “desocupação do Edifício Jardim”. A sociedade conseguiu recolher as chaves de 22 fracções entre 30 de Maio e 24 de Junho e deu aos restantes moradores a oportunidade do processo ser conduzido durante um prazo de 30 dias, a partir de 24 de Junho, mediante acordo para a saída, acrescentou José Maria Costa. 

A expropriação das fracções ainda na posse dos moradores é o passo que falta para se materializar a demolição do edifício. Depois de o concurso público ter sido lançado em Agosto de 2017, o projecto foi atribuído à construtora Domingos da Silva Teixeira, por 1,2 milhões de euros em Outubro. A Câmara almeja construir o novo mercado municipal no lugar onde está implementado o Coutinho. O advogado dos moradores, Magalhães Sant’Ana, disse não entender a urgência do despejo, quando a demolição requer ainda o visto do Tribunal de Contas.

Um litígio com quase duas décadas

Aquando da sua construção, entre 1973 e 1975, o Coutinho impôs-se no panorama do centro histórico vianense e chegou a albergar cerca de 300 moradores, mas esteve sempre envolto em polémica. Apesar de a demolição ter sido sempre uma sombra desde a sua construção, a operação, nos moldes actuais, só começou a pairar sobre o gigante de 13 andares em 2000, ano da fundação da VianaPolis, sociedade criada para realizar alterações urbanas e ambientais na cidade.

A Assembleia Municipal de Viana autorizou essa demolição logo em Fevereiro de 2002, mas conflito entre VianaPolis e moradores só se adensou a partir de 2005, quando a Declaração de Utilidade Pública, com “carácter de urgência para a expropriação do prédio”, foi publicada em Diário da República, no dia 16 de Agosto. As primeiras expropriações começaram nesse mesmo ano, mas, em 2006, quando a VianaPolis tomou posse administrativa de 45 fracções, os moradores protestaram e levaram o caso a tribunal. Em 2009, só já restavam 30 moradores.

Após um processo de sentenças e recursos, com o Tribunal Administrativo a legitimar as expropriações em Fevereiro de 2014, o Tribunal Constitucional também deu razão à VianaPolis, num acórdão de 13 de Dezembro de 2017.