O estereótipo do veganismo, por uma vegan

Desmistifiquem o ser vegan. Garanto-vos que não tenho uma enfezada plantação de erva no meu jardim, não tenho um Instagram com fotos das minhas últimas 1263 refeições, nem um canal no YouTube a dizer que os forcados deviam morrer

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Brooke Lark/Unsplash

Sou vegan, mas isso não é algo que goste que me defina. Não é algo que eu goste ainda de falar, de discutir. Porque não se procura compreender. Procura-se, sim, pôr a ridículo qualquer argumento para que o único sobrevivente se torne aparentemente legítimo. E com o mesmo comentário de sempre: “Epá, mas carne é bué da boa’’.

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Sou vegan, mas isso não é algo que goste que me defina. Não é algo que eu goste ainda de falar, de discutir. Porque não se procura compreender. Procura-se, sim, pôr a ridículo qualquer argumento para que o único sobrevivente se torne aparentemente legítimo. E com o mesmo comentário de sempre: “Epá, mas carne é bué da boa’’.

Vamos pôr as coisas em pratos limpos (sem carne, por sinal). Eu sou vegan e o porquê de o ser pode ser extremamente simples. É certo e provado que vivemos bem, e não em forma de um Jack Skellington mais baixo, sem qualquer alimento de origem animal. Até melhor, mas não o vou dizer porque “nossa, e onde é que vais buscar a proteína?’’. Assim, sendo um luxo comer tanto um belo bife como uma omelete desfeita, luxo no sentido de que saúde não me falta sem eles, não quero matar ou fazer sofrer por tal.

Tendo isto em conta, tenho três coisas a dizer. 

Primeiro, desmistifiquem o ser vegan. Só de escrever a palavra sinto a conotação negativa. Garanto-vos que não tenho uma enfezada plantação de erva no meu jardim, não tenho um Instagram com fotos das minhas últimas 1263 refeições, nem um canal no YouTube a dizer que os forcados deviam morrer. Prometo que cerveja é um dos meus maiores amores e as batatas fritas são uma constante. Que sumos verdes não são rotina, até porque são demasiado caros, e os meus livros da faculdade ainda mais. Que deixem de tentar caber num estereótipo irreal aquilo que não o é. Já ouvi que generalização é dos maiores crimes da Humanidade.

Segundo, não perguntem o que quer que seja a alguém, sobre o que quer que seja, quando a única coisa que querem é ter razão. E quando a única coisa que querem é ser engraçadinhos. E também, por favor, perguntem, quando quiserem genuinamente saber, mas oiçam porque não me tornei numa surda, nem acéfala, pelos legumes. Isto é o pior. Eu sinto a enorme diferença quando falámos de política, por exemplo. A propósito de um hipotético jantar no Panteão perguntam-me logo o que é que eu comeria. Só de vos contar aqui já me cansei mais uma vez. Já sinto que é algo que não devo falar. Esqueço-me, com todo o estereótipo, que é, na verdade, uma coisa em que eu acredito. Que sejam cada vez mais os que queiram falar, cada vez menos os que me dizem que a continuar assim vou morrer. Sim, exactamente assim.

Por fim, aponto o dedo ao “pseudo”. Aquele que faz piadas sem sentido, deita olhares de nojo à minha comida, toma-me não pelo que sou, mas por aquilo que como. É exactamente ele que faz com que muitos não sejam vegans. Não há um tipo de pessoa vegan, não somos uma seita, não existe um “somos” sequer. O estereótipo é o problema. Há outros, claro: “Os meus pais não me deixam”, dizem. Ou “eu gosto muito de francesinhas”.

Que fique dito: eu não sou essa ideia. E acredito sinceramente que toda a gente devia ser vegan. Agora perguntem-me porquê.