Dívida do maior accionista privado do Banif ficou nas mãos do Santander

Rentipar, das herdeiras de Horácio Roque, deve agora 8,9 milhões ao banco que ficou com o Banif. Grupo decidiu insolvência mais de um mês antes da intervenção do Banco de Portugal

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Accionistas do Banif afectados por colapso do banco

A Rentipar Investimentos, holding através da qual as filhas de Horácio Roque detinham uma participação no Banif, entrou em insolvência com dívidas de mais de 70 milhões de euros a três bancos e de 60 milhões a obrigacionistas. Entre os bancos estava, além do BCP e do Novo Banco, o próprio Banif, cujo crédito, no valor de 8,9 milhões de euros, está agora nas mãos do Santander Totta, que comprou os principais activos da instituição financeira intervencionada em Dezembro.

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A Rentipar Investimentos, holding através da qual as filhas de Horácio Roque detinham uma participação no Banif, entrou em insolvência com dívidas de mais de 70 milhões de euros a três bancos e de 60 milhões a obrigacionistas. Entre os bancos estava, além do BCP e do Novo Banco, o próprio Banif, cujo crédito, no valor de 8,9 milhões de euros, está agora nas mãos do Santander Totta, que comprou os principais activos da instituição financeira intervencionada em Dezembro.

Assim, a reviravolta que ocorreu no Banif, apoiado pelo Estado no final de 2012, acabou por fazer com que o antigo principal accionista do banco desenvolvido por Horácio Roque esteja agora a dever dinheiro a um ex-concorrente (vários créditos passaram para o veículo criado pelo Estado, o Oitante, mas esse não foi o caso da dívida da Rentipar).

Como garantia do empréstimo do Banif, a Rentipar tinha avançado um penhor financeiro composto por 7,26% da Rentipar Financeira (por via da qual a Rentipar Investimentos, o seu maior accionista, é dona da Renticapital e de uma fatia do Banif), 25% da Genius (mediadora de seguros), obrigações emitidas pela Rentimundi (investimentos imobiliários) e 90% da Renticontrol (gestão e contabilidade).

O PÚBLICO questionou o Santander no sentido de saber se a instituição tinha conhecimento da existência deste crédito na carteira que adquiriu, quais as diligências que têm sido tomadas e se acredita ser possível recuperar o montante em causa. Este, no entanto, não comentou, afirmando que se trata de uma matéria que envolve clientes do banco.

No caso da dívida ao BCP, o valor é de 13,4 milhões de euros, mas a sua recuperação parece ser uma missão impossível, já que a garantia dada pela Rentipar foram acções do Banif.

A dívida bancária mais elevada, de acordo com o processo de insolvência da Rentipar, é para com o Novo Banco (que ficou com os melhores activos do ex-BES, após a intervenção de Agosto de 2014). No final do ano passado, o montante ia em 54 milhões de euros. Sem qualquer tipo de garantias especiais, este valor está associado a uma emissão de papel comercial de 50 milhões, que deveria ter sido paga em 2015. Também aqui dificilmente será possível reaver o montante em causa.

As dificuldades da Rentipar eram já evidentes na recta final de 2014, altura em que a empresa presidida por Teresa Roque (filha de Horácio Roque) deveria ter pago 2,3 milhões de euros de juros devidos ao Novo Banco. A solução foi um financiamento do própria instituição credora, a seis meses. Mas as dificuldades agravaram-se e esse empréstimo juntou-se às outras dívidas, levando o Novo Banco a pressionar para que se chegasse a uma solução.

No dia 2 de Novembro, quando este processo ia já para contencioso, o conselho de administração da Rentipar reúne-se na sua sede, na Avenida Barbosa do Bocage, em Lisboa. Além de Teresa Roque, está também presente Vítor Simons. Cristina Roque, irmã de Teresa, participa através de videoconferência por se encontrar na África do Sul. O diagnóstico é o de que a empresa está “sem perspectivas de continuidade”, com o incumprimento perante o Novo Banco e sem “capacidade de renegociar os financiamentos”, conforme ficou escrito em acta.

A participação no Banif continuava a perder valor, não se encontrava um novo accionista para o banco, então liderado por Jorge Tomé, e dentro de alguns dias chegava o momento em que os obrigacionistas da Rentipar podiam exercer o direito de pedir o reembolso antecipado da dívida que tinham subscrito. A estes dados juntava-se outro: o facto de a Rentipar estar ainda envolvida numa disputa entre Fátima Roque e as filhas, por causa da herança de Horácio Roque, o que implica o arrolamento de 99% do capital da empresa. Neste contexto, a reunião acaba com a decisão de “preparar a apresentação à insolvência” e “informar os credores da sociedade”.

Um mês depois, a 3 de Dezembro, o advogado da Rentipar tenta congelar o processo de pedido de insolvência que já dera entrada no tribunal. Esta acção é justificada pelo facto de o Banif, credor, informado da insolvência, ter comunicado que estavam a ser conduzidas diligências que, a terem sucesso, “poderão levar a uma valorização significativa dos activos da Rentipar, claramente dependente da valorização do grupo Banif”.

O processo, ligado à tentativa de Jorge Tomé em encontrar uma solução para o banco, com um novo accionista, poderia, de acordo com as informações prestadas pelo advogado ao tribunal, tornar possível “um ressarcimento, pelo menos parcial, dos créditos” devidos pela Rentipar. “Será de toda a conveniência que se aguarde” pelo fim das diligências, defendia-se, para que estas não sejam afectadas “pelo decretamento imediato da insolvência”. A resposta surge seis dias depois, argumentando-se que o requerente de um processo deste tipo “não pode desistir” após ter dado início ao pedido.

A entrada em insolvência só chegou ao conhecimento público já depois de o Banco de Portugal ter aplicado, a 20 de Dezembro, uma medida de resolução ao Banif (a sentença de insolvência foi proferida a 12 de Janeiro, e publicada três dias depois). 

Com a intervenção das autoridades, os accionistas privados do Banif perderam todo o seu património (a estratégia acarreta ainda avultados custos para os contribuintes, ficando o Santander com os melhores activos em troca de 150 milhões).

Se a Rentipar era a empresa historicamente ligada ao Banif, desde há algum tempo que a maior fatia do banco era detida pelas herdeiras de Horácio Roque através de outra empresa, a Soil. Esta última, com sede na Zona Franca da Madeira e presidida por Teresa Roque, tem algumas ligações ao grupo Rentipar e detém 52,3% da Açoreana (os outros 47,7% eram do Banif). A seguradora, por sua vez, detinha cerca de 6% do banco nascido no Funchal. Neste momento, está a ser finalizada a venda da Açoreana ao fundo de investimento Apollo, de origem norte-americana.

O PÚBLICO enviou várias questões a Teresa Roque, nomeadamente se, com a venda da Açoreana à Apollo, há alguma ligação entre o encaixe a receber e a Rentipar. Em resposta, Teresa Roque afirmou que “há pouco que a Rentipar pode e deve adiantar” devido a questões como o sigilo bancário e o facto de estar prestes a começar a comissão parlamentar de inquérito ao Banif.

Ao mesmo tempo, afirmou que algumas das questões colocadas pelo PÚBLICO também são colocadas pela própria empresa. A Rentipar, diz, pediu várias informações ao Banco de Portugal, até agora sem sucesso.  De uma coisa Teresa Roque não tem dúvidas: “A medida de resolução aplicada ao Banif prejudicou significativamente o grupo” Rentipar.