De coletes abandonados nas praias a sacos feitos por refugiados

Deixados ao longo da costa grega, coletes salva-vidas usados pelos refugiados estão a ser transformados em sacos para vários usos. A missão é da empresa holandesa Makers Unite, empenhada em reconstruir a vida de refugiados em Amesterdão

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Os coletes abandonados por aqueles que sobreviveram à travessia do Mediterrâneo nas praias da Grécia estão a ser reutilizados e transformados em sacos para vários usos: no dia-a-dia, para proteger os computadores ou para levar em viagens.

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Os coletes abandonados por aqueles que sobreviveram à travessia do Mediterrâneo nas praias da Grécia estão a ser reutilizados e transformados em sacos para vários usos: no dia-a-dia, para proteger os computadores ou para levar em viagens.

Só em 2015, foram mais de 850 mil os refugiados que chegaram à Grécia, dos quais mais de 500 mil à ilha de Lesbos. À medida que lidava com a chegada de um grande número de refugiados, a população enfrentava ainda uma outra situação: as centenas de milhares de coletes deixados na costa grega. É aqui que entra a Maker Unite, uma empresa holandesa que decidiu levar 5000 coletes salva-vidas até Amesterdão para serem transformados em novos produtos. O resultado? Um total de 71 refugiados envolvidos na produção e venda dos sacos em 2017. A iniciativa faz parte de um programa de seis semanas desenvolvido pela empresa para ajudar refugiados a estabelecer uma carreira na Holanda, onde recebem 150 euros por mês pelas oito horas de trabalho voluntário semanais, assim como subsídio de desemprego.

"Quando estou a trabalhar, penso nas pessoas que usaram estes coletes, quem eram e o que lhes aconteceu. Também me lembro da minha própria viagem." O testemunho é de Ramzi Aloker, num artigo publicado pelo The Guardian. Tem 46 anos e é um dos refugiados empregados na oficina. Viu-se obrigado a abandonar Damasco, a cidade síria onde vivia e trabalhava enquanto designer de roupa feminina. Agora, costura novos produtos em Amsterdão.

"Nós damos uma segunda oportunidade tanto aos recém-chegados como ao material desperdiçado", sublinha Thami Schweichler, o director e co-fundador da Makers Unite. Ele acredita que a iniciativa vai estimular uma discussão que é necessária: "Esperamos que os nossos produtos criem consciência sobre os refugiados”. Ao mesmo tempo querem, também, ajudá-los a "construir um futuro". Eman Haj Omar e o marido, Ammar, tiveram que deixar Alepo em 2015 depois de uma bomba ter explodido na escola dos seus filhos. Decidiram que era altura de deixar a Síria e embarcaram numa viagem de quatro horas, num pequeno barco de borracha onde temeram pela vida. "Estava escuro e as nossas crianças estavam a chorar", pode ler-se no mesmo artigo do jornal britânico. No início, confessam, era difícil trabalhar com os coletes pois era uma memória dolorosa da viagem.

Até agora, a Makers Unite já conseguiu arranjar empregos pagos para cerca de 10% dos participantes no programa. Outros encontraram estágios, apostaram na educação ou começaram os seus próprios negócios. São vendidos cerca de 100 a 200 produtos todos os meses, sobretudo através do website. As encomendas chegam principalmente da Holanda, do Reino Unido ou dos Estados Unidos. Há três tipos de produtos à venda: uma mala para o dia-a-dia (preta ou cor-de-laranja a 55 euros), uma mala ecológica (a 55 euros), protecções para tablets e computadores (para iPad mini a 25 euros ou portátil de 39 a 45 euros) e uma mala para levar em viagem (disponível em laranja, preto ou duas cores, por 49 euros).

"Os clientes gostam que nós criemos alguma coisa positiva proveniente de uma situação difícil", diz Schweichler. "Penso que muitos compram os nossos produtos como uma posição contra as políticas anti-imigração dos seus governos."