Ambientalistas com poucas expectativas na consulta pública sobre Almaraz

Elementos disponibilizados nesta segunda-feira pela Agência Portuguesa do Ambiente sobre o armazém de resíduos nucleares de Almaraz já tinham sido divulgados publicamente pelas autoridades espanholas

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Técnicos portugueses realizaram visita à central nuclear de Almaraz em finais de Fevereiro. LUSA/ANTÓNIO JOSÉ

Duas associações ambientalistas, a Quercus e a Zero, mostram-se pouco optimistas com o desfecho do processo de consulta pública sobre o impacto da construção de um armazém de resíduos nucleares em Almaraz, Espanha, que arrancou esta segunda-feira e termina a 7 de Abril.

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Duas associações ambientalistas, a Quercus e a Zero, mostram-se pouco optimistas com o desfecho do processo de consulta pública sobre o impacto da construção de um armazém de resíduos nucleares em Almaraz, Espanha, que arrancou esta segunda-feira e termina a 7 de Abril.

A vice-presidente da associação Zero, Carla Graça, manifestou-se surpreendida com os documentos divulgados nesta segunda-feira pela Agência Portuguesa do Ambiente, considerando que não apresentam "nada de novo". Enquanto o presidente da Quercus, João Branco, considera que este processo parece ser o "cumprimento de uma mera formalidade", que será "totalmente inconsequente". Mesmo assim as duas associações garantem que vão enviar pareceres sobre o assunto dentro do prazo previsto.

"Para nós, Zero, foi uma relativa surpresa os documentos que estão disponibilizados, neste momento, para consulta pública em Portugal porque nada trazem de novo", e são aqueles que eram públicos em Espanha, disse à agência Lusa Carla Graça.

"Processo para inglês ver"

João Branco, por seu lado, insiste que a decisão espanhola está tomada e estranha que se tenha avançado para uma consulta pública em Portugal, quando a declaração de impacto ambiental aprovada em Espanha, em finais de Novembro, não foi revogada. "Para já parece-nos um processo para inglês ver, ou melhor, para português ver", ironiza o presidente da Quercus. 

A Zero notou a ausência de uma avaliação do risco transfronteiriço do projecto. "Estamos a falar [do que] foi a base da queixa que Portugal apresentou na Comissão Europeia por violação da directiva europeia, transposta para as legislações nacionais quer de Portugal quer de Espanha, que é a avaliação de impactos transfronteiriços do projecto", especificou Carla Graça.

A construção de um armazém de resíduos nucleares na central de Almaraz, a 100 quilómetros da fronteira portuguesa, e a falta de um estudo de impacto transfronteiriço do projecto levou Portugal a apresentar uma queixa na Comissão Europeia, depois retirada, com a promessa de Espanha fornecer os dados pedidos, nos próximos dois meses.

Se os resultados deste trabalho forem "inconclusivos", Portugal poderá voltar a apresentar queixa na Comissão Europeia.

Carla Graça referiu que estão em consulta pública a proposta de projecto e estudo de impacto ambiental divulgados em Setembro, aquando da consulta pública em Espanha, a declaração de impacto ambiental que aprova o projecto em Novembro, com uma adenda em Dezembro, e pareceres do conselho de segurança nuclear.

"Mais grave é que não há aqui avaliação alguma de impactos transfronteiriços", realçou a ambientalista.

Assim, "não percebemos que acordo foi este que Portugal fez com Espanha para estabelecer o diálogo e a transparência do processo" nem o que significa esta consulta pública em Portugal, se "tem alguma repercussão efectiva do lado espanhol, em termos de projecto", especificou.

Queixa retirada sem garantias?

Carla Graça recordou que associações espanholas e portuguesas já tinham alertado para o problema em Setembro, mas "o Governo só assumiu o problema quando a declaração de impacto ambiental foi publicada, no final de Novembro". João Branco partilha da crítica e acusa o ministro do Ambiente de ter reagido tarde e de ter retirado a queixa sem qualquer garantia das autoridades espanholas.

Os dois ambientalistas dizem não saber se vai mesmo haver uma avaliação de impactos transfronteiriços, como decorre da lei, e quem a vai fazer.

No final de Fevereiro, 16 técnicos de Portugal, três dos quais de entidades independentes e os restantes da administração pública, nomeadamente da Agência Portuguesa do Ambiente (APA) e da Direcção-Geral da Saúde, visitaram a central de Almaraz e estão a preparar um relatório sobre a instalação.

Vários sectores da sociedade, como ambientalistas e partidos políticos, receiam que a construção do armazém signifique que Espanha se prepara para autorizar o prolongamento do funcionamento da central nuclear além dos 40 anos, quando deveria terminar em 2020. Essa data já significou uma prorrogação por 10 anos face ao prazo de vida inicial.