Aeroporto no Montijo: comércio e indústria deseja, turismo aplaude, autarcas dividem-se

O novo aeroporto é muito desejado na Margem Sul do Tejo mas os autarcas comunistas preferem a localização no Campo de Tiro de Alcochete em vez da Base Aérea do Montijo. As diferenças entre PS e CDU projectam-se também no momento da assinatura do acordo.

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Opção pela base aérea do Montijo não é consensual Nuno ferreira santos

A construção de um novo aeroporto civil na Margem Sul do Tejo é bastante consensual entre os agentes económicos e políticos da região mas a localização na Base Aérea n.º 6, divide os autarcas, com os eleitos comunistas a insistirem na opção Campo de Tiro de Alcochete, contra os socialistas que defendem o Montijo.

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A construção de um novo aeroporto civil na Margem Sul do Tejo é bastante consensual entre os agentes económicos e políticos da região mas a localização na Base Aérea n.º 6, divide os autarcas, com os eleitos comunistas a insistirem na opção Campo de Tiro de Alcochete, contra os socialistas que defendem o Montijo.

O comércio, serviços e indústria, assim como o turismo, representados por associações do sector ouvidas pelo PÚBLICO, mostram-se favoráveis ao aeroporto, com esperança de um novo e relevante factor de desenvolvimento económico da Península de Setúbal, mas o consenso cai parcialmente entre os autarcas da região embora apenas por causa da localização.

As grandes empresas da região, como a Autoeuropa, The Navigator Company, Secil ou Lisnave, desejam que o aeroporto seja uma realidade e não discutem onde especificamente.

A Associação da Indústria da Península de Setúbal (AISET) “vê com interesse a instalação do aeroporto no seu território, porque aumenta a capacidade competitiva e de resposta a clientes e fornecedores”, diz Nuno Maia, director executivo desta associação. “Queremos que seja construído o mais rapidamente possível com qualidade e segurança”, acrescenta o mesmo responsável.

De forma idêntica, a Associação de Comércio, Indústria, Serviços e Turismo do Distrito de Setúbal (ACISTDS), revela a esperança de que a futura infra-estrutura possa ajudar a região a descolar dos últimos lugares em que caiu nos indicadores de desenvolvimento.

“A península de Setúbal é a quarta mais pobre do país, por estar integrada na Região de Lisboa e Vale do Tejo e ser prejudicada no acesso aos fundos comunitários. Esperemos que o novo aeroporto contribua para atenuar esta diferença de poder de compra entre as regiões norte e sul do Tejo.”, disse Francisco Carriço.

Segundo o presidente desta histórica associação de comércio e serviços, o aeroporto “vem contribuir para melhoria do turismo na região o que tem impacto no comércio e nos serviços na região”. 

A importância da nova solução aeroportuária para o turismo é reconhecida pela Entidade Regional de Turismo de Lisboa (ERTL), que refere os benefícios de um aeroporto em cada margem do rio.

“A Península de Setúbal é menos desenvolvida que Lisboa e esta é uma solução global que nos permitirá estruturar e desenvolver o turismo nos próximos anos e sem tensões com a operação de ‘Hub’ da TAP, diz Vítor Costa, presidente da ERTL.

Satisfeita com a decisão de avançar está também a Agência Regional de Promoção Externa do Turismo do Alentejo e Ribatejo, que elogia ainda o modelo financeiro. “Esta [o Montijo] é a solução mais barata e que está mais à mão. A solução financeira é a solução adequada e é um bom negócio para o Estado, que não avança com dinheiro agora, uma vez que não tem capacidade financeira e o investimento é urgente.”, afirma Vítor Silva.

“Geringonça” não aterra

A localização do aeroporto é um tema fracturante entre dois dos partidos que apoiam o actual Governo. Os autarcas do distrito de Setúbal dividem-se entre os socialistas, que apoiam a localização no Montijo de um aeroporto complementar à Portela, e os comunistas que defendem um novo aeroporto internacional no Campo de Tiro de Alcochete.

A diferença é tal que a troca de argumentos se estende a aspectos como o momento da assinatura do acordo de hoje e os acessos rodoviários a construir.

Os presidentes das câmaras de Montijo e Alcochete, ambos do PS, apoiam a decisão do Governo, com a condição de o Estudo de Impacto Ambiental ser favorável e mediante reivindicações que já entregaram ao ministro Pedro Marques.

Nuno Canta, autarca do Montijo, diz que o acordo de hoje “assume todos os investimentos do caderno de encargos apresentado” ao Governo, designadamente um novo acesso à Ponte Vasco da Gama, a circular externa do Bairro do Esteval ao Seixalinho, três novas avenidas, a variante da Atalaia para o Alentejo e uma nova ponte rodoviária entre o Montijo e o Barreiro.

“A ligação do Montijo ao Barreiro é extremamente importante até para a valorização dos territórios industriais da Baía do Tejo e para que a pressão não fique só sobre o Montijo, mas disseminada por todo o Arco Ribeirinho Sul”, argumenta Nuno Canta.

O administrador da Baía do Tejo, Jacinto Pereira, confirma que a nova ponte entre o Montijo e o Barreiro, assim como a também falada entre o Barreiro e o Seixal, são de “extrema importância para potenciar o esforço de captação de novas empresas e de criação de emprego”.

Fernando Pinto, autarca de Alcochete, preferia o aeroporto no Campo de Tiro, mas “não sendo isso possível financeiramente, acreditando no Governo e não havendo outra alternativa”, concorda com a opção Montijo. “Devemos aproveitar esta oportunidade e mitigar os aspectos negativos”, diz Fernando Pinto, que reivindica também um acesso mais directo de Alcochete à Ponte Vasco da Gama, além de reforços nos equipamentos de saúde e segurança.

Os autarcas comunistas em geral e os presidentes das associações de municípios do distrito de Setúbal em particular contestam a opção Montijo.

Rui Garcia, presidente da Associação de Municípios da Região de Setúbal (AMRS) considera “lamentável que o Governo persista neste caminho de decidir primeiro e avaliar depois” e reitera que a solução “ideal” para o aeroporto está encontrada há quase dez anos, no Campo de Tiro de Alcochete, e “já podia estar”. O autarca da Moita diz ainda que “a urgência não pode ser desculpa para esta muito má opção”.

Vítor Proença, autarca CDU de Alcácer do Sal e presidente da Comunidade Intermunicipal do Alentejo Litoral (CIMAL) acrescenta que o Montijo é uma “solução mitigada, redutora”, um “erro monumental”, e diz não entender como é que “uma obra desta envergadura pode ser dispensada de Avaliação Ambiental Estratégica”.

Joaquim Santos, autarca CDU do Seixal, diz que a assinatura de hoje é “mais uma precipitação” do Governo.

Entre os autarcas PS e CDU, só um presidente de câmara não tem posição pública definida. Frederico Rosa (PS), do Barreiro, vai dizendo que “o aeroporto a localizar-se no Montijo é uma grande alavanca para combater o grande flagelo do subdesenvolvimento da Margem Sul”, mas acrescenta que a “análise completa não pode ser feita ainda, porque o impacto negativo só poderá ser adequadamente conhecido com o EIA”.