O interior como prioridade

Fazer do interior uma prioridade não depende só do Estado central. Depende de todos nós, das autarquias, das universidades, das empresas, das associações, dos movimentos cívicos, de todos os que estão instalados no interior e não desistem

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O interior de Portugal corre o risco de passar a existir apenas na dimensão ideal de um amanhã prometido que, garantem-nos, chegará. Diariamente, chega-nos o tradicional discurso político, em que são identificados os problemas e prometidas soluções. Nem precisamos de pensar muito para conhecer a fórmula para a salvação — atrair investimento e pessoas. O problema do interior não é sequer de agora; aliás, é curioso notar que o debate político hoje é feito com temas que já eram questões no século XIX, como o papel dos transportes no desenvolvimento e a dicotomia entre centralização e descentralização/municipalização. Não é que a história se repita, as deficiências estruturais é que não desaparecem. E nisto foi-se cristalizando um Portugal a dois ritmos, uma sociedade dual, composta por um litoral desenvolvido e atractivo e um interior cada vez mais despovoado e isolado.

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O interior de Portugal corre o risco de passar a existir apenas na dimensão ideal de um amanhã prometido que, garantem-nos, chegará. Diariamente, chega-nos o tradicional discurso político, em que são identificados os problemas e prometidas soluções. Nem precisamos de pensar muito para conhecer a fórmula para a salvação — atrair investimento e pessoas. O problema do interior não é sequer de agora; aliás, é curioso notar que o debate político hoje é feito com temas que já eram questões no século XIX, como o papel dos transportes no desenvolvimento e a dicotomia entre centralização e descentralização/municipalização. Não é que a história se repita, as deficiências estruturais é que não desaparecem. E nisto foi-se cristalizando um Portugal a dois ritmos, uma sociedade dual, composta por um litoral desenvolvido e atractivo e um interior cada vez mais despovoado e isolado.

Em Março, um relatório da Infra.estruturas de Portugal mostrou que mais de 60% da ferrovia está em mau estado e é um risco para a circulação de passageiros e mercadorias. Acresce a divulgação da falta de capacidade da CP para reparar os comboios avariados. Noutro plano, também há coisa de um mês, alertou-se para o risco de ruptura na urgência pediátrica no hospital de Évora, por falta de especialistas e desadequação dos serviços.

Já no que diz respeito à educação e ciência, nos últimos meses soube-se que cerca de 48% dos estudantes do ensino superior se encontram em instituições de Lisboa e do Porto, sendo que 60% dos alunos de pós-graduação (mestrado e doutoramento) se encontram nestas regiões. Há dias, os primeiros resultados do concurso de apoios financeiros da Direcção-Geral das Artes teriam como consequência que cidades como Coimbra e Évora ficariam sem companhias de teatro, problema resolvido pelo aumento do orçamento. São apenas exemplos, entre vários possíveis, de áreas fundamentais no desenvolvimento do interior e na coesão territorial.

Não há dinheiro para o interior? Na reprogramação do Portugal 2020 a maioria dos fundos irá para a Área Metropolitana de Lisboa (AML). Porque não são repartidos entre outras regiões? Porque a AML tem quase três milhões de habitantes e, por exemplo, o Alentejo nem meio milhão tem? Mas o investimento no interior não pretende exactamente contrariar isto? Não, isto não é só orçamento. Fazer do interior uma prioridade depende de vontade política. E é preciso reconhecer que o interior não é todo igual, que o Norte não tem os mesmos problemas que o Alentejo, e que as mesmas soluções podem não ser adequadas a todas as realidades. Mas fazer do interior uma prioridade não depende só do Estado central, depende de todos nós, das autarquias, das universidades, das empresas, das associações, dos movimentos cívicos, de todos os que estão instalados no interior e não desistem. Temos que estar unidos e ser exigentes, esquecendo rivalidades e ressentimentos. Merecemos ter as mesmas oportunidades, independentemente do acaso do nosso local de nascimento. Não somos cidadãos de segunda.