A enfermeira Raquel é um “exemplo” para os britânicos

Apesar do "Brexit", Raquel Martins Pina não pondera voltar para Portugal. Enfermeira foi premiada por ter acompanhado bebé com 25 semanas. A criança morreu, mas os pais não esqueceram a dedicação da portuguesa.

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No hospital que fica ao pé do Big Ben, e num serviço com cerca de duas centenas de enfermeiros, Raquel tem muitos colegas estrangeiros, portugueses, espanhóis, australianos, filipinos DR

Há cinco anos Raquel Martins Pina decidiu fazer as malas e emigrou para o Reino Unido. Os poucos trabalhos que encontrava em Portugal não eram pagos ou o que lhe ofereciam não passava do salário mínimo nacional. Recém-licenciada, tudo o que conseguiu por cá foi um emprego de três meses na Linha de Saúde 24. Hoje, com 29 anos, é enfermeira senior nos cuidados intensivos neonatais de um grande hospital pediátrico no centro de Londres — o Evelina London Children's Hospital —, conseguiu especializar-se na sua área de eleição, com o aval e o financiamento da instituição, e, cereja em cima do bolo, acaba de receber um prémio que resulta do reconhecimento dos familiares de um doente.

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Há cinco anos Raquel Martins Pina decidiu fazer as malas e emigrou para o Reino Unido. Os poucos trabalhos que encontrava em Portugal não eram pagos ou o que lhe ofereciam não passava do salário mínimo nacional. Recém-licenciada, tudo o que conseguiu por cá foi um emprego de três meses na Linha de Saúde 24. Hoje, com 29 anos, é enfermeira senior nos cuidados intensivos neonatais de um grande hospital pediátrico no centro de Londres — o Evelina London Children's Hospital —, conseguiu especializar-se na sua área de eleição, com o aval e o financiamento da instituição, e, cereja em cima do bolo, acaba de receber um prémio que resulta do reconhecimento dos familiares de um doente.

Este “People Award” tem um sabor muito especial. Raquel foi nomeada pelos pais de um bebé prematuro que não esqueceram o cuidado “excepcional” com que tratou e acompanhou Catherine, assim se chamava a menina nascida com apenas 25 semanas.

“Raquel é o exemplo de tudo o que é maravilhoso no NHS (Serviço Nacional de Saúde inglês)”, declarou a representante da Greater London Lieutenancy na cerimónia de entrega do prémio da Guy’s and St Thomas’ Charity (que integra, entre outros, o hospital pediátrico onde trabalha a portuguesa), em Londres, em 18 de Novembro.

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Catherine sobreviveu 48 dias. Nos últimos três, a enfermeira portuguesa não largou a menina e mudou mesmo de turno para poder estar ao pé dos pais até ao fim. “Quando ela morreu, Raquel sentou-se pacientemente connosco e ajudou-nos a dar-lhe banho e a vesti-la. Foi atenciosa, prestável, calma e compreensiva, apoiou-nos num momento pelo qual nenhum pai deveria passar”, descreveu a mãe de Catherine, num relato emocionado.

"Ela não podia fazer mais nada por nós”, frisou. Reservada, Raquel acredita que apenas fez o que devia: “Pensei que eles mereciam todo o apoio, tendo em conta as circunstâncias em que se encontravam. Mudei de turno não porque eles tenham pedido, mas porque achei que precisavam de alguma continuidade naquela situação."

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O choque do "Brexit"

O Evelina London Children's Hospital pertence ao Guy's and St Thomas' NHS Foundation Trust, ou seja, é um hospital público de um Foundation Trust, pelo que tem maior autonomia face ao poder central e regras próprias de funcionamento. Fica ao pé do Big Ben, e num serviço com cerca de duas centenas de enfermeiros, Raquel tem muitos colegas estrangeiros, desde portugueses a espanhóis, australianos, filipinos.

O "Brexit" deixou-os a todos assustados, no início, mas agora a situação acalmou. Quando o resultado do referendo (a 23 de Junho o país aprovou a saída da União Europeia) foi conhecido, "em Londres foi um grande choque”, recorda Raquel, enquanto admite que se sentiu "um pouco apreensiva". Mas hoje está convencida de que terá sempre trabalho no Reino Unido e, mesmo que venha a precisar de visto, tem a certeza de que o seu emprego está garantido. "A minha chefe disse-me que não tinha que me preocupar."

A página do Facebook de Raquel é encimada pela palavra “saudade”. Mas isso não significa que a jovem enfermeira pense regressar a Portugal. “Tenho saudades do que deixei em Portugal, da família, do país”, admite. Mas entretanto casou-se e o que vai sabendo da situação dos enfermeiros no país natal não a sossega. “É muito trabalho com poucos recursos e poucas pessoas. Os enfermeiros estão simplesmente cansados”, diz a enfermeira que não põe de parte a hipótese de pedir a nacionalidade britânica.

No Reino Unido, a situação é bem melhor: os profissionais são avaliados todos os anos e, se cumprirem os objectivos previamente traçados, sobem um ponto na carreira. Raquel está já na “banda 6”, é considerada enfermeira senior porque tem uma especialidade. Se voltasse para Portugal, diz, seria uma enfermeira como outra qualquer.