Roménia pode ter primeira chefe de Governo muçulmana. Mas será só uma testa de ferro?

Sevil Shhaideh foi nomeada pelo partido que venceu as eleições. Críticos dizem que servirá apenas para o líder do partido, que não pode ser ministro por uma condenação judicial, controlar o Governo.

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Sevil Shhaideh é uma desconhecida e quase não tem experiência política Reuters

A Roménia poderá ter, pela primeira vez, uma muçulmana à frente do Governo. E também pela primeira vez, uma mulher como primeira-ministra. Trata-se de Sevil Shhaideh, 52 anos. Mas enquanto alguns jornais enaltecem a posição progressista de um país que poderá ser o primeiro da União Europeia a ter alguém da minoria muçulmana à frente do Governo, analistas sublinham que Shhaideh é uma ilustre desconhecida cuja previsível nomeação servirá para que o líder do partido, Liviu Dragnea, controle o Executivo sem ter um cargo formal – Dragnea foi acusado por tentativa de fraude fiscal e não pode integrar um executivo.

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A Roménia poderá ter, pela primeira vez, uma muçulmana à frente do Governo. E também pela primeira vez, uma mulher como primeira-ministra. Trata-se de Sevil Shhaideh, 52 anos. Mas enquanto alguns jornais enaltecem a posição progressista de um país que poderá ser o primeiro da União Europeia a ter alguém da minoria muçulmana à frente do Governo, analistas sublinham que Shhaideh é uma ilustre desconhecida cuja previsível nomeação servirá para que o líder do partido, Liviu Dragnea, controle o Executivo sem ter um cargo formal – Dragnea foi acusado por tentativa de fraude fiscal e não pode integrar um executivo.

O partido social-democrata de Dragnea e Shhaideh venceu as eleições de 11 de Dezembro e com um pequeno partido liberal democrata (liderado pelo antigo primeiro-ministro Calin Tariceanu) tem maioria absoluta no Parlamento.

Antes, a Roménia tinha sido liderada por um Governo tecnocrata apoiado pelo centro-direita – depois de manifestações contra a corrupção em 2015 que afastou do Executivo o então primeiro-ministro social-democrata, Victor Ponta.

O Presidente Klaus Iohanis (que é de origem alemã e protestante no país de maioria ortodoxa) disse ter recebido duas propostas para o cargo e que esperava designar um responsável depois do Natal, seguindo-se a votação no Parlamento. Vencer esta votação será fácil para um nomeado pelos sociais-democratas já que este tem, em conjunto com o seu pequeno aliado liberal, uma maioria absoluta no hemiciclo.

A oposição criticou o nome de Shhaideh, 52 anos, especialmente por ter pouca experiência (é vista como mais tecnocrata do que política, o mais alto cargo que ocupou foi, durante seis meses, a secretaria de Estado do Desenvolvimento Regional) e ser assim vista como alguém que serve apenas o propósito de Dragnea controlar o Executivo. O partido social-democrata escolheu “uma testa de ferro com o objectivo de lhe preparar o terreno para que se torne primeiro-ministro”, acusou o deputado Cristian Ghinea, citado pela agência Reuters.

Dragnea foi condenado no ano passado por ter tentado em 2012 levar a cabo uma campanha de subornos e boletins de voto falsos para conseguir um resultado favorável numa votação para a destituição do então Presidente Traian Basescu (rival dos sociais-democratas). Na altura do julgamento, Dragena era ministro – e não se demitiu durante o processo, apenas após a condenação.

Shhaideh era ainda próxima de outro responsável do partido envolvido num escândalo de corrupção: Nicusor Constantinescu, condenado a 15 anos de prisão por corrupção em Constanta, cidade portuária do Sudeste do país, onde Shhaideh fez a sua carreira política (filha de turcos, Shhaideh pertence à minoria tártara da Roménia, no país há muito tempo e concentrada sobretudo em Constanta).

Há ainda outro grande motivo de críticas à potencial nova primeira-ministra: a ligação do seu marido ao regime de Bashar al-Assad na Síria. O marido de Shhaideh é sírio e chegou a ser ministro da Agricultura de Assad. Embora tenha saído do país em 2010, ou seja antes do início da guerra na Síria, que começou com uma revolta por mais democracia (revolta essa que foi esmagada pela força pelo regime), na declaração fiscal do casal estão três propriedades no país em zonas controladas pelo Governo.

O facto de Shhaideh poder ser a primeira muçulmana a chefiar um Governo num país da União Europeia, ainda por cima num país com apenas 0,5% de população desta religião, é visto com alguma normalidade porque a minoria étnica tártara a que pertence é parte do país há séculos e o islão que pratica é muito moderado, sublinhou o analista do European Policy Center de Bruxelas Paul Ivan, ao New York Times.