Finlândia ameaça romper acordo fiscal com Portugal

Helsínquia pressiona Lisboa a ratificar convenção já assinada entre os dois países, sob pena de rasgar acordo anterior. Objectivo é tributar pensionistas finlandeses que vivem em Portugal.

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Governo de Juha Sipila fez um ultimato ao executivo de Costa Reuters/FRANCOIS LENOIR

A Finlândia está a colocar máxima pressão sobre o Governo de António Costa para que Portugal aprove no seu Parlamento um novo acordo bilateral já negociado entre os dois países, com o qual Helsínquia quer evitar que os cidadãos finlandeses que vivem em Portugal não paguem IRS no seu país. O Governo finlandês ameaça mesmo romper uma convenção com quase 50 anos que, neste momento, está na prática a dificultar o fisco finlandês de tributar pensionistas que nos últimos anos se tornaram residentes não habituais em Portugal.

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A Finlândia está a colocar máxima pressão sobre o Governo de António Costa para que Portugal aprove no seu Parlamento um novo acordo bilateral já negociado entre os dois países, com o qual Helsínquia quer evitar que os cidadãos finlandeses que vivem em Portugal não paguem IRS no seu país. O Governo finlandês ameaça mesmo romper uma convenção com quase 50 anos que, neste momento, está na prática a dificultar o fisco finlandês de tributar pensionistas que nos últimos anos se tornaram residentes não habituais em Portugal.

Helsínquia e Lisboa têm de pé desde 1971 uma convenção (celebrada em 1970) que procura solucionar as situações em que um cidadão poderia ser tributado duas vezes. O problema está na compatibilização desta convenção com uma regra fiscal lançada por Portugal há quase dez anos destinada a atrair investimento – o regime fiscal dos residentes não habituais, que permite aos reformados de outros países não pagarem IRS em Portugal sobre as pensões recebidas no seu país de origem. Apesar de o regime português prever que há isenção se esses rendimentos forem tributados no outro país “em conformidade com convenção para eliminar a dupla tributação celebrada por Portugal com esse Estado”, a Finlândia e outros países, como a Suécia, têm contestado as regras, por dificuldades em conseguirem tributar esses cidadãos.

Helsínquia já renegociou com Portugal uma alteração da convenção bilateral, já a ratificou, mas Portugal ainda não concluiu o processo para o documento estar em vigor. Os ministérios das Finanças dos dois países tinham chegado a um entendimento em Novembro de 2016 e Mário Centeno e o homólogo finlandês, Petteri Orpo, assinaram nessa altura um novo acordo em Bruxelas. Mas se na Finlândia a ratificação pelo Parlamento foi muito rápida – aconteceu logo no mês seguinte, em Dezembro de 2016 –, Portugal tem vindo a adiar esse passo, sem que o Governo envie a legislação para a Assembleia da República.

É desse compasso de espera que a Finlândia vem agora reclamar. E agora chega o ultimato. O Governo de Juha Sipila ameaça terminar já com a convenção dos anos 70 que evita a dupla tributação (mas que na prática está a criar o efeito contrário, de dupla não tributação). Fonte oficial do executivo finlandês confirmou ao PÚBLICO que a legislação que coloca um ponto final nesse acordo foi aprovada pelo Governo de Helsínquia esta semana e enviada para o Parlamento daquele país na quinta-feira. Em princípio, será discutida e votada até ao final do próximo mês de Junho, para que possa entrar em vigor a 1 de Janeiro de 2019. Para que o acordo possa ser revogado, é preciso que as autoridades finlandesas notifiquem Portugal com pelo menos seis meses de antecedência.

Contactado, o gabinete de imprensa do ministério liderado por Mário Centeno remeteu as explicações para o Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE), declarando que “os processos de aprovação de acordos internacionais são da competência do MNE”, deixando sem resposta a pergunta sobre como interpreta o Governo português a posição assumida publicamente pela Finlândia.

Por esclarecer deixou também se o assunto tem sido abordado com a Finlândia e a Suécia à margem das reuniões dos ministros das Finanças (o Eurogrupo, onde têm assento os governantes da zona euro, e o Ecofin, onde estão representados os 28).

Finlândia queixa-se de "injustiça"

Com esta acção do lado finlandês, Portugal fica numa situação em que, se entretanto não ratificar o novo acordo, no início de 2019 deixa de estar em vigor qualquer tipo de acordo, passando a aplicar-se as regras fiscais normais.

Do lado de Helsínquia, a posição assumida deve-se essencialmente ao facto de os pensionistas finlandeses que passam a ser considerados residentes em território português deixarem não só de pagarem impostos na Finlândia (por via do acordo fiscal entre os dois países) como não pagarem também em Portugal (por via da legislação favorável prevista no país para os residentes estrangeiros), o que é considerado “injusto”.

A mesma fonte oficial garante que a legislação agora lançada pelo Governo finlandês não impede que o novo acordo entre em vigor no arranque de 2019, se entretanto Portugal decidir ratificá-lo.

A subida de tom da Finlândia – feita num comunicado oficial publicado pelo Ministério das Finanças – vem colocar mais pressão sobre o Governo de Costa e tem um significado particular, ao acontecer num momento em que o presidente do Eurogrupo é Mário Centeno. Também a Suécia, que não partilha a moeda única, tem pressionado Portugal a rever as suas regras.

A actual convenção em vigor, diz o ministro Petteri Orpo, citado nesse comunicado, “é inconsistente com a noção de justiça em matéria de tributação das pensões”. Embora realce o “espírito de cooperação”, o governante não deixa de lembrar que a Finlândia já o ratificou, mas que Portugal não o fez.

Ao Negócios, o Governo português tinha referido em Dezembro passado – na sequência de perguntas colocadas às Finanças e ao Ministério dos Negócios Estrangeiros – que “as autoridades dos dois países têm mantido contactos regulares e construtivos” e que, “após o habitual processo de análise para aprovação interna, [a nova convenção] será brevemente submetida à Assembleia da República”, algo em relação ao qual não se conhecem desenvolvimentos.