Macron escolhe primeiro-ministro para dividir a direita

O deputado e autarca Edouard Philippe, um aliado de Juppé, foi o escolhido para liderar o Governo, mas com a mira apontada para as legislativas.

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Edouard Philippe, o novo primeiro-ministro francês. Tem 46 anos EPA

Com as eleições legislativas no horizonte, o Presidente francês, Emmanuel Macron, escolheu um conservador muito próximo de Alain Juppé para primeiro-ministro. O grande objectivo é aprofundar as divisões no seio do partido Os Republicanos e tornar inevitável a recomposição do sistema partidário.

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Com as eleições legislativas no horizonte, o Presidente francês, Emmanuel Macron, escolheu um conservador muito próximo de Alain Juppé para primeiro-ministro. O grande objectivo é aprofundar as divisões no seio do partido Os Republicanos e tornar inevitável a recomposição do sistema partidário.

Depois da vitória de Macron, um independente com pouca experiência governativa que fundou um movimento político há cerca de um ano, a nomeação do líder do Governo teria sempre um carácter inédito. O ex-ministro da Economia do anterior executivo socialista optou por Edouard Philippe, um político de centro-direita que a generalidade da imprensa apontava como o nome mais provável para ocupar o Palácio de Matignon.

Philippe, de 46 anos, é desde 2010 autarca de Havre, cidade costeira da Normandia, mas o seu cartão-de-visita é a grande proximidade a Alain Juppé, o candidato derrotado nas eleições primárias d’Os Republicanos por François Fillon. O Le Figaro, próximo da direita, apresenta-o como “o filho espiritual” do autarca de Bordéus, de cuja candidatura foi um dos porta-vozes.

A escolha de um representante da ala moderada do partido de centro-direita é vista como uma forma de Macron aproveitar uma divisão que já era patente durante a campanha presidencial. Os escândalos que envolveram Fillon, investigado num caso de empregos fictícios dados à mulher e aos filhos, levaram muitos aliados de Juppé a olhar para a candidatura do centrista como uma alternativa.

Desde a eleição de Macron que a direcção do partido estava consciente deste risco. Nos últimos dias, os principais dirigentes têm tentado travar uma possível sangria de apoios na direcção do República em Marcha. A nomeação de Philippe acabou por ser um golpe já esperado. “É verdade que isso não ajuda a nossa acção colectiva”, disse ao Le Monde o líder do grupo parlamentar republicano na Assembleia Nacional, Christian Jacob.

Pouco depois da nomeação de Philippe, um grupo de dirigentes republicanos lançou um abaixo-assinado onde era deixado o apelo de “responder à mão estendida pelo Presidente da República”. A carta, assinada por duas dezenas de eleitos próximos de Juppé e de Bruno Le Maire, outro moderado que também foi candidato às primárias, é mais um elemento de pressão junto da direcção d’Os Republicanos.

O grande objectivo de Macron é conseguir que o seu partido alcance uma maioria de lugares nas eleições legislativas do próximo mês, que lhe garantam estabilidade governativa para poder aprovar o programa de reformas que pretende aplicar. Porém, a maioria das sondagens aponta para uma grande fragmentação da composição do próximo hemiciclo, contrariando a tendência quase bipartidária das últimas décadas.

“Ver um presidente social-democrata nomear um primeiro-ministro de direita é uma ruptura muito grande com os costumes da V República”, diz ao Le Monde o deputado republicano Benoist Apparu, que também fez parte da campanha de Juppé.

Entre o PS e a direita

Na verdade, a vida política de Philippe começa no Partido Socialista, onde integrou a tendência social-democrata de Michel Rocard, durante os anos 1990. Nascido em Rouen, filho de professores, neto de um estivador e descendente do primeiro militante comunista da cidade, a aproximação da direita dá-se em 2002, quando integra a recém-criada União para um Movimento Popular (UMP, formação que deu origem a Os Republicanos), liderada então por Alain Juppé. Ocupou vários cargos regionais até “herdar” a câmara municipal de Havre, na sequência da morte do autarca Antoine Rufenacht, em 2010 – é reeleito a nome próprio quatro anos mais tarde.

Quem o conhece descreve-o como difícil de catalogar ideologicamente, um pouco à semelhança de Macron. “Edouard é de direita nos temas económicos, mas é moderado nos assuntos sociais”, diz ao Le Monde Gilles Boyer, o ex-director de campanha de Juppé com quem Philippe escreveu dois romances.

Apesar de pouco conhecido da generalidade do público francês, Philippe não é imune às polémicas. Segundo o site Mediapart, o autarca foi alvo em 2014 de uma reprimenda por parte da Alta Autoridade para a Transparência da Vida Pública, por se ter recusado a revelar o valor de parte dos seus bens imobiliários. Na sua declaração de interesses e rendimentos, o também deputado encheu-a de comentários evasivos.

Na área relativa aos rendimentos que auferiu como advogado escreveu: “Não estou certo de compreender a pergunta. Querem saber a minha taxa horária na altura das eleições? A minha remuneração mensal média? Anual?” Mais tarde, o deputado disse que os comentários visavam “conciliar o respeito pela lei e uma forma de mau humor”.

Philippe foi também um dos opositores às leis de transparência dos titulares de cargos públicos aprovadas em 2013 na sequência do escândalo que envolveu o ministro Jerôme Cahuzac, acusado de fraude fiscal e branqueamento de capitais. Para Macron, que fez da luta contra a corrupção uma das suas bandeiras e que prometeu vetar qualquer nomeação de políticos envolvidos em casos do género, a escolha de um primeiro-ministro tão avesso à transparência poderá ser uma fonte de problemas.