Rossio, um lugar fraterno

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A fita era grande. Vermelha e branca, as cores do município. A tesoura metia medo. E Américo Thomaz e os seus convivas aproximaram-se da entrada da feira. Tesoura ao alto e o Presidente da República cortou a fita com palmas submissas à mistura. A Feira de Março estava inaugurada. Eu era uma criança e Américo Thomaz não me assustava. Queria era entrar e ver as novidades da feira. Os carrosséis e a casa assombrada. 

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A fita era grande. Vermelha e branca, as cores do município. A tesoura metia medo. E Américo Thomaz e os seus convivas aproximaram-se da entrada da feira. Tesoura ao alto e o Presidente da República cortou a fita com palmas submissas à mistura. A Feira de Março estava inaugurada. Eu era uma criança e Américo Thomaz não me assustava. Queria era entrar e ver as novidades da feira. Os carrosséis e a casa assombrada. 

Naquele terreiro de saibro chamado Rossio, era assim todos os anos durante um mês. O Rossio animava. Depois eram 11 meses de um Rossio estéril, só embelezado com as imponentes palmeiras junto à ria.

Não sei quando, o Rossio foi entaipado e a Feira de Março transferida para outro local. As obras duraram meses até que alguém foi cortar a fita da abertura do novo espaço. As imponentes palmeiras, um símbolo do Rossio, mantiveram-se em harmonia com o novo jardim. Um espaço para se usufruir num dos locais mais bonitos da cidade de Aveiro.

Os anos foram passando e a cidade nunca virou as costas ao Rossio. É um local de várias sensações. Ora se dorme ao sol, ou se vê um concerto, ou se festeja o 1º de Maio. Ou se mostra o artesanato da região, ou se anda de baloiço. Também se festejou a vitória do Europeu de Futebol e também se deseja "bom ano" bebendo champanhe. Também se dá pão às pombas. Turistas e aveirenses misturam-se num espaço fraterno. 

Alguém se lembrou, os motivos não sei, de acabar com aquele espaço. Abrir uma cratera profunda até ao lodo para arrumar automóveis e à superfície queimar a relva com lajes. Depois umas lojas e um resquício arqueológico para compor o ramalhete. Pelo meio, um palmo de relva e umas árvores. Não sou arquitecto, nem especulador imobiliário, nem empresário de cadeias de hotéis, nem arrumador de automóveis. Sou um aveirense que paga os impostos sem atrasos. E sou contra a destruição do Rossio. Porque tenho memória e não gosto que os meus impostos alimentem devaneios privados. O Rossio está bem como está. Necessita de alguns melhoramentos, fruto do desgaste da idade. São esses melhoramentos que se devem realizar.

A cidade sofreu vários atentados ao seu património durante anos. Podemos começar pela estação de comboios, atravessar a avenida e acabar na antiga lota. É este eixo que deve ser estudado como um todo. É urgente requalificar a avenida e a antiga lota. Os milhões que se irão gastar na cratera e no deserto à superfície, darão para recuperar espaços que agora estão decrépitos e que são património da cidade de Aveiro. 

Américo Thomaz também descerrou a placa da inauguração da antiga lota. Está lá cheia de teias de aranha. O político, o pai da obra, deve ficar vaidoso ao puxar a bandeira e dar a conhecer a placa da inauguração com letras douradas, até aí guardada em segredo. Também deve existir uma placa dessas no Estádio Municipal de Aveiro. Existem muitas placas envoltas em teias de aranha. O Rossio não merece nem pode ter mais uma.